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“Cuba existe?” Mas de qual Cuba estamos falando?
| Foto: Cubanet

O cônsul-geral de Cuba em São Paulo, Pedro Monzón Barata, ganhou espaço no jornal Folha de S.Paulo para se queixar da imprensa internacional. Em seu artigo, ele reclama de que setores da imprensa só se lembram de Cuba para mentir, difamar e repetir a cartilha redigida por Washington que diz que a ilha vive sob um regime ditatorial e que não respeita os direitos humanos.

Monzón é um ingrato.

No mundo – e no Brasil – não falta quem feche os olhos para a ditadura em Cuba. Em julho passado, quando os cubanos foram às ruas protestar contra o regime, a Folha generosamente abriu suas páginas para uma alucinação, segundo a qual “a revolta popular em Cuba só existia em versões delirantes nas redes sociais ou de uma imprensa cheia de ódio”.

O cônsul insatisfeito – ou melhor dizendo, insaciável – chega ao ponto de prescrever o que deve ser dito sobre as maravilhas do regime representado por ele. A lista é enorme e não merece ser reproduzida. Aliás, os jornais brasileiros deveriam fazer o mesmo. É perturbador como os veículos de comunicação aceitam publicar textos assinados por representantes de ditaduras, sejam eles diplomatas ou não. Textos recheados muitas vezes de mentiras que prestam apenas a passar um verniz sobre atrocidades.

A Cuba do cônsul Monzón não é a mesma Cuba que tem dezenas menores de idade presos e processados por terem ido às ruas em julho passado protestar contra a opressão do regime. A ilha de Monzón não é a ilha de onde as pessoas fogem em botes improvisados, enfrentando o risco de morrer em uma travessia oceânica para fugir da miséria.

O regime defendido e louvado por ele não é o mesmo que em pleno século XXI está sob investigações e já foi condenado judicialmente por escravizar seus cidadãos. Escravidão que a ditadura cubana chama “solidariedade internacional”. Um conceito super fofo que não é usado exclusivamente pelos canais oficiais como fachada para encobrir seus crimes. É o mantra de seus sócios pelo mundo, como no Brasil, onde o Programa Mais Médicos serviu como pretexto para a exploração de mais de 15 mil médicos cubanos que passaram pelo país.

A ilha da fantasia do cônsul Monzón não é a mesma onde somente no ano passado, depois de seis décadas de restrições, os produtores rurais ganharam o direito de poder tomar a decisão de matar ou não as vacas que são criadas por eles sem ter que recorrer a autorização especial do Estado. Ainda que fosse para o próprio sustento.

O visitante que se encanta com a versão turística de Cuba não faz ideia de que muita gente chegou à vida adulta sem recordar ou saber como é o sabor de um bife. Quem já provou carne bovina possivelmente a comprou no mercado negro, correndo o risco de pegar até dez anos de prisão. A concessão só veio no ano passado como forma de acalmar a população em meio aos efeitos da pandemia de coronavírus, que deixou ainda mais severos os efeitos do regime sobre a vida dos cubanos comuns.

Ah! Mas é culpa do bloqueio, lembra o cônsul.

A ilha de Monzón precisa dessa desculpa que é repetida aos quatros ventos. Mas o famigerado “bloqueio” não impede a entrada de nada na ilha. Na prática, prevê punições a quem também faz transações nos Estados Unidos, mas está bem longe de ser cerco asfixiante e fatal. As regras impostas não atingem o envio de alimentos, insumos médicos, por exemplo. Um dado ignorado é que os Estados Unidos são o quarto principal parceiro comercial de Cuba. Comida é um dos principais produtos que a ilha compra dos americanos. Só não compra mais porque é um regime falido e caloteiro.

Em seu artigo na Folha, o cônsul perguntou se “Cuba existe?”. Uma ferramenta retórica para acusar quem na imprensa não embarca na “Cuba Oficial”. Neste ano, a ilha é tema nas campanhas presidenciais pela América Latina. Foi no Chile, está sendo na Costa Rica, será na Colômbia e, claro, no Brasil. Ninguém quer ser como Cuba.

Mas de qual Cuba estamos falando, cônsul Monzón? Ao invés de deixar um porta-voz do regime fazer a pergunta, ele mesmo dar a resposta e ainda por cima passar um sabão na imprensa, não seria o caso de ouvir os próprios cubanos? Aqueles cubanos que vivem no mundo real sem os benefícios de estarem abrigados pelo regime? Falo de cubanos que sonham com gosto de carne. Daquela gente que, diante da falta de papel higiênico, dá um fim mais nobre às páginas do jornal oficial Granma.

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