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Aqui e acolá parece haver um esforço narrativo de colar em Guilherme Boulos a imagem de moderado.  Parte da imprensa tem contribuído nesse sentido. Como se houvesse uma simetria entre os posicionamentos do candidato do PSOL com os de Bruno Covas, que concorre com ele na disputa pela prefeitura de São Paulo. Nada poderia ser mais falso. O Boulos de hoje difere em que daquele que, em 2016, justificou a vandalização da Fiesp por criminosos encapuzados de extrema esquerda?

Ele se arrepende de ter dito isso? Ele acaso mudou sua opinião sobre atos como esse? Investido do cargo de prefeito, como vai reagir se sedes de entidades forem depredadas? Vai condenar a violência ou dizer que tudo se justifica por uma questão de insatisfação social? Qual será seu relacionamento com a Fiesp? Essas perguntas permanecem irrespondidas.

E quanto a seus posicionamentos sobre regimes políticos? É bom lembrar que, na eleição de 2018, quando concorria a presidência da República, ele foi sabatinado na Rádio Jovem Pan e questionado pelo historiador Marco Antonio Villa e pela jornalista Vera Magalhães sobre Cuba e Venezuela. Disse que ambos os países eram democráticos.

O que existe em Cuba é um sistema eleitoral farsesco, criado apenas para legitimar o controle do Partido Comunista Cubano, que governa a ilha com mão de ferro desde 1959. Não há participação da sociedade, que não pode se organizar em partidos alternativos ou concorrentes. Em seu Art 5°, a Constituição Cubana estabelece o Partido Comunista como “único, martiano, fidelista, marxista e leninista, vanguarda organizada da nação cubana, com base em seu caráter democrático e vínculo permanente com o povo, é a força política dirigente superior da sociedade e do Estado”. Em outras palavras: ou você é comunista ou não participa do processo político.

Em seu livro “A tragédia da Utopia”, o escritor gaúcho Percival Puggina descreve como se dá “a escolha” dos candidatos no modelo eleitoral cubano: “os nomes são propostos em cada unidade de vizinhança, formada por um quarteirão (...) Essa nominação se procede em presença da comissão eleitoral de circunscrição, designada pela comissão eleitoral municipal, que por sua vez é formada por representantes das organizações de base do Partido”. A tal “democracia” se dá no limite do debate interno do Partido Comunista, que controla quem concorrerá ou não.

Na Venezuela, por sua vez, o processo democrático foi sendo solapado a medida que o chavismo passou a controlar as instituições de Estado. Não houve uma revolução, como em Cuba, mas uma tomada de poder desde dentro. De modo que o rito da eleição passou a obedecer a uma lógica autoritária e fraudulenta, hoje não reconhecida por nenhum país democrático sério. Nicolás Maduro é um pária internacional que só está no poder porque seu partido se apropriou das forças armadas.

Mais recentemente, também na Jovem Pan, Boulos voltou a ser cobrado por seus posicionamentos políticos. O empresário e jornalista Paulo Figueiredo perguntou se ele se definia como socialista. O candidato do PSOL preferiu tergiversar, dizendo que combate as desigualdades e que se isso era comunismo ou socialismo não era de interesse do eleitorado de São Paulo.

Boulos quer dizer o que é e o que não é de interesse do eleitorado. Me parece bastante razoável que a população da cidade mais rica e produtiva do país saiba se aquele que pretende comandar o paço municipal se vê como um comunista ou tem em boa conta o modelo político e econômico de Cuba e da Venezuela.

Ora, a democracia não pode ser entendida apenas pela existência do sufrágio. Ela compreende uma série de características que incluem liberdade de expressão, segurança jurídica, independência entre os poderes, igualdade perante a lei e a livre associação. Sem esse conjunto de condições, o ato do voto constitui-se em um teatro controlado por quem está no poder.

O que muita gente parece fazer força para ignorar é que a moderação política não pode ser relativa apenas à polidez verbal. Bons modos podem esconder e acobertar barbarismos dos mais variados. Até aqui, no campo político, Boulos continua sendo um extremista ideológico que passa pano para ditaduras de estimação, e, no campo fiscal, um radical da irresponsabilidade que pretende inchar os gastos estatais para além de qualquer limite.

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