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Quem tem medo de Lula livre?
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O preso mais livre do país escreveu e publicou uma carta aberta. Vejam como esse homem é mesmo um benfeitor: ele gera emprego até da prisão, a se considerar que não tem faltado trabalho ao abnegado ghost writer.

Lula gosta de cartas, como aquela que o elegeu em 2002, endereçada ao “povo brasileiro”. Se bem que, mais do que carta, ali foi conto. Do vigário. A única carta de que ele nunca gostou é a promulgada em 1988, que o PT não reconheceu nem assinou.

Pois é a essa Carta que Lula apela para chorar sua condenação. Na Folha de S.Paulo, desfia o já conhecido rosário de mistificações. Foi condenado injustamente. Não há provas contra ele. É um preso político. O crime nunca existiu. Bibibi e bobobó.

Lula mente e sabe que mente, mas envenena o imaginário popular e joga com a tendência brasileira à pacificação e ao deixa-disso. Deixa ele, não é para tanto. Roubou, mas quem não rouba. Se provas havia, ninguém sabe ninguém viu.

O efeito é o contrário. O país está crispado e com os nervos à flor do voto.

Lula teve e continua a ter privilégios jurídicos e judiciais que nunca antes neste país foram concedidos a alguém. Recursos, dinheiro, influência, televisão, imprensa. Só que, infelizmente, a montanha de provas soterrou o montinho de subterfúgios.

O texto trai suas intenções quando deixa de ser um apelo por liberdade ou revisão judicial e se revela uma peça ideológica chinfrim. Até de neoliberalismo fala. Como se ao listar as conquistas reais e imaginárias de seu governo pudesse justificar os crimes e malfeitos. Como se as urnas ou os números no Datafolha servissem de prova de santidade ou excludente de ilicitude.

O ex-presidente e atual condenado prossegue fazendo juras de amor à Constituição que o PT nunca amou, e condenando o impeachment que o PT nunca condenou – quando os presidentes eram outros. Sempre bom lembrar que o PT tentou impedir todos os mandatos desde a redemocratização. Lula poderia e deveria ter sido impedido em 2005, no escândalo do Mensalão. E já fazia hora-extra em liberdade.

Fosse outro o momento do país, tenho certeza de que estaria livre. Ele não contava com o desastre econômico que Dilma Rousseff, a “gerentona”, provocaria; não atinava com o fato de que Fernando Haddad é ruim de voto e não convencia nem mesmo a si mesmo de que era o candidato; não percebeu que, ao ancorar o PT ao lulismo, terminaria por naufragar os dois.

Sem essa catapora ideológica, a esquerda poderia ter reinventado o discurso, e com a reinvenção se reposicionar no debate político. Opções havia. Do veterano Fernando Gabeira à novata Tábata Amaral, passando por Marina Silva e Eduardo Jorge, nem tudo é descartável nos quadros canhotos. Se não como candidatos, ao menos como interlocutores nessa Sibéria intelectual em que o PSDB sempre foi o máximo de liberalismo permitido.

Além do mais, a baixa qualidade do pensamento de esquerda tende a forçar para baixo a qualidade do pensamento de direita, daí o resultado eleitoral de outubro. Conservadores e liberais pareciam entender que, não sendo o PT, qualquer antipetista serviria. Ou que, para afastar o PT, qualquer coisa terá de servir. Por exemplo, um liberal que sempre foi estatista, um conservador que não sabe o que é importante conservar. Nisso, ficamos com o pior de dois mundos, e o Brasil patina.

No último final de semana, comemoramos o aniversário de um aninho da prisão de Lula.

Senti falta do bolo.

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