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Jeremy Waldron
Jeremy Waldron| Foto:

por Gilberto Morbach

Somos muitos, e discordamos sobre justiça”. Isso quer dizer que “não apenas discordamos sobre a existência de Deus e o sentido da vida. Discordamos também sobre o que é que conta como termos justos de cooperação entre pessoas que discordam sobre a existência de Deus e o sentido da vida”. [[1]] São essas as palavras que abrem a obra hoje recomendada: Law and Disagreement, escrita por Jeremy Waldron em 1999. Duas décadas depois, em sociedades cada vez mais pluralistas, fragmentadas, divididas, as palavras de Waldron parecem fazer ainda mais sentido.

Não é difícil perceber, afinal, por que Law and Disagreement é uma obra fundamental. Nossos disagreements — em tempos de uma tão discutida “crise da democracia” — são um elemento que define nossas circunstâncias políticas. Mas e law? Onde o direito entra nisso? Por que essa é uma obra fundamental para a teoria do direito? A explicação é convincente, é oferecida pelo próprio Waldron, e é o que serve de premissa principal do livro: o direito, sobretudo em um contexto de democracia liberal, é o critério que torna possível nossa ação em face desses desacordos profundos. Sendo assim, sustenta Waldron, é (também) o papel da teoria do direito refletir, de forma séria e genuína, não apenas sobre a natureza do direito enquanto fenômeno, mas também sobre legitimidade política, interpretação, responsabilidade e accountability.

Como deve, então, o direito responder a esses desacordos? Qual deve ser o papel da legislação? Qual deve ser a tarefa das cortes? Qual deve ser a função das cortes com relação à legislação? Na exata medida em que desacordos profundos sobre justiça são rotina, e cada vez mais, não basta pensar sobre o papel do direito em sociedades abstratas, estruturadas hipoteticamente a partir de princípios de justiça genericamente estabelecidos a priori. Precisamos pensar sobre legalidade, sobre raciocínio e interpretação judicial, sobre as relações entre direito e moralidade, direito e metaética, sobre o império da lei — enfim, sobre todas as questões de que trata a teoria do direito como temos visto ao longo destas breves resenhas — à luz das circunstâncias que formam a realidade de nosso presente: a de cidadãos que não compartilham necessariamente, ou mesmo com frequência, a mesma visão sobre valores e princípios.

As decisões políticas são, em última instância, nossas decisões. E elas são tomadas, e reivindicam sua autoridade, não apesar, mas em razão e em face de todos nossos desacordos políticos e morais. É com base nisso, e com o rigor analítico que lhe marca, que Waldron responde às importantes perguntas levantadas pela filosofia do direito. Suas respostas vêm sempre a partir de uma perspectiva teórica que se propõe, assumidamente, uma teoria democrática do direito.

A meu juízo, devo assumir aqui, Waldron acerta em suas respostas; cabe agora ao leitor julgar por si próprio se, de fato, ele tem razão no que diz sobre o direito e sobre a teoria do direito. É bem possível, provável, que muitos discordem. E talvez seja exatamente esse o ponto.

[1] Waldron, Jeremy. Law and Disagreement. Oxford University Press, 1999, p. 01.

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