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torre de transmissão de energia
Torre de transmissão de energia.| Foto: Brunno Covello/Arquivo/Gazeta do Povo

O Brasil atravessa uma crise energética pela terceira vez em duas décadas. A depender do tamanho da conta que chegará ao consumidor, esse problema poderá ter também efeitos políticos.

Nas duas crises anteriores, em 2001 e 2015, houve mudança no partido no poder em Brasília. É uma coincidência e também um lembrete de que os ingredientes que movem a popularidade de um governo têm a ver com o bolso.

Isso porque as crises energéticas são resolvidas via preço. Vários especialistas no setor argumentam que já estamos em um racionamento de energia, imposto pelo aumento na conta de luz. O ponto mais importante aqui é que o fornecimento de energia é diferente, por exemplo, da água. Blecautes são choques grandes demais para serem considerados como política energética preventiva.

Em 2001, o governo Fernando Henrique Cardoso precisou fazer uma intervenção pesada no sistema de preços. Estabeleceu um percentual mínimo de economia que deveria ser feito por famílias e empresas. Quem não conseguia atingir esse percentual, pagava uma sobretaxa. Na prática, houve um sobrepreço sobre o consumo para estimular a economia.

O sistema funcionou e não houve falta de oferta em horários de pico de carga. Mesmo assim, a crise daquele ano ficou marcada pelo termo "apagão", muito bem usado pela oposição ao governo. É difícil ignorar o fato de a crise ter sito usada por Lula contra José Serra na campanha de 2002.

O ano de 2001 deixou algumas lições e um legado. Uma lição é a de que as intervenções precisam ocorrer antes que seja necessária uma ação mais dura, sempre de difícil implementação. Ao mesmo tempo, o sistema de termelétricas para serem acionadas em caso de emergência e o modelo de liquidação de seu custo extra foram estabelecidos na sequência da crise e deram mais robustez ao sistema.

É por isso que a crise de 2015 é menos lembrada. Isso não significa que ela foi amena. Naquele ano, a Aneel iniciou o sistema de bandeiras tarifárias (com atraso de um ano porque o governo Dilma Rousseff não queria aumento de preços em ano eleitoral), que ficou o ano todo no vermelho. Assim, a conta ficou mais cara entre R$ 45 e R$ 55 por MWh durante o ano todo.

Pode parecer pouco para isso ter relevância política, mas estamos falando de quase R$ 15 bilhões, sem correção pela inflação, que empresas e famílias pagaram a mais em suas contas de luz - 40% do que o sistema de bandeiras arrecadou de 2015 até hoje. A conta de luz foi um componente importante da inflação de 10,6% naquele ano, e uma das fontes de descontentamento com a economia que enfraqueceu o governo.

A Aneel deve reajustar em julho o valor da bandeira vermelha. O governo argumenta que o objetivo é arrecadar os recursos para pagar a geração térmica mais cara (o que é um fato), mas não ignora o fato de que esse aumento pode estimular uma mudança no consumo. Além disso, outra medida em estudo é uma compensação para que grandes consumidores reduzam a demanda no horário de pico.

O nome dado a essa política poderia ser racionamento, mas sem dúvida o governo prefere que "cole" algo mais leve, como "gerenciamento". O histórico de 2001 e 2015 mostram que o nome e o preço da crise importam.

O risco de o sistema elétrico entrar em parafuso entre outubro e dezembro, no entanto, continuará existindo. O aumento do valor da bandeira vermelha reduzirá a demanda, mas seu efeito é limitado porque uma parcela grande dos consumidores de baixa renda não é afetada pelo sistema. Muitos grandes consumidores do mercado livre também não são atingidos diretamente.

Além disso, a crise deste ano tem um nó em uma bacia hidrográfica específica, a do Rio Paraná, a principal "caixa d'água" do sistema hidrelétrico. Reservatórios importantes podem chegar quase zerados em novembro. O receio de especialistas é que o fornecimento fique comprometido a ponto de haver cortes de carga por falta de potência das usinas para atender a demanda nos horários de pico. Aqui, sim, estamos falando em apagões.

Antes disso, provavelmente haveria alguma ação mais incisiva de redução de demanda via preço. Uma sobretaxa para consumo em horário de pico, por exemplo. Ou a imposição de uma redução no consumo como em 2001 - com a diferença de que não temos mais como trocar as lâmpadas de filamento, já retiradas do mercado, por outras econômicas.

Do ponto de vista energético, o ano será tenso como 2001 e mais caro do que 2015.

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