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Gastos sob sigilo do Senado com cartões corporativos somam R$ 3,6 milhões
| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

O Senado Federal mantém sob sigilo desde 2010 todos os gastos feitos por servidores com cartões corporativos, num total de R$ 3,6 milhões em valores atualizados. Apenas o administrador da residência oficial do presidente do Senado, Francisco Joarez Gomes, gastou R$ 1,4 milhão em sete anos. O Senado não informa o valor de cada compra nem o serviço ou produto comprado.

Diretora-geral do Senado, Ilana Trombka pagou R$ 180 mil com cartões corporativos de 2016 a 2019. O servidor comissionado Djalma da Silva Lima gastou R$ 196 mil nos últimos quatro anos. O policial legislativo Fernando Gomes Lima pagou despesas no valor total de 123 mil em três anos. Vanderley Ferreira Nunes, técnico legislativo aposentado da Gráfica do Senado, pagou R$ 130 mil com cartões. Todos os valores foram atualizados pela inflação.

Cinco policiais legislativos estão entre os 10 servidores que mais gastos fizeram com cartões corporativos. Além de Fernando Gomes, os policiais Francisco Mancini, Flávio Nunes Ferreira, Tiago Valladão e Rodrigo Vasconcellos gastaram, respectivamente, R$ 86 mil, R$ 81 mil, R$ 75 mil e R$ 52 mil com cartões corporativos. Eles fazem escolta policial principalmente do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e do senador Ângelo Coronel (PSD-BA), que recebeu ameaça de morte. Os cinco policiais receberam ainda um total de R$ 166 mil em diárias só em 2019. As diárias cobrem despesas como hospedagem e alimentação.

As despesas com cartões são de vários tipos. Os policiais e servidores podem, por exemplo, usar os cartões para pagar aluguel de carros no cumprimento da missão de escolta parlamentar. Numa viagem conjunta dos presidentes do Senado e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em jatinho da Força Aérea Brasileira, um assessor da Presidência do Senado utilizou o corporativo para pagar as despesas de catering - a alimentação servida a bordo de aeronaves.

O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) também conta com escolta policial, mas os gastos desses policiais com diárias, passagens e cartões corporativos não estão explicitados na página de transparência do Senado. O apoio ao senador foi dado após acordo do Senado com o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) na Presidência da República, que cuida da segurança do presidente e dos seus familiares.

“A integridade física das altas autoridades”

O blog perguntou à Presidência do Senado por que todos os gastos com cartões corporativos da casa estão sob sigilo, uma vez que nem mesmo a Presidência da República mantém esse sigilo absoluto. A Lei de Acesso à Informação (LAI), que regulamenta o acesso a informações públicas, determina “a observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção”.

O Senado respondeu que os “suprimentos de fundos de regime especial”, pagos com os cartões corporativos, “têm informações classificadas que não devem ser divulgadas no Portal da Transparência, conforme as prerrogativas da Lei de Acesso à Informação. É destinado a atender às especificidades da Presidência do Senado Federal e da sua Residência Oficial, bem como a segurança de parlamentares atendidos pela Coordenação de Proteção de Autoridades da Polícia Legislativa”.

A nota do Senado acrescentou que ficam resguardados dados sobre aquisições e fornecedores e outras informações que “possam comprometer a integridade física de altas autoridades da República”, de acordo com o art. 21 do Ato da Mesa Diretora 17/2012. O referido artigo diz que o suprimento de fundos especial será utilizado para pagamento de produtos ou serviços como alimentação, conservação, limpeza, consertos de máquinas, instalações elétricas e hidráulicas e aluguel de equipamentos e veículos.

O Senado não justificou por que a compra de alimentos e a contratação de serviços de limpeza, conservação e pequenos consertos podem conter informações que coloquem em risco a segurança das “altas autoridades”. Acontece o mesmo em relação à Presidência da República.

A abertura dos extratos dos cartões corporativos usados pelos ex-presidentes Lula, Dilma e Temer, após a conclusão dos seus mandatos, revelou, em sua maior parte, a compra de produtos como verduras, frutas, carnes e outros alimentos, além de bebidas alcoólicas muito caras, como cachaça Havana a R$ 400 a garrafa. A abertura dos dados após a conclusão do mandato das autoridades está prevista na Lei de Acesso. O blog perguntou por que o Senado não abriu os extratos dos cartões dos seus ex-presidentes. Não houve resposta.

Dados sobre gastos do Senado serão divulgados, mas com ressalvas

Num segundo questionamento ao Senado, o blog perguntou em que medida a divulgação detalhada das compras da Residência Oficial, feitas no cartão do servidor Francisco Joarez Cordeiro Gomes, oferecem riscos que justifiquem a imposição do sigilo. Também questionou por que o regime normal dos suprimentos de fundos, destinado às despesas de pequeno vulto e eventuais, também está sob sigilo. O que justificaria esse sigilo?

O Senado informou que, a partir de 1º de janeiro de 2021, as prestações de conta serão divulgadas no sítio do Senado Federal, mediante demonstrativo do gasto em relatório que identifique o detalhamento do ato de concessão, que conterá o número do processo, o nome e a matrícula do suprido, o órgão vinculado e os valores concedidos e executados.

O detalhamento das transações realizadas conterá o nome do fornecedor, a data da nota fiscal, o valor gasto e a imagem digitalizada dos documentos comprobatórios dos gastos aprovados.

Mas o Senado adiantou que haverá uma ressalva: “O suprimento de fundos de regime especial tem informações classificadas que não devem ser divulgadas no Portal da Transparência”. Ou seja, todos os pagamentos citados na reportagem, como gastos de servidores da Presidência e da Residência Oficial, serão mantidos em sigilo.

“Despesas eventuais, de pequeno vulto”

No primeiro questionamento feito pelo blog, o Senado informou que os suprimentos de fundos, pagos com os cartões corporativos, são utilizados em caráter excepcional, em situações nas quais não é possível ou recomendável submeter a aquisição ao processo ordinário de contratação. São despesas de pequeno vulto, eventuais, inclusive em viagens e com serviços especiais, que exijam pronto pagamento; e as de caráter sigiloso.

No Senado, os suprimentos de fundos são divididos em dois regimes: o normal, destinado às despesas de pequeno vulto e eventuais; e o especial, concedido a servidores da Diretoria Geral, da Presidência e da sua Residência Oficial. Os gastos com passagens e diárias não estão incluídos entre as despesas pagas com suprimentos de fundos.

O suprimento de fundos normal tem limite máximo para concessão de R$ 17,6 mil, com limite de R$ 1,76 mil por item de despesa. Mas o limite por item de despesa com autorização do primeiro secretário vai até R$ 8,8 mil. No suprimento de fundo especial, o limite de gasto mensal vai até R$ 44 mil.

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