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O presidente do STF, Luiz Fux.| Foto: Nelson Jr./SCO/STF

O movimento de boicote à presença de Luiz Fux no município de Bento Gonçalves não é episódio menor do cotidiano brasileiro. Ao contrário, ilustra bem os tempos obscuros em que vivemos. O presidente do STF foi convidado a palestrar sobre segurança jurídica em um evento da CICs municipal. Imediatamente depois do início da divulgação, grupos bolsonaristas passaram a se mobilizar de forma e pressionar a entidade para que cancelasse o evento. Empresas patrocinadores foram ameaçadas de boicote.

A Ordem dos Advogados do Brasil até tentou realizar a palestra, mas a Corte decidiu por, avaliando riscos de segurança, cancelar a agenda do magistrado no Rio Grande do Sul. Em nota, o advogado Rodrigo Terra de Souza, presidente da Subseção de Bento Gonçalves, mostrou inconformidade afirmando que a “pluralidade de opiniões é salutar para uma sociedade democrática, independente de cargo ou posição social, mas principalmente para que possamos também questionar e apresentar contrapontos, com fundamento e clareza”. O que se teve, entretanto, foi uma vitória da intolerância, da negação do contraditório, do desprezo pela divergência saudável.

Ora, se a corte cujos trabalhos ele coordena tem desacertos, contradições ou responsabilidade na atual conjunto, que lhe seja cobrado no evento. E aqui cabe perguntar: não pode o chefe de um poder se manifestar em evento organizado por entidade representativa de categoria que é, segundo a Constituição, "indispensável à administração da justiça"? Outra pergunta: se a palestra fosse em ambiente acadêmico, para estudantes de direito, também teríamos essa movimentação? Alunos poderiam ser privados de ouvir o magistrado?

Juízes devem, preferencialmente, se manifestar nos autos de processos. Há aqui, entretanto, a subversão do sentido dessa expressão. Ela se refere a posicionamentos sobre casos em análise. Fux falaria sobre as condições institucionais do país, assunto que é de sua alçada e de interesse público. Se pretende distorcer a lei da magistratura de modo a calar os Ministros enquanto o STF está sob cerco.

Travestidos de “povo”, extremistas ideológicos agora policiam a sociedade civil livre. Organizações públicas e privadas passam a ser tolhidas em suas escolhas e, muitas, receosas de possíveis consequências, acabam se submetendo ao que não passa de chantagem política. Anuem, dessa forma, com os que buscam solapar a democracia. O cancelamento do evento pela CICs de Bento Gonçalves cria o precedente para que esses agentes voltem a agir da mesma forma em outras oportunidades, delimitando quem pode ou não falar e ser ouvido.

Não é normal, nem mesmo saudável, que o presidente do STF seja alvo de uma operação desse tipo. Ainda mais com risco a sua segurança. Que algo assim ocorra na Venezuela de Nicolás Maduro ou na Hungria de Vicktor Orbán ou na Rússia de Vladimir Putin já se espera, mas não em uma democracia plena como é o caso do Brasil.

Caso ameaças tenham sido feita a Luiz Fux, a devida apuração pela Polícia Federal. Importa saber quem as praticou e se em articulação com outras pessoas. Tal investigação deveria ser apensada nos inquéritos que apuram a atuação das milícias digitais contra o STF. Nesse caso, não estaríamos a falar apenas de boicote ou radicalismo, mas de crimes, inclusive contra o funcionamento das instituições. E aí, mais do que mero repúdio, é preciso enquadrar essa gente na lei.

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