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Unidade da loja Dollar Tree em West Hills, em Los Angeles, na Califórnia
Unidade da loja Dollar Tree em West Hills, em Los Angeles, na Califórnia| Foto: EFE/MICHAEL NELSON

Nos últimos 36 anos, uma rede de lojas se notabilizou nos Estados Unidos por vender todo tipo de quinquilharia, utilidades domésticas e até alimentos ao preço único de 1 dólar. Com cerca de 8 mil unidades espalhadas pelos Estados Unidos, a Dollar Tree se transformou em uma marca onipresente. No início do mês, entretanto, quem entrou na loja em busca de balões de festa cheios com gás hélio, bandejas de alumínio ou até mesmo para comprar leite se deparou com uma nova realidade: nada mais custa 1 dólar. Em movimento que os analistas de mercado consideram um dos “mais arriscados da história do varejo”, os produtos foram remarcados e agora custam 1,25 dólar.

Os 25 centavos podem parecer pouco, mas o novo preço, além de minar um dos patrimônios da rede que virou sinônimo de 1 dólar, representa um reajuste histórico e serve de alerta para a explosão inflacionária que afeta os Estados Unidos.

A justificativa dos executivos era de que há tempos a manutenção do preço único, em 1 dólar, já vinha se mostrando insustentável. Mas, no último ano, a Dollar Tree se viu em meio a um paradoxo. Os primeiros efeitos da pandemia de Covid-19 na economia americana fizeram um bem danado para a empresa e suas concorrentes que atuam no “mercado 1 dólar”. Lockdowns, desemprego e a consequente queda da renda levaram os americanos a recorrer como nunca aos produtos de baixo custo. Estima-se que 88% das pessoas recorreram a estas lojas para comprar alimentos e produtos de higiene pessoal, por exemplo.

Tudo seria perfeito se não fosse um efeito colateral da pandemia, que daria as caras meses depois. O apagão logístico. A falta de contêineres e a interrupção no fornecimento levou à escassez e consequente elevação nos preços, seja nos provedores chineses, seja na ponta. O sucesso durou pouco.

O resultado não poderia ser outro: inflação. Ou seja, 1 dólar não é mais 1 dólar.

Esta mudança pode ter um efeito sombrio. O mesmo pessoal que recorreu às lojas de 1 dólar em meio à pandemia, como estratégia de sobrevivência, perdeu 25% de seu poder de compra naquela que era sua opção mais barata. Por exemplo, uma pessoa que com 4 dólares conseguia voltar para casa com um pacote de pão, um litro de leite, um saco de batatas para fritar e salsichas, terá que deixar para trás um dos produtos, ou pagar 1 dólar a mais pela compra.

Pode parecer insólito, mas alguns dos problemas que a maior economia do planeta enfrenta podem ser medidos em 25 centavos. Eles parecem pouco, mas podem fazer a diferença para quem conta moedas na hora de pagar a conta. Sobretudo para quem realmente precisa das lojas de 1 dólar para viver.

Em escala, eles pesam não só na vida dos mais pobres. Os centavos elevaram o preço da gasolina, que já é 40% maior que há um ano atrás. Também deixaram amargas as contas de gás e da energia elétrica.

O efeito cascata é inevitável e faz a rápida retomada dos empregos com o arrefecimento dos impactos da Covid-19 na economia não ter o efeito exuberante que deveria. As pessoas estão voltando a ter salários, retomando o consumo de produtos que não têm a mesma oferta pré-pandemia. A pressão gera inflação, que por sua vez corrói o poder de compra dos americanos.

É comum ver as prateleiras de supermercados vazias e alguns produtos simplesmente desapareceram. No lugar estão surgindo marcas novas, de pior qualidade e preços idênticos ou mais altos que os praticados anteriormente para bens de consumo melhores. Nada exemplifica melhor o resultado de uma busca na Amazon. A quantidade de lixo despejada no mercado é assustadora. Comprar on-line exige paciência em checar avaliações para mitigar o risco de comprar mercadorias de baixa qualidade ou até mesmo imitações.

A inflação está corroendo o poder de compra do dólar. Um de seus efeitos a longo prazo pode ser a deterioração de um mercado exigente, que tinha por característica ser destino de produtos com melhor qualidade. Os episódios de escassez e os preços estão remodelando os padrões e os americanos parecem que estão aprendendo a tolerar e a consumir produtos cada vez mais caros e piores.

Se a estratégia da Dollar Tree der certo, em um futuro não muito distante as mesmas quinquilharias que outrora custavam 1 dólar serão vendidas por bem mais e poderão ser cada vez mais assimiladas pelo americano comum.

Tomara que não.

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