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O duro caminho do projeto que acaba com municípios no Congresso Nacional
| Foto: Ilustração: Felipe Lima

Uma das propostas contidas no pacote de reformas entregue por Jair Bolsonaro e Paulo Guedes ao Senado Federal é a extinção de municípios com menos de cinco mil habitantes que não sejam viáveis economicamente. O que mede essa viabilidade é a capacidade do município de gerar por meio de IPTU, ISS e ITBI mais de 10% de suas receitas totais. No Paraná, estado com 399 cidades – sendo cerca de 100 com menos de 5 mil habitantes – o debate sobre o tema é candente.

A medida coloca em oposição dois campos consolidados da política estadual, ambos com bons argumentos para defender seus pontos de vista e analisar o texto da Proposta de Emenda à Constituição. De um lado a elite política do estado, forjada no discurso municipalista; de outro um movimento de reforma do aparelho do estado, que não é novo, mas ganhou fôlego diante da derrota eleitoral do Partido dos Trabalhadores e da crise financeira por que passa o setor público.

O municipalismo

A postura municipalista da classe política tem raízes na redemocratização do país e hoje é um dos pilares da representação política e da constituição de bases eleitorais de parlamentares. Na segunda metade da década de 1980, a retomada do regime democrático foi o grande acontecimento nacional. Na linha de frente desse processo estava o Movimento Democrático Brasileiro, partido de forte inclinação municipalista. Sob a liderança de Ulysses Guimarães, esses ideais foram incorporados à Constituição de 1988 e ao ideário democrático.

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Apesar da relevância discursiva, é na prática que o municipalismo interessa mais aos políticos. Deputados federais e estaduais constroem suas bases eleitorais sobre as estruturas político-administrativas dos pequenos municípios. Com emendas parlamentares e articulação junto ao Executivo eles suprem parcialmente a contínua falta de recursos das cidades pequenas e assim vão conquistando, com o apoio de prefeitos e vereadores, a simpatia e os votos dos moradores locais. A relação tem jeito de comércio. Prefeitos insatisfeitos com seus representantes estaduais ou federais abrem conversas com outros deputados, buscando melhores fornecedores de emendas parlamentares.

Aos olhos dos críticos, uma relação espúria e personalista; para os defensores, o modo natural de se fazer política: prefeitos e deputados buscando levar sempre mais recursos para as regiões que administram e representam para conseguirem o reconhecimento da população local na próxima eleição.

Portanto, a redução do número do número de municípios significa a escassez da matéria-prima da representação política.

Toda essa construção gera um argumento que tem sido muito utilizado por parlamentares nos últimos dias. Quem o sintetizou bem foi o paranaense Sergio Souza (MDB), da tribuna da Câmara dos Deputados.

“Os pequenos municípios, quando eram vilas, distritos, não tinham uma patrola, não tinham uma ambulância, não tinham posto de saúde, escola, não tinham uma estrada rural decente. A emancipação levou desenvolvimento para essas comunidades muitas vezes esquecidas pelo município-mãe que privilegiava seu centro urbano”, defendeu.

A racionalização

Há bons argumentos também do outro lado. No Paraná, quem parece concentrar o espírito da defesa da extinção dos pequenos municípios é o senador Oriovisto Guimarães (Podemos) – que chegou a apresentar um projeto com o mesmo objetivo antes mesmo do texto do governo. Tal como no campo oposto, a origem ajuda a explicar a posição de Oriovisto: empresário bem-sucedido e eleito para seu primeiro mandato com o discurso de renovação na política, o paranaense parece se escandalizar com o modo tradicional de fazer política. Olhando para o Estado com os olhos de CEO, Oriovisto vê a todo tempo custos a serem cortados.

“É preciso aprimorar a capacidade financeira municipal para atender às demandas locais da população. Como os estados e a União enfrentam enormes desafios fiscais em um contexto de elevada carga tributária, é imprescindível melhorar o uso dos escassos recursos que os municípios detêm, por meio da racionalização de estruturas administrativas, com a eliminação de redundâncias administrativas, e da busca da eficiência nas compras públicas, por meio do ganho de escala”, argumenta o senador.

A tramitação

Se a estrutura municipalista se articula com sucesso na defesa dos municípios, é de se esperar que ela se articule em defesa de si própria. Uma cadeia de políticos – de vereadores a senadores – deve se organizar pela manutenção das atuais estruturas. Ainda que o pensamento de racionalização do estado esteja em voga, o que faz o parlamento é mesmo a política.

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