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Em 28 de maio do ano passado, Jair Bolsonaro foi até a frente do Palácio da Alvorada se manifestar sobre uma operação da Polícia Federal que havia sido feita na véspera com a autorização do Ministro Alexandre de Moraes. O procedimento se dava no âmbito do inquérito das fake news e atingia blogueiros, empresários, ativistas e políticos apoiadores do presidente. Exaltado, o mandatário chegou a dizer palavrões, dando a entender que ações semelhantes não seriam mais toleradas.

Eram apenas palavras jogadas ao vento. Um esforço para, na época, dar satisfação aos seus militantes que queriam uma resposta dura ao que chamam de desmandos do Supremo Tribunal Federal. Afinal, o presidente fora eleito dizendo que combateria o establishment. Ocorre que, na medida que o tempo foi passando, e a situação de Bolsonaro foi se complicado (tanto do ponto de vista político quanto do ponto de vista jurídico, com as investigações envolvendo o filho mais velho), sua postura beligerante foi sendo abandonada.

A crispação contínua com os outros poderes deu lugar a um pragmatismo tão profundo que até as práticas fisiológicas condenadas por Bolsonaro na campanha eleitoral foram adotadas com ardor, como a aproximação com o Centrão. Ao mesmo tempo, houve a pacificação das relações com o STF, consolidada com a indicação de Kássio Nunes Marques para a vaga aberta por Celso de Mello. Ao invés de alguém com perfil ideológico, o presidente escolheu um nome que fosse facilmente aprovado no Senado e que contasse com a simpatia dos membros da Corte.

É por isso que o deputado bolsonarista Daniel Silveira foi abandonado politicamente depois de gravar um vídeo em que defendeu a adoção de uma novo AI-5 e manifestou o desejo de ver os Ministros do STF apanhando nas ruas. Preso em flagrante delito por decisão de Alexandre de Moraes, e posteriormente referendada por unanimidade pelo plenário do Supremo, o parlamentar foi conduzido para sede da Polícia Federal. A situação mobilizou a militância governista nas redes sociais, mas não o Palácio do Planalto.

Tão logo o vídeo de Daniel Silveira viralizou nas redes sociais e o STF determinou sua prisão, o governo tratou de tomar uma distância higiênica do parlamentar assim como do conteúdo por ele publicado. Ao invés de manifestações de apoio e solidariedade, silêncio absoluto. Alguns esperavam que Bolsonaro falasse alguma coisa. Após um longo hiato nas rede sociais, a primeira manifestação do presidente depois do ocorrido foi publicar uma foto andando de bicicleta usando chinelo de dedo em que anunciava a redução do imposto de importação sobre esse meio de transporte.

Também não houve qualquer menção a Daniel Silveira durante a tradicional live da quinta-feira, que Bolsonaro usa para comentar temas polêmicos em debate no país. Apesar da pressão do público que o acompanhava, o mandatário tratou de outros temas, como alíquotas de impostos.

Ficou a cargo de Ricardo Barros, líder do governo na Câmara, deixar claro que o posicionamento do Planalto era não se envolver. Nem Arthur Lira empreendeu muitos esforços para aliviar a situação do colega. Tentou costurar um pequeno acordo, mas não demorou a recuar diante da posição firme do STF. Até tentou ligar para Bolsonaro, mas o presidente desconversou.

Nas redes sociais, Eduardo Bolsonaro se limitou a anunciar que votaria pela libertação de Silveira “em nome das garantias da imunidade parlamentar, liberdade de expressão, devido processo legal, ampla defesa e contraditório”. Já Carlos Bolsonaro fez uma alusão ao seu estômago, relatando que estava “embrulhado como não sentia há tempos”.

A situação do deputado vai ficando parecida com a da militante radical Sara Winter, que foi esquecida depois de ser presa também por ordem do STF. Em outubro, a líder do grupo 300 chegou a postar um vídeo vertendo lágrimas se dizendo decepcionada com a postura de Bolsonaro. Daniel Silveira, um fiel defensor de Bolsonaro, está aprendendo que reciprocidade não está em voga. A fidelidade de Bolsonaro é para com os filhos e a continuidade de seu mandato. Se, para tanto, for necessário descartar uma militante ou até mesmo um deputado de baixo clero, ele não pensará duas vezes antes de fazê-lo. E ainda é capaz de dizer: “E daí? Lamento. Quer que eu faça o que?”

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