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pensão a filhas, netas e até irmãs "solteiras
Parte do direito de pensão a filhas, netas e até irmãs “solteiras” de servidores tem base do Montepio Civil da União, criado pelo presidente marechal Deodoro da Fonseca em 1890 para funcionários da Fazenda e depois para magistrados.| Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Oitenta e quatro mil pensionistas filhas maiores de servidores públicos civis da União recebem um total de R$ 4 bilhões por ano. A grande maioria é de filhas solteiras, mas há também maiores casadas, desquitadas, separadas, divorciadas e viúvas. Irmãs e netas solteiras também recebem pensão.

Os dados foram divulgados pelo Ministério da Economia no Portal da Transparência após denúncia da agência de dados Fiquem Sabendo ao Tribunal de Contas da União (TCU).

Um exemplo é Elaine Ferreira Neves, pensionista do Governo do Distrito Federal. Ela recebeu R$ 167 mil em dezembro, na condição de filha solteira maior. No mês anterior, foram “apenas” R$ 13,7 mil. Hoje com 52 anos, ela recebe o benefício desde o ano 2000. Já Lúcia da Silva Friza, de 66 anos, recebeu R$ 121 mil em dezembro e R$ 51,8 mil em novembro. Ela tem o benefício desde 1980.

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Tanto Lúcia quanto Elaine fazem parte da categoria de filhas maiores solteiras sem cargo público permanente, que reúne 68 mil pensionistas, com renda total mensal de R$ 254 milhões.

Mas a lista do governo federal também conta com cinco pensionistas na condição de “filha maior solteira com cargo público permanente” – uma categoria não prevista na legislação sobre filhas solteiras. A maior renda dessa categoria é de Maria Dortea dos Reis, de 73 anos. Ela recebeu R$ 26 mil do Ministério da Economia em dezembro. Parte do direito é originário do Montepio Civil da União, criado pelo presidente marechal Deodoro da Fonseca em 1890 para atender servidores da Fazenda e depois magistrados.

Filhas casadas, viúvas, separadas

Neste sentido, outra categoria é a de “filhas casadas”. São 932 pensionistas que geram uma despesa mensal de R$ 3,5 milhões. A maior renda, de R$ 33,7 mil, é de Alda Villas Boas Teixeira, de 83 anos, filha do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Antônio Villas Boas. O benefício é pago pelo Ministério da Economia para bancar dívida deixada pelo Montepio Civil.

Questionado sobre o pagamento cumulativo de pensões a Alda Villas Boas, o ministério, afirmou que, "de acordo com as informações registradas no SIAPE, não há pagamento pelo Ministério da Economia, já que a pensionista possui outras fontes de renda que entram no cálculo do abate-teto".

A pensão do Montepio foi suspensa pela Justiça Federal em 2015, mas agora aparece entre os pagamentos do Ministério da Economia.

Alda Villas Boas também conta com mais duas remunerações do STF – pensão civil no valor de R$ 34,2 mil deixada pelo marido, que era servidor público, mais aposentadoria como analista judiciário no valor de R$ 36,2 mil. Ela sofre abate-teto de R$ 6,3 mil no Supremo.

Pensionista na condição de filha solteira maior recebeu R$ 167 mil em dezembro

Já 276 filhas viúvas recebem mensalmente um total de R$ 1,35 milhão. A grande maioria – 158 – é de pensionistas do antigo Estado da Guanabara. A maior renda é de Neide Alarcão Rampineli, dependente de um policial militar – R$ 18 mil. As desquitadas, separadas, divorciadas somam mais 533 pensionistas, com renda total mensal de R$ 3,5 milhões. Novamente, a maior parte é herança da Guanabara.

O Estado da Guanabara deixou 12 mil pensionistas filhas maiores que custam R$ 40 milhões por mês. A maior renda é de uma filha maior solteira, Eli Barbosa Cruz – R$ 35,7 mil. A mais idosa é Diva Nascimento Pimentel, de 94 anos, com renda de R$ 3,6 mil. Trata-se de uma filha maior casada. Considerando todas as demais pensões, a Guanabara deixou uma conta mensal de R$ 66 milhões para pagar 16 mil pensionistas, incluindo viúvas, ex-mulheres, filhas, irmãs, netas.

Irmãs e netas solteiras

A Guanabara deixou, ainda, a inusitada categoria de 20 “irmãs solteiras”, uma divisão em extinção. Elas custam 77 mil por mês aos cofres públicos. A maior renda, de R$ 13 mil, é de Indaya Amaro Correa, de 88 anos. Outras nove irmãs viúvas, separadas e desquitadas têm renda dotal de R$ 33 mil. A mais idosa delas, Eurípedes Pereira Brasil, com renda de R$ 2,2 mil, tem 101 anos. Começou a receber a pensão em 1954.

Mas ainda não acabou. Existem as netas solteiras. São apenas três irmãs que dividem a pensão de José Senna – R$ 4,8 mil para cada uma. Norma, Julieta e Therezinha têm hoje 84, 85, e 87 anos. Recebem a pensão desde 1939. Elas são solteiras nos registros oficiais.

Transparência, uma longa batalha

Em setembro do ano passado, o TCU acatou denúncia da agência Fiquem Sabendo, que pedia a abertura dos dados de pagamentos a pensionistas – o que incluiria filhas de militares. Com a decisão, passam a ser alvo de publicidade não só inativos, como também aqueles que recebem pensão de parentes.

O prazo previsto para cumprimento era de 60 dias. A equipe da agência passou a monitorar os avanços por meio de reiterados pedidos da Lei de Acesso à Informação (LAI) à Controladoria-Geral da União (CGU) e ao Ministério da Economia. Em dezembro, foram avisados que a pasta da Economia deu acesso livre a todos os dados para os meses de novembro e dezembro de 2019. Somente em novembro os valores chegaram a mais de R$ 2,4 bilhões.

Na sua decisão, o TCU estimou que, entre 2011 e 2016, as despesas realizadas com servidores aposentados, na reserva, reformados e instituidores de pensão atingiram R$ 494,6 bilhões. “Tendo em vista o alto volume de recursos dispendidos em aposentadorias e pensões, interpretação equivocada do que dispõe a LAI acarreta o não atendimento, em sua completude, da política de transparência ativa na gestão do Poder Executivo Federal”, entendeu o TCU.

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