“Marmelada!”, exclamava meu pai quando assistíamos juntos a filmes de ação, aventura ou espionagem, se as proezas do herói ou as soluções do enredo ultrapassassem os limites da verossimilhança artística. É preciso haver suspension of disbelief quando se frui uma obra de ficção, mas nem tanto assim.
Pois é mais ou menos o que tem acontecido no Brasil. Se fosse uma série de tevê, seria das piores. O país vai além do razoável em matéria de credulidade, e todo mundo assiste a tudo com a sensação de que o roteirista está exagerando.
Coisas estranhas têm acontecido, dia após dia, sem alívio cômico para soltar os nervos, numa trama feita só de reviravoltas que deixam todas as pontas soltas e os personagens pouco desenvolvidos. A entrevista do ex procurador-geral, Rodrigo Janot, é um exemplo entre tantos.
Como se já não tivéssemos conflitos suficientes para encher linguiça dramática, ele me vem com essa de que pretendeu matar o ministro Gilmar Mendes e se matar depois, no que seria um gesto espetacular e patético, digno de A vida como ela é.
Não fez nem uma coisa nem outra, tanto melhor, mas resolveu abrir o coração ao distinto público, às vésperas da publicação de sua biografia. Não bastasse a intenção suposta de matar um ministro, agora mais essa: a de publicar uma biografia. No primeiro crime ele só pensou; o segundo, cometeu.
Rodrigo Janot é péssimo ator e representa mal até a si mesmo. Duvido que tenha, de fato, especulado homicídio. Bravata, fanfarronice, bufonaria. Deixou essa casca de banana para quem se dispusesse a pisar nela, e não faltou gente a planejar o escorregão.
Entusiastas do fechamento do Supremo Tribunal Federal, entre os quais alguns até bem conhecidos e influentes, apressaram-se a manifestar seu apoio às intenções assassinas do pobre-diabo com cara de minha avó. Tutti buona gente. Alexandre de Moraes, por sua vez, aproveitou o gancho para soltar os cachorros e levar o STF mais perto da anomia e mais longe do direito.
A impressão que fica é que, à parte a balbúrdia institucional e política a que estamos quase acostumados, todos os envolvidos nessa rocambolesca história que teve começo, mas parece não ter fim, sofrem de sérios problemas psiquiátricos. Em vez da CF-88, consultemos o CID-10. Estou convicto de que as respostas já não se encontram nas urnas, nos tribunais, na direita ou na esquerda, mas no consultório do psiquiatra. Ou na sala de roteiristas.
Deixe sua opinião