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Proprietárias da Pousada Duas Irmãs receberam R$ 32 mil do Seguro Defeso
Proprietárias da Pousada Duas Irmãs receberam R$ 32 mil do Seguro Defeso| Foto: Divulgação/CGU

As duas proprietárias da Pousada Duas Irmãs, na Lagoa da Conceição, em Florianópolis, receberam o Seguro Defeso, pago a pescador artesanal, de 2011 até setembro de 2018. Juntas, faturaram R$ 32 mil. Comerciantes, locadores de imóveis, donos de serralheria, peixaria, caminhões e carros de luxo, além de tatuador e massagista, receberam o benefício em outros municípios de Santa Catarina e outros estados.

Os dados constam de auditorias da Controladoria Geral da União (CGU) divulgadas no ano passado. O Seguro Defeso é um auxílio financeiro, no valor de um salário mínimo, concedido durante quatro meses por ano ao pescador artesanal profissional para garantir o sustento familiar no período em que é proibido de pescar, para permitir a reprodução dos peixes. O benefício é pago a mais de meio milhão de pescadores.

Ainda em Florianópolis, um beneficiário que trabalha com comércio de peixes e mariscos em furgão próprio recebeu indevidamente R$ 2,7 mil. Proprietário de imóvel alugado para comércio recebeu indevidamente R$ 15 mil. Outro beneficiário que recebeu R$ 19,8 mil trabalha com vidro e mora em casa de dois pisos.

Outras irregularidades encontradas do município: beneficiário vive de pensão e aluguel de pequenas casas; trabalha com serviços de refrigeração; embora pesque, não vive da pesca; Possui um mercado junto com a família; embora seja pescador, é aposentado. Não poderia mais receber o defeso.

Na capital catarinense, 66% dos investigados não exercem a atividade pesqueira como fonte de renda. Apenas dez dos 30 entrevistados exercem a profissão de pescador artesanal com o objetivo de proporcionar renda familiar. Isso resultou em pagamento indevido de R$ 267 mil no montante fiscalizado de R$ 424 mil. Os trabalhos de campo foram realizados de 20 de agosto a 5 de setembro de 2018.

Com 493 mil habitantes, o município tinha 872 cadastrados no Seguro Defeso. De 2014 a 2018, os beneficiários locais receberam um total de R$ 19 milhões. O blog fez contato com a Pousada Duas Irmãs e informou o conteúdo da reportagem, mas as duas proprietárias não retornaram à ligação.

Fraudes chegam ao Brasil desenvolvido

As fraudes no Bolsa Família, por exemplo, ocorrem mais em municípios pobres do Nordeste. Mas os casos mais flagrantes de irregularidades no Seguro Defeso foram apurados pela CGU em municípios de Santa Catarina – estado com o segundo maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país. As investigações ocorreram em 2018.

Em Tijucas (SC), dona de casa aposentada desde 2017 recebeu duas parcelas do seguro após a aposentadoria. Recebeu um total de R$ 13,4 mil. Mora num sobrado e tem carro na garagem. Dos 21 entrevistados, 71% não exerciam a pesca e tinham outras atividades econômicas. Dos 37 mil moradores do município, 117 beneficiários do seguro de pescador receberam um total R$ 423 mil em 2018.

As irregularidades no município eram variadas: beneficiária do Bolsa Família e do Seguro Defeso que não exerce a pesca recebeu R$ 18,6 mil; outra na mesma condição levou R$ 10 mil; dono embarcação retida pelo Ibama (pescou camarão no período do defeso) recebeu R$ 19,7 mil; beneficiária que trabalhou como massagista no passado, mas alega vender peixe em casa. Recebeu R$ 15,5 mil. Pensionista da prefeitura que não exerce atividade de pesca recebeu R$ 17,3 mil.

Direito ao seguro era comprado por R$ 300

Uma beneficiária assumiu não ter direito ao Seguro Defeso. Alega ter sido incentivada pela Colônia de Pescadores, que assegurou o seu direito ao benefício. Afirmou que, no passado, pagava até R$ 300 para dono de embarcação incluir seu nome e CPF como usuária da embarcação. Recebeu um total de R$ 18,7 mil.

Os auditores concluíram que muitas das esposas de pescadores (ou do grupo familiar), “teriam sido incentivadas pela Colônia de Pescadores Z25 a acessar o Seguro Defeso, por meio de filiação à referida Colônia”. Enviamos mensagens à colônia por e-mail e pelas redes sociais, mas não houve retorno.

Sobrado, caminhão, serralheria, e nada de pesca

Em São José (SC), ao lado de Florianópolis, um beneficiário mora num sobrado e tem como renda aluguel de imóvel com dois quartos, cozinha e banheiro, como diz anúncio no muro da casa. Levou R$ 15,5 mil do Seguro Defeso.

Dono de um caminhão, outro contemplado com o seguro, tem o serviço de frete como sua principal atividade econômica. Ganhou R$ 14,7 mil até 2018. Um terceiro recebeu a mesma quantia, embora possua uma serralheria. Nos três casos, os favorecidos moravam em Florianópolis.

Foram selecionados segurados que sacaram o benefício em outros municípios. Um deles morava no Rio de Janeiro. E tinha casas para alugar em São José.

Nas visitas aos beneficiários, os auditores constataram que metade das pessoas selecionadas não exercem a atividade pesqueira de forma ininterrupta como fonte de renda, o que resultou num prejuízo de R$ 212 mil aos cofres públicos apenas nessa amostra. O total de pagamentos aos 44 favorecidos em São José foi de R$ 1,3 milhões até 2018.

Segurado de Garopaba morava no Ceará

Os saques em outros municípios também ocorreram com segurados de Garopaba (SC). Um deles morava em Florianópolis e sacava o seguro em Camboriú (SC). Ganhou R$ 16,5 mil. Outro residia em Garopaba, na paradisíaca Barra da Encantada, e sacava em Florianópolis. É tatuador e executor de serviços gerais, mas recebeu seguro no valor de R$ 13,5 mil.

Um terceiro residia em São Paulo, onde tinha uma madeireira, mas sacava o dinheiro em Guarujá. Um beneficiário com local de residência não informado, corretor de imóveis, sacava o seguro em Cascavel (CE), na região metropolitana de Fortaleza.

Foram analisados 16 beneficiários que faziam saques em outros municípios. Do montante fiscalizado – R$ 234 mil – foi identificado prejuízo potencial de R$ 208 mil. Em Garopaba, com população de 22 mil habitantes, havia 1.388 pessoas cadastradas como pescadores – 6,3% do total da população.

O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que faz os pagamentos, afirmou à CGU que “a condição de segurado especial como pescador artesanal é verificada automaticamente por meio de sistema informatizado, cujos dados são provenientes do Ministério da Agricultura”. Os auditores concluíram que existem fragilidades no cadastramento do Ministério.

Auditoria encontrou pescador com Frontier

Em São Cristávão (SE), auditoria feita no programa Bolsa Família, encontrou uma beneficiária que recebia também o seguro defeso do pescador artesanal. O imóvel da família é incompatível com a renda declarada. Em entrevista com a neta da beneficiária, ficou confirmado que ela havia vendido uma caminhonete Nissan Frontier e comprado uma Chevrolet S10. Reportagem do blog já havia mostrado fraudes no Bolsa Família.

Outra beneficiária do Bolsa Família recebia o seguro defeso, que também era pago ao marido. Ele trabalhava com frete utilizando caminhão VW/8.120, avaliado em R$ 45 mil, que seria do seu sobro. A beneficiária acrescentou que a Toyota SW4, ano 2006, registrada no nome do seu cônjuge, pertenceria também ao seu sogro.

Em Vitorino Freire (MA), estavam cadastrados como pescador um comerciante, uma costureira e dona de casa, uma dona de casa que possuía um salão de beleza, um autônomo e um dono de bar. Foram encontradas no município irregularidades que resultaram em pagamentos de Seguro Defeso indevido no valor de R$ 78 mil. Com 30 mil habitantes, o município tinha 1.634 segurados. Eles receberam um total de 14 milhões de 2011 a 2017.

Segurado “paga a pescaria”

Em Parnamirim (RN), o marido de uma beneficiária informou que a esposa é dona de casa, não exerce a pesca e nunca trabalhou, “mas paga a pescaria”, em alusão à contribuição mensal à Colônia de Pescadores.

Outro favorecido mudou-se Búzios, segundo informado pela inquilina e vizinhos. O seu imóvel tem duas unidades em um sobrado, uma comercial e outra residencial, ambas alugadas. O beneficiário é pedreiro, segundo informado pela vizinhança, e está construindo outro sobrado na rua adjacente.

No município de General Maynard (SE), um beneficiário que trabalha na prefeitura municipal recebeu R$ 3,6 mil do Seguro Defeso. A proprietária de um restaurante levou R$ 7,2 mil. Outros dois trabalhavam com revenda de confecções e de biscoitos industrializados. Cerca de 75% das pessoas selecionadas pela fiscalização não têm a pesca como fonte de renda. Entre os 3,3 mil habitantes, 150 recebiam o seguro. De 2011 a 2017, eles foram contemplados com R$ 1,5 milhão.

Em Porto Velho (RO), um beneficiário declarou que nunca foi pescador e que exerce atividade pesqueira como esporte. Disse ainda que não tem nenhuma vinculação com a colônia dos pescadores. Ele é aposentado há mais de 24 anos pela Polícia Militar, mas possui cadastro, carteira de pescador vinha recebendo o defeso.

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