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Bruno Dreher*

Biotecnologia e bioengenharia

Quais os limites da interferência da biotecnologia na espécie humana?

31/07/2020 17:20
Temos hoje uma abundante quantidade de informação sobre tecnologias usadas para nosso dia a dia: lançamentos de novos smartphones, carros elétricos, autônomos, serviços de streaming. Mas uma grande revolução é desconhecida pela maior parte da população: a revolução biológica através da tecnologia.
Quando se fala de manipulação genética, o primeiro pensamento é sobre o design de bebês. Poderemos escolher a cor dos olhos, altura e inteligência de nossos descendentes? Provavelmente sim.
Quando fui para Israel fazer o Transdisciplinary-Innovation Program, um dos melhores cursos de inovação do mundo, meus colegas zombavam de mim pois em todas as aulas de bioengenharia e biotecnologia, eu fazia uma pergunta sobre CRISPR (fala-se “crisper”). Tamanho interesse não é por acaso. Esta tecnologia, descoberta pelas cientistas da Universidade da Califórnia em Berkeley Emmanuelle Charpentier e Jennifer Doudna, permite que possamos fazer edições genéticas de forma precisa e assertiva em praticamente qualquer organismo vivo.
Como já escrevi aqui, um de meus professores usou outra tecnologia - manipulação de células-tronco - para produzir carne usando apenas uma fração da água, espaço, custos e não matando animais.
Porém, a tecnologia que já é realidade há aproximadamente 30 anos é a possibilidade de escolha genética.
Imagine que você queira ter um filho. Você vai para uma clínica de reprodução, retira óvulos e espermatozóides e faz fertilização in vitro. Em determinado momento, você terá uma série de embriões, cada um deles com determinado código genético. Assim, você pode prever com cada vez mais precisão sua altura, inteligência, cor dos olhos, predisposição genética para doenças, etc.
É neste momento que entram as discussões morais sobre o assunto: ao adotarmos uma “seleção artificial”, não estaríamos brincando de Deus?
Até hoje, a maior parte das pessoas deixa essas características por conta do acaso. Vai nascer alto ou baixo? Homem ou mulher? Vai ter a doença de Huntington, uma doença genética terrível? Ao deixarmos na mão do acaso, podemos dizer que “seja o que Deus quiser”. Mas cada dia mais avançamos para o “seja o que EU quiser”.
Se, por um lado, existem os que acreditam que não devemos intervir na edição genética, por outro lado, existe a corrente dos que acreditam que já interferimos na ordem natural das coisas de outras formas. Ao usar um par de óculos, você também estaria eliminando a característica genética que você recebeu de não ter uma visão perfeita. Ao tomar um antibiótico, você estaria interferindo de forma artificial no fluxo natural da natureza. A manipulação genética seria uma forma melhor de fazer o que já fazemos e, por isso, devemos deixar com que as pessoas sejam livres para intervir nas características genéticas que a natureza nos dá.
Neste momento que entramos em uma discussão filosófica. Fato é que já interferimos no “fluxo natural” das coisas. Usamos a bioengenharia e biotecnologia em larga escala na produção de alimentos. Mas será que partir para a manipulação da nossa espécie não é ir longe demais? Será que isso não daria vantagem competitiva para algumas pessoas em detrimento de outras?
Se você perguntar a minha opinião, eu darei a resposta que eu dou sempre que eu sou perguntado sobre diversos tipos de tecnologias, que é o que eu chamo de “paradoxo da faca”. Uma faca pode ser usada para repartir o alimento de uma família, mas também pode ser usada para machucar alguém. O mesmo paradoxo pode ser aplicado para automóveis, computadores ou qualquer ferramenta. Normalmente, os benefícios são maiores que os malefícios. Portanto, sou favorável à evolução das pesquisas e do uso da bioengenharia e biotecnologia. Seremos muito mais favorecidos que desfavorecidos!
Bruno Dreher é consultor, palestrante, especialista em inovação pela Universidade Hebraica de Jerusalém, membro da World Futures Studies Federation (Paris, França) e World Future Society (Chicago, EUA).

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