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A revolução tecnológica da Reforma Tributária
| Foto: Cleber Gomes

É unanimidade entre os brasileiros a necessidade de uma Reforma Tributária. Atualmente, discute-se qual é a melhor proposta e há debates políticos e técnicos sobre detalhes, mas não há quem discorde de que é necessário mudar. Há dois projetos tramitando, a PEC 45/2019 da Câmara e a PEC 100/2019 do Senado. Não importa qual será o vencedor, teremos uma revolução tecnológica na forma de recolher impostos no Brasil.

O debate obviamente tem sido centrado na simplificação de impostos e em como acabar com as cobranças em cascata, mas há um ponto importante que foi discutido e não tem sido comentado: a forma de cobrar e fiscalizar precisa ser atualizada.

Uma das mentes a quem mais têm recorrido os deputados e senadores é do engenheiro e pioneiro da indústria de tecnologia no Brasil, Miguel Abuhab. Ele esteve em São Paulo e me concedeu uma entrevista em que explica a novidade que estamos prestes a viver.

A grande mudança no projeto é atacar a raiz do problema. Nossa legislação geralmente é feita para remendar efeitos, as raízes continuam lá, geram mais problemas, fazemos mais remendos e aí esses remendos começam a dar problema. A tecnologia vai entrar definitivamente no combate e prevenção da sonegação de impostos.

"O pagamento do imposto é iniciativa do contribuinte. Agora, se ele tem dificuldade de caixa ou os diversos problemas que possam estar aparecendo, esse contribuinte vai falhar, não vai pagar. E então o governo, sempre trabalhando em cima de efeitos, fala 'ah, então nós vamos criar o Refis.'" - Miguel Abuhab

A Nota Fiscal Eletrônica é algo que foi implementado com bastante sucesso no Brasil, mas não estamos aproveitando a evolução tecnológica para simplificar processos. Utilizamos as mesmas regras do jogo de antes, quando não tínhamos computadores. Se a realidade muda, precisamos mudar as regras de forma inteligente.

"Essa eletrônica praticamente colocou no computador aquilo que se fazia nos sistemas manuais. Então nós não criamos novas regras, nós não simplificamos os processos em termos de impostos. A complexidade que existia anteriormente se colocou no computador." - Miguel Abuhab.

Essa parte da Reforma Tributária tem a ver especificamente com ICMS, Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços. A ideia é que seja substituído pelo IVA, Imposto sobre Valor Agregado. Na prática, o que isso significa em termos de método de cobrança? Que em vez de controlar a circulação da mercadoria e dos serviços, o governo brasileiro passará a controlar a entrada e saída de dinheiro.

"Toda essa parafernália que se construiu para verificar que tem uma nota fiscal e que essa nota fiscal representa o não sei o quê sobre o qual vai se pagar o imposto. O fato é que num sentido vai a mercadoria e no outro sentido volta o dinheiro. Então, é muito mais fácil controlar a volta do dinheiro do que a ida da mercadoria." - Miguel Abuhab

A parafernália inclui os postos de fiscalização em estradas e nas cidades, um esforço monumental e caríssimo que, no final das contas, não tem garantido o fim da sonegação. Enquanto os sonegadores estão deitando e rolando com as benesses da tecnologia, o Estado continua preso às regras do jogo de um mundo analógico.

Uma forma popular de sonegação tem sido grande empresário fingir que se enquadra no Simples para pagar menos imposto. Como ele faz isso? Dá nota até o limite do Simples, mas também vende sem nota. Como o governo controla a circulação das mercadorias e não o que entra e sai de dinheiro, acaba deixando num regime especial de tributação quem não deveria estar nele.

"Fatura um valor muito baixo e, por faturar um valor muito baixo, paga um valor menor, se enquadra nos programas Simples, mas nem sempre os valores que estão circulando no banco, os valores que a empresa recebe estão compatíveis com aquilo que se declarou em termos das notas emitidas por essas empresas." - Miguel Abuhab

O novo sistema de cobrança vai eliminar uma parte gigantesca da burocracia desnecessária e ineficiente que é um pesadelo do empresário brasileiro. Além disso, vai tirar da frente a necessidade diária das empresas de se atualizar sobre regras tributárias novas em todos os Estados e Municípios brasileiros. A ideia é que o sistema de pagamento de ICMS seja automático: ao comprar algo, a empresa recebe a parte dela e o imposto vai direto para o caixa do governo, sem que ela precise recolher e depois repassar.

Outra novidade é o fim do pesadelo de tomar calote e ainda ficar devendo imposto do que não recebeu. Como o governo recebe o imposto automaticamente no pagamento, toda a cadeia produtiva fica segura de que não vai virar inadimplente se tomar um calote e não tiver mais como cancelar a nota emitida. Atualmente, o empresário emite a nota e precisa quitar o imposto referente a ela na virada do mês, não importa se recebeu ou não pelo produto ou serviço. Em tempos de crise, é uma mudança muito bem vinda.

"A retenção do imposto é conforme o próximo elo vai pagando. Conforme ele paga o seu boleto, o seu crediário, o seu carnê, automaticamente vai para o caixa do governo. Então, não existe a situação de você precisar tirar o dinheiro do seu caixa para pagar os impostos." - Miguel Abuhab

Outro ponto atacado é como lidar com alterações tributárias nos Estados e Municípios. Há quem argumente que o melhor é fazer uma alíquota única e isso está sendo discutido politicamente, mas há diversas barreiras devido às imensas diferenças regionais do Brasil. Outra discussão é sobre cobrança de ICMS na origem ou no destino. Por enquanto, temos órgãos legislativos municipais e estaduais fazendo regras diariamente e empresários com muita dificuldade para se atualizar.

Qualquer que seja a decisão do Congresso sobre os impostos, o novo sistema de cobrança tira das costas do empresário o ônus de se atualizar sobre regras tributárias. São os Estados e Municípios que têm a obrigação de atualizar no sistema, que envolverá bancos e empresas de cartão de crédito, suas regras de recebimento. Quando o fazem, automaticamente boletos e cartões direcionam o valor correspondente à alíquota correta.

"A compra que faz na internet, ao passar o cartão, automaticamente é debitado o imposto de acordo com as regras do destino. Então, isso também facilita e recolhe automático." - Miguel Abuhab

O pulo do gato é buscar a raiz dos problemas em vez de ficar eternamente lidando com os efeitos, num processo de enxugar gelo. O Congresso Nacional volta esta semana às atividades normais, com um grande desafio pela frente: entregar uma Reforma Tributária que promete mudar completamente o ambiente de negócios no Brasil.

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