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É de pequenino que se torce o pepino
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O mal em política não nasce pronto, não é obra pré-fabricada. As más práticas têm origem determinada e brotam como inoportunos fungos, crescem bem devagar, sob a umidade do olhar distraído de uns e do calor entusiasmado de outros.

O político ruim também já foi um bebezinho.

E de bebezinho todo mundo gosta, não é verdade? Mas é preciso ter uma conversa de homem pra homem com o bebê. Todo carisma, quando pequenininho, é engraçado; no começo, aquela atitude é espontânea, não é tosca; na infância, a falta de educação é divertida. Quando brotam, é difícil separar joio de trigo, mas não é bom deixar que cresçam muito para separar depois. Depois pode ser tarde.

Quem chega agora à discussão política se esquece de que até o Lula já foi neném. Ele não parecia esse bicho-papão todo, uns anos atrás, quando nem cortava os cabelos. Olavo de Carvalho votou nele, vejam vocês. Lula nasceu para a política no apagar das luzes do regime militar, em meio a muita balbúrdia, gente pelada e greves no ABC. Naquele momento, em virtude de um certo contexto histórico confuso e de alta pressão, houve quem acreditasse nas boas intenções do ex-presidente e atual condenado.

A construção da mitologia petista não se deu do dia para a noite. Muita derrota teve de movimentar os moinhos da política antes que Lula se elegesse presidente e, de presidente, se transformasse no líder do maior esquema de corrupção desde Tutancâmon. Porém, quem sabe?, se tivesse apanhado mais, apanhado desde o berço, talvez tivesse roubado menos. O problema é que parte significativa da imprensa, mesmerizada com a ideia – mais ideia que realidade – do homem do povo feito presidente, se ocupou de admirar o petista, em vez de julgá-lo, e de acreditar que o Brasil finalmente daria certo.

Deu no que deu.

É por isso que me impressiona tanto, e me incomoda ainda mais, esse entusiasmo pelo remake messiânico em torno da figura de Jair Bolsonaro. Já vimos esse filme e o original era ruim. Como se o eleitor dissesse: deu errado uma vez, vamos repetir a dose? Não funcionou com o sindicalista, será que funciona com o capitão?

O roteiro é diferente, os atores são outros, mas o arco dramático é o mesmo: admirar por admirar e acreditar por acreditar, porque é simpático, é legal, faz bem pro coração. O Brasil finalmente dará certo, agora sim, agora vai, apenas porque sim. Antes, a tal “grande imprensa” se comprometia; hoje, a dita “imprensa alternativa” se compromete.

O singelo fato é que governo autoritário, iliberal, corrupto ou incompetente nem sempre se apresenta como tal, desde as primeiras horas, desde o primeiro dia, desde o primeiro choro. A corrupção alastrante do PT, por exemplo, não surge daquele tamanho, mas cresce à sombra do desejo de negar que ela crescia, e de bebê se transforma em adolescente malcriado e feioso, para terminar num adulto irrecuperável.

Não me contento em ser comentarista de governo acabado, vidente de coisa passada, pacifista de guerra vencida. Erro, acerto, porém tento compreender o que se mostra e, principalmente, o que parece se esquivar nas dobras do discurso.

Em política sou ainda mais desconfiado que São Tomé: preciso tocar para crer e, depois de tocar de novo, dar um beliscão para ver se grita.

Alguém tem de estar disposto a dizer que o bebê é tão feio quanto o pai.

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