A leitura do relatório da reforma da Previdência nesta terça (02) mostra como os servidores estão conseguindo encontrar caminhos para se dar bem. Os funcionários públicos dos estados e municípios ficaram de fora do texto após mobilizarem governadores. Policiais fizeram protesto, chamando o presidente Jair Bolsonaro de traidor, e ganharam um aceno de apoio. A regra de transição para o funcionalismo federal ficou mais branda do que queria o governo.
Esse é um resmo de como o lobby do funcionalismo se organizou até aqui na tramitação da reforma. Até o projeto ser aprovado em plenário, mais coisas podem mudar. Há ainda um discurso muito forte do funcionalismo para evitar a implementação da tabela progressiva de contribuições (que eleva a alíquota efetiva para 16% no caso dos maiores salários).
O caso mais grave das mudanças feitas até aqui é a retirada de estados e municípios da reforma. A situação dos regimes próprios estaduais é em alguns casos mais grave do que a do funcionalismo federal e o que justifica uma ação via lei aprovada no Congresso é o fato de a União ser na prática o fiador desses sistemas estaduais. Deixar que eles quebrem significa assinar uma nota promissória em nome de todos os contribuintes do país.
O projeto enviado pelo governo tinha encontrado um caminho para forçar ajustes nos estados sem eximi-los de aprovar as mudanças via assembleias legislativas. A ideia era que houvesse uma alíquota básica de 14% de contribuição para todo o funcionalismo, que seria em seguida aprovada pelas assembleias. Elas poderiam escolher a tabela progressiva ou manter uma alíquota única, que poderia ser inferior a 14% se fosse comprovada a inexistência de déficit atuarial em seus sistemas.
Com isso, estados que conseguissem resolver bem seus sistemas previdenciários poderiam com o tempo ter alíquotas menores para seus servidores. Como? Provavelmente com a instituição de sistemas com capitalização feita com participação de contribuições do próprio estado. Os governos teriam de economizar para pagar as futuras aposentadorias. Além disso, a reforma forçaria os estados a criar os fundos previdenciários - coisa que está na Constituição e foi implantada até agora só por oito unidades da federação.
O Ministério da Economia calcula que a inclusão de estados na reforma levaria a uma economia de R$ 350 bilhões em dez anos. Os sistemas municipais, hoje menos problemáticos, teriam economia de R$ 170 bilhões. É um valor imenso, metade do que as mudanças no regime da União e no INSS vão garantir, e extremamente necessário, em especial para estados falidos, como Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, que hoje têm mais pessoal inativo do que na ativa.
A tendência de longo prazo, aliás, é que os sistemas estaduais passem por momentos muito duros nas próximas duas décadas devido à diminuição progressiva na relação entre ativos e inativos. Segundo levantamento da Instituição Fiscal Independente do Senado, nove estados têm relação ativos/inativos abaixo de 1,5 e outros oito abaixo de 2. É por isso que o déficit atuarial dos entes federativos é de mais de R$ 5 trilhões - esse é o dinheiro que no longo prazo não está coberto pelos sistemas previdenciários estaduais. A omissão da reforma nesse tema é um grande erro.
A pressão também ocorre sobre mudanças para o funcionalismo federal. Policiais de diferentes carreiras decidiram colar em Bolsonaro a imagem de traidor para forçar uma ação da bancada governista contra a idade mínima de 55 anos prevista na reforma - com o mínimo de 25 de exercício da função. As notícias desta quarta (03) são de que Bolsonaro decidiu defender a categoria. A flexibilização das regras é bem vista por parte significativa da bancada do partido do presidente, o PSL, o que pode levar a uma liberação do voto em plenário. É o tipo de movimento que pode ferir a tramitação do projeto.
O funcionalismo federal já conseguiu uma concessão importante ao convencer o relator Samuel Moreira (PSDB-SP) a colocar no texto uma regra de transição para servidores contratados antes de 2003 conseguirem a sonhada aposentadoria com integralidade e paridade. Pelo tamanho do benefício, seria justa a imposição imediata de uma idade mínima.
Agora, o alvo do lobby dos servidores é a alíquota de contribuição. O projeto cria uma tabela progressiva que eleva para pouco mais de 16% a contribuição efetiva de servidores que ganham salários mais altos. Esse é o percentual que o governo entende necessário para bancar aposentadorias acima do teto do INSS, calculadas pela média dos salários da ativa. A progressividade até essa alíquota, diga-se, é opcional para o funcionário público que foi contratado depois de 2003 e até 2013 - ele pode contribuir sobre o teto do INSS e recolher para um fundo previdenciário.
Uma reforma que englobe o funcionalismo é uma questão de justiça distributiva. Os servidores, em especial no Legislativo e Judiciário, recebem salários maiores do que receberiam na iniciativa privada e contam com uma aposentadoria garantida pelo Estado com valores mais elevados do que permitidos a quem está no INSS. O custo desse sistema é um déficit por pessoa muito maior do que no INSS - ou seja, o contribuinte paga mais "por cabeça". Estados e municípios deveriam estar alinhados nesse mesmo movimento.
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