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Jogador de videogame
| Foto: Bigstock

Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro disse em suas redes sociais que tentaria atender ao pedido de um internauta para que sejam reduzidos os impostos dos videogames. O pedido de fato está na mesa do ministro da Economia, Paulo Guedes, e até já vazou uma conta de como seria feito o desconto nos impostos.

Ao atender a um pedido de um internauta (que, neste caso, apresenta uma demanda de todos os fãs de jogos), Bolsonaro pode estar criando uma espécie de "bolsa videogame". Uso essa expressão porque o processo repete outros benefícios fiscais concedidos pontualmente, a depender de quem pede ou de como o pedido é encaminhado. Aparentemente, o presidente gosta de jogos e também da repercussão de ações em redes sociais.

Os números que vazaram através da agência de notícias Reuters dão conta de um desconto de R$ 24 milhões por ano em impostos. A alíquota de IPI dos consoles cairia de 50% para 40%, enquanto o tributo sobre jogos iria de 20% para 16%. Os acessórios teriam a tributação revista de 40% para 32%.

Bolsonaro caiu em um erro comum do nosso sistema tributário: corrigir distorções com medidas pontuais. Claramente, a alíquota de IPI dos videogames está em um nível absurdo. No entanto baixar um pouco o imposto não resolve questões mais amplas e pode inclusive ser insuficiente para ser justo com quem compra um equipamento desses no Brasil - afinal, IPI de 40% não é um grande refresco.

É essa ideia de se fazer justiça com impostos que torna o debate tributário tão tortuoso no país. Em algum momento do passado, venceu a ideia de que jogos eletrônicos são um luxo e merecem pagar muito imposto. O mesmo se pensou sobre outros produtos industrializados de alto valor, como máquinas de lavar, carros e bicicletas. Não é por acaso que o Brasil tributa mais o consumo do que outros países: muita gente ainda vê ir às compras como um pecado burguês.

Essa ideia de justiça social que penaliza o consumo, ironicamente, torna o sistema tributário brasileiro mais injusto. Tributamos menos a renda do que outros países - o imposto no qual, por sua formatação, quem ganha mais paga mais. O videogame tem o mesmo preço para pobres e ricos e taxá-lo como bem de luxo é uma ação típica de burocratas que não têm contato com a aspiração das pessoas.

Outra distorção ligada ao imposto bizarro dos games é que a indústria no Brasil é onde os governos preferem arrecadar. É um setor menos pulverizado e mais fácil de fiscalizar - tanto para a União, quanto para os estados, estes adeptos da substituição tributária que arbitra os preços dos produtos para a cobrança do ICMS e abre todo tipo de negociação entre estados e empresas.

O "bolsa videogame" é só mais um remendo em um sistema cheio de falhas e que precisa ser revisto. O projeto de reforma tributária que tramita na Câmara, baseado na proposta do tributarista Bernard Appy e apresentado pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP), tenta lidar com as causas ao unificar impostos e limitar alíquotas dentro de um modelo de valor adicionado que pode, no fim, tornar o sistema mais equilibrado entre setores da economia.

O grande mérito da ideia é que os impostos sobre o consumo (IPI, ICMS, ISS e PIS/Cofins) deixariam de ser cumulativos e a receita ocorreria no local da venda final. Isso beneficia a indústria e deve jogar mais peso sobre o setor de serviços, que resiste à iniciativa. Mas essa é uma mudança fundamental para o país deixar de ter um sistema tributário com jeitão de anos 70.

O governo teria bons motivos para querer a aprovação dessa reforma, mas a equipe econômica deve insistir em uma versão alternativa de unificação de tributos, sem incluir impostos estaduais e municipais, e com a criação de uma contribuição aos moldes da CPMF. São ideias contraditórias e que podem ser insuficientes para desfazer o mau hábito dos governos de lançar benefícios fiscais para produtos e setores específicos. A proposta da Câmara veda a criação desse tipo de saída.

Os gamers podem pagar 20% menos IPI com o "bolsa videogame", mas ganhariam mais com uma reforma que dê mais equilíbrio ao sistema tributário e conserte distorções que duram décadas.

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