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Coincidência? Os 2 anos da reforma trabalhista e a melhora do mercado de trabalho
| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

O mês de novembro teve a maior criação de empregos formais desde 2010 segundo o Caged (cadastro do Ministério do Trabalho sobre registros em carteira). Foram quase 100 mil vagas formais. O dado coincidiu com os dois anos da reforma trabalhista - nesses 24 meses, foram quase 1,2 milhão de vagas formais.

Neste ano, foram criados 948 mil empregos formais até novembro, número que deve cair com os desligamentos sazonais de dezembro. Mas provavelmente o número final do ano será maior do que os 530 mil de 2018 e o melhor resultado desde 2013.

A melhora no mercado de trabalho é lenta, como confirmam os números do IBGE: a taxa de desemprego no trimestre encerrado em outubro ficou em 11,6%, apenas dois pontos percentuais abaixo do pico do primeiro trimestre de 2017 (13,7%). A informalidade foi responsável por três quartos dessa redução, ou pouco mais de 3 milhões de postos de trabalho. Ainda é enorme a força de trabalho subutilizada (24% da população economicamente ativa).

Os bons números do Caged apenas coincidiram com os dois anos da reforma trabalhista. Tenho duas hipóteses sobre essa correlação. A primeira é que a reforma não influenciou diretamente a criação de vagas porque não alterou os pontos mais fundamentais do mercado de trabalho. O que também significa que ela não destruiu empregos, como muitos diziam que ocorreria. A segunda hipótese é que pode ter havido uma pequena formalização de vagas através da contratação intermitente (10% do total criado segundo o Caged).

A correlação possivelmente fraca entre a reforma e o desempenho do mercado de trabalho pode ser decepcionante para os dois extremos do debate político brasileiro. Mas precisamos levar em conta o que a reforma não foi: não reduziu o custo de manutenção de vagas, de contratação ou demissão; não mudou o acesso ao seguro-desemprego (alterado por outra lei); e também não impôs restrições à barganha de sindicatos (o imposto sindical não é uma restrição formal, embora possa ter efeito similar no longo prazo).

Estudos internacionais sobre a relação entre choques econômicos e a desregulamentação do mercado de trabalho explicam em alguma medida o que aconteceu no Brasil durante a crise. Dois trabalhos, um publicado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e outro pela International Labor Organization (ILO) (veja referências), analisam os efeitos da rigidez do mercado de trabalho diante de uma crise financeira. Em resumo, eles indicam que mercados mais regulados têm desemprego menor no início da crise, mas sua recuperação é mais lenta. Mercados menos regulado têm desemprego maior no início e uma recuperação mais rápida.

O caso brasileiro não se encaixa em uma crise financeira, mas aparentemente a rigidez do mercado de trabalho fez com que o desemprego crescesse lentamente no início. Vamos lembrar que a recessão começou no segundo trimestre de 2014 e se encerrou no fim de 2016 (foram 11 trimestres). O pico de desemprego só foi registrado no primeiro trimestre de 2017. E quase três anos depois ainda temos uma taxa de dois dígitos. Uma terceira hipótese que aparece aqui é que a rigidez do mercado de trabalho retardou a retomada da economia.

Essa característica do mercado de trabalho brasileiro provoca outro efeito negativo em uma crise. Os jovens tendem a ser os mais afetados pelo desemprego durante uma recessão e, em crises longas, como a nossa, acabam não atingindo seu potencial no longo prazo com facilidade. A falta de treinamento no emprego pode repercutir durante toda a vida laboral. O emprego verde-amarelo proposto pelo governo é uma resposta insuficiente para esse problema.

A reforma trabalhista foi um marco nas relações laborais. Deu mais força para a negociação entre empresas e trabalhadores, e acabou com alguns anacronismos da lei. Bem aplicada, ela pode apoiar no aumento da produtividade das empresas, já que permite a otimização de jornadas de trabalho, por exemplo. Sozinha, no entanto, não cria vagas nem muda o jogo durante uma crise profunda.

Para ter uma dinâmica diferente diante de uma recessão, a regulação do mercado de trabalho teria de combinar uma redução de custos para a demissão e manutenção de trabalhadores. O primeiro ponto acelera o ajuste das empresas e o segundo dá maior competitividade aos setores exportadores, que historicamente são os primeiros a se recuperarem em caso de crise doméstica. A redução deve ser linear e atacar custos acessórios além da tributação (a escolha de setores beneficiados, como mostra a experiência brasileira recente, não resolve).

Finalmente, é preciso que a política tenha um foco na proteção ao trabalhador e não ao emprego, como no Brasil. Isso significa maior ênfase em treinamento e recolocação de trabalhadores atingidos pela crise, além da manutenção do seguro para a transição entre os empregos (coisa que parece já funcionar bem no Brasil).

É muito provável que nos próximos anos sejam feitos estudos mais detalhados sobre o mercado de trabalho brasileiro durante a crise e sua relação com a reforma de 2017. Desses trabalhos serão tiradas lições para uma nova rodada de reformas que o Brasil pode precisar encarar. Pelo ritmo atual, o desemprego no país só vai voltar ao nível pré-crise em 2023 ou até 2024. Incríveis dez anos após o início da recessão.

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