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Um balanço da 31ª Oficina de Música
| Foto:
Hugo Harada / Gazeta do Povo
Prefeito Gustavo Fruet falou da importância da Oficina

Porque ilustrar um texto sobre a Oficina de Música com a foto dos políticos que discursaram na abertura do evento? Porque mais adiante no texto eu vou jogar pra eles a responsabilidade das cobranças que vou fazer, e você vai entender caso tenha paciência de ler este texto até o fim.

A foto foi tirada durante o concerto de abertura do evento, sobre o qual eu escrevi uma crítica bastante negativa em meu blog pessoal. Críticas deste tipo sempre ferem suscetibilidades, e a minha não foi diferente.

Talvez tentando me redimir do que eu escrevi lá, ou melhor, tentando me fazer entender de maneira mais completa, vou desenvolver algumas idéias aqui. Inclusive, o título que dei ao texto é mais para chamar tua atenção leitor, do que exatamente uma indicação do que será tratado.

Porque eu não poderia fazer um balanço da Oficina de Música, afinal quase não assisti apresentações, não fiz nenhum curso e não conversei com ninguém que tenha feito. Olhei a programação no site, fiquei com vontade de ver algumas coisas, outras não fiquei. Estou de férias, viajei com a família neste meio tempo e etc.

Portanto, as percepções que tenho são bem distantes, mas não me impedem de pensar algumas coisas gerais sobre a relação entre a Oficina e a vida musical da cidade.

Em primeiro lugar, a Oficina já é um evento tradicional demais para ser extinto. Todos os políticos sabem disso, afinal o evento passou por mandatos de Jaime Lerner, Maurício Fruet, Roberto Requião, Jaime Lerner de novo, Rafael Greca, Cassio Taniguchi, Beto Richa, Luciano Ducci e Gustavo Fruet. 31 edições entre 1983 e 2013.

Ser um evento tradicional e tradicionalmente reconhecido não impediu que o candidato derrotado, Luciano Ducci, prefeito que tentava a reeleição, tenha sabotado a realização da 31ª edição do evento. A idéia era deixar o evento organizado pela comissão, mas sem previsão de recursos. O próximo prefeito que se virasse, entre o dilema de arranjar dinheiro de algum modo ou cancelar o evento com todo o desgaste político conseqüente. Fruet escolheu a opção correta e garantiu a existência da Oficina.

Ponto.

Mas não é o bastante. O que cobrei na minha crítica ao concerto de abertura, e que é também o que cobro das políticas culturais como um todo em Curitiba e no Brasil, é um compromisso sério com o aumento do nível de mediocridade. Para que isso aconteça é necessário que os gestores públicos parem de tratar cultura como esmola e passem a tratar como investimento.

Uma cidade com o número de habitantes, a renda e a escolaridade de Curitiba não pode se contentar com uma vida cultural tão mesquinha. É por isso que eu acho que o concerto de abertura foi medíocre. A Camerata tocando num espaço inadequado com um repertório no mínimo batido: Mozart, Haendel e Gnattali (que graças-a-deus entrou no lugar do Giuliani que estava inicialmente previsto).

É esse o meu problema com a programação da Oficina. É claro que o concerto estava lotado, e o público adorou o concerto. O que só diz do nosso estado de indigência mental. Se a gente tivesse educação musical na escola, teria comido esse repertório tradicional como arroz-com-feijão que é de verdade, e estaria pronto para algo realmente significativo num evento deste porte.

Mas e os cursos? Maravilha. Professores de altíssimo nível. Tenho certeza que cada curso foi de extrema importância na vida dos músicos que participaram. Eu já fiz vários cursos na década de 1990 e aquilo foi parte importantíssima da minha parca formação musical.

Mas eu ainda acho que falta um jeito de articular isso com políticas culturais mais amplas para a cidade. Afinal, todo ano a gente faz esse negócio, traz professores que são o melhor que existe, eles dão uns dias de curso, vão embora, e a cidade continua com a mesma vida musical medíocre o ano inteiro.

Seria bom se a gente articulasse os cursos intensivos da Oficina com políticas educacionais que tivessem impacto nas escolas municipais, que formássemos orquestras jovens ativas o ano inteiro, que chegassem em janeiro para coroar um ano de trabalho. Seria bom se a gente tivesse atividade musical constante capaz de sustentar um público de concertos regular e o trabalho sério de músicos. Seria bom se a música contemporânea não fosse uma ilustre desconhecida no nosso meio musical.

É óbvio que esses problemas todos não são culpa do pessoal que está fazendo direção artística da Oficina: Janete Andrade, Osvaldo Ferreira, Rodolfo Richter, Glauco Solter e Sérgio Albach. A única culpa que eles têm é aceitar os limites mesquinhos que o poder público impõe a um trabalho sério, afinal não dá pra fazer um evento significativo com tão pouco dinheiro. Obviamente eles não têm outra escolha, e cabe a nós cidadãos, público, pressionar por melhores condições.

Voltando à programação de concertos. A abertura foi ruim, mas aconteceu muita coisa boa no meio do caminho. Eu vi dois concertos fabulosos do Quarteto Lopes Graça, tocando compositores modernistas: Freitas Branco, Shostakovich, Lopes Graça, Britten, e outros que agora não me lembro.

Osvaldo Colarusso, em outro blog aqui no portal comentou de forma muito positiva um concerto da fase de música antiga.

Já a fase de música popular da Oficina vive uma outra realidade. Porque a música popular não vive o problema da doença do repertório clássico, que acomete as salas de concerto. A música popular é viva e contemporânea, e isso faz com que a Oficina de Música Popular tenha resultado muito mais efetivo. Basta que se veja quantos grupos de música popular vem surgindo em Curitiba nos últimos anos, quantos projetos de alto nível este pessoal vem realizando. Por outro lado, a Oficina de Música Popular complementa um trabalho que já tem uma penetração muito maior ao longo do ano, com o Conservatório de MPB e seus grupos artísticos.

Para resumir a coisa toda: a Oficina tem que se pensar como um evento que atraia a atenção do mundo para Curitiba em janeiro. Mais ou menos como estamos aí pensando na Copa do Mundo FIFA e nas Olímpias do COI. Com a diferença que acontece todo ano.

A Oficina já vai muito bem naquilo que vem fazendo em piloto automático nos últimos anos: organizar cursos com professores de alto nível de excelência técnica, em Música Erudita, Música Antiga e Música Popular. Falta ainda, no meu entender, articular o nível dos cursos com o nível dos concertos, principalmente envolvendo os alunos.

A relação dos alunos com a Oficina não pode ser apenas uma coisa de uma ou duas semanas em janeiro. Para isso, e Oficina precisa se pensar para o ano inteiro, articulando-se com os grupos musicais efetivos da cidade, as faculdades de música, e as escolas municipais e estaduais. Até mesmo com outros espaços como as ruas da cidadania e bibliotecas públicas.

Para isso, precisamos avançar muito na gestão pública da cultura. Cultura não é esmola, é estratégia de desenvolvimento humano, social e, principalmente, econômico. Enquanto o governador, o prefeito, os secretários estadual e municipal e demais autoridades envolvidas não conseguirem enxergar um pouco além nesta estratégia, vamos ficar mais uns 30 anos andando de lado.

Aliás, reparem bem que o governador não está na foto. Mandou representante. Provavelmente porque não acha nada disso importante.

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