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O youtuber Felipe Neto.
O youtuber Felipe Neto.| Foto: Reprodução / YouTube

Começo já pedindo desculpas antecipadas à ex-BBB Lumena por não ter pedido a ela permissão para falar deste tema. Aliás, também peço desculpas a todos os feministos por não tê-los consultado antes de escrever. Já sei como isso termina. Vão ficar mandando mensagem aos colegos jornalistos, seguidores e influencers falando mal de mim. Aquela tradicional pressão para parar de falar comigo ou de me seguir. Pelas costas, claro. Como estou muito preocupada, resolvi escrever do mesmo jeito.

Gostei muito do especial do Felipe Neto na Netflix. É ótimo ator. Ali, separando a própria persona entre o Felipinho do Bem e o Felipinho Malvadeza, nos dá uma informação crucial. Confessa que tentou sucesso no YouTube de várias formas, mas ele só veio com o ódio. Fez escola, criou um método infalível que se arrastou para a política e o arrastou para a política também. Infelizmente, não posso fazer parte do fã-clube do Felipe Neto porque ele me bloqueou. Isso faz tempo, é quando eu cobrava por que tanto lixo nos vídeos infantis.

Uma coisa que nós precisamos aprender sobre produção de conteúdo nas redes sociais é que o conteúdo não importa. Já tive dúvidas sobre isso. Quem as sanou foi o ministro Barroso, presidente do TSE. Diante da live dele sobre fake news com Felipe Neto, aderi ao axioma da desimportância completa do conteúdo. O que vale é o contexto. Influencer com zilhões de seguidores, rico, poderoso, diversos acordos com as plataformas de redes sociais.

É verdade que, naquele momento, ele tinha informações importantes. Havia rastreado em tempo real, com ajuda das plataformas, um ataque em massa feito contra seus perfis por adversários políticos. Trata-se de algo incomum. Extremistas não são obcecados por adversários, mas por pessoas do mesmo pólo político que não admitem o radicalismo. Passe a reparar. Se o radical for cristão, vai pegar no pé de quem não considera cristão o suficiente. Vale para progressista, feminista, esquerdista, direitista, liberal.

Na lógica das redes sociais, pouco importa como você age, o que você já fez ou que tipo de imundície tolera. Importa escolher um time e apontar o dedo para quem não for bom suficiente para estar no time com você. E, claro, sempre com muito ódio. Sou da época em que se chamava recalque desdenhar de alguém dentro do próprio grupo. Hoje chama estratégia. Se está apontando que a pessoa precisa melhorar, evidentemente é melhor que a pessoa. E é assim que Felipe Neto passa de produtor de filme lixo para criança a progressisto contra fake news. Gênio.

Pessoas que agem exatamente da mesma maneira tentam definir-se como opostas. Radicais que se intitulam progressistas tendem a pensar que são o oposto de radicais auto-intitulados conservadores e vice-versa. São o mesmo, às vezes em estágios diferentes do radicalismo. As pessoas não defendem aquilo que dizem defender. Pessoas são a forma como agem e o que toleram. Numa única semana, a queda de Lumena e o imbroglio do xadrez desnudaram a hipocrisia de um gigante das redes sociais.

Durante a pandemia, Felipe Neto criticou duramente quem se recusava a cumprir medidas sanitárias. Em determinado momento, foi flagrado numa pelada com os amigos, descumprindo medidas sanitárias. É milionário, tem muitos fãs, arruma uma desculpa. Se fazer de sonso sempre funciona dentro do próprio grupo. Não precisa nem pedir desculpas porque vai ter quem arrume.

Essa forma de ser e viver foi escancarada para o Brasil no Big Brother 21, com as presenças da cantora Karol Conka e da psicóloga Lumena, que trabalhava na produtora de Felipe Neto. Não há mais eloquência que a surpresa das duas ao ver que seu comportamento não é aprovado pelo cidadão comum. Quer dizer, há sim. A tentativa de arrumar desculpa para duas mulheres adultas agirem com arrogância e crueldade fala mais alto.

Na era das redes sociais, quem diz defender uma causa pode tudo. O grupo que defende a tal causa, seja de verdade ou também só para aparecer em rede social, promove uma blindagem. As duas perdedoras do Big Brother falam essa variante de linguagem do Terceiro Reich criada para que progressistas possam se identificar. Todos os demais membros da tribo arrumarão uma desculpa para qualquer coisa que elas façam, desde que não contestem a tribo jamais. Pode até fazer o oposto do que prega, não tem problema. Mas continue pregando e usando a novilíngua.

Reparem que já acabou a comoção em torno do tal Lucas, o que pediu para sair do programa porque não aguentava mais as duas militantes do bem atazanando a vida dele. Agora ninguém mais lembra, não tem espaço. A ordem do dia é salvar as reputações de pessoas que escolheram ser más e são adultas. Grupos fanáticos não dão a mínima para quem é de fora do grupo. Ao mesmo tempo, arrumarão todo tipo de desculpa para quem é de dentro do grupo.

Há uma confusão entre militância e linguagem. A pauta identitária não tem tantos militantes assim, tem metralhadoras de conversa de Centro Acadêmico sobrando. Da mesma forma, a pauta conservadora tem poucos conservadores. O que sobra é homem xingando mulher, falando palavrão em público, fazendo pouco do sofrimento alheio e tentando humilhar pessoas de destaque.

Devido à fama, fizeram recentemente um gerador de discursos da Lumena. Eu recomendo vivamente. Vejam o meu discurso: "Abusou psicologicamente da mulher branca socialmente privilegiada, em detrimento da pauta antirracial perpetuando o fascismo, prestou desacolhimento dos pretos, pardos, miscigenados, indígenas e autoproclamados ressignificando a conversa com inverdades. Assumiu o lugar de fala da ancestralidade das mulheres trans dos gays e não-binários". Minha cara. Vou ver se falando isso os feministos param de tentar puxar meu tapete. Mentira, não vão parar nunca.

Trata-se de uma seita que só vê sentido no mundo separando as pessoas por identidades em nome de uma suposta equidade. Todos os que disserem acreditar nessa lenda urbana terão proteção, independentemente do que façam. Esquece essa coisa de ação e reação, Isaac Newton tupiniquim! Nada tem a ver com fatos e indivíduos, só com teoria. E é aí que chegamos ao episódio mais patético do bom-mocismo de internet, a treta do xadrez.

Anos atrás, Felipe Neto fez um vídeo desancando um jogador de xadrez. Teria sido desonesto. Se você teve a paciência de chegar aqui sem pular parágrafo, entende toda a estratégia. Atacar alguém é o que gera engajamento. Atacar dizendo que é desonesto, principalmente com muito ódio, quer dizer que você é honesto. Não faz nenhum sentido, eu sei, mas funciona. Estamos na era da figueira que dá uva, ninguém olha os frutos.

Ironia do destino, o próprio Felipe Neto foi banido do site Chess.com por usar exatamente a mesma técnica de roubar no xadrez. Políticos acusados de roubar dinheiro público ficaram muito indignados com o influencer. Xingaram o dia inteiro no Twitter. A turma do deixa disso chegou rapidamente. O influencer explicou nos principais órgãos de imprensa que não roubou, só usou um artifício para "treinar" xadrez. Precisaremos de um grande esforço de desentrouxamento para chegar no nível do Chess.com.

O flagrante foi em uma partida específica, mas os enxadristas parecem ser menos tontos que nós. Matriculei meu filho no xadrez aos 3 anos de idade. Sei bem como a geração que desce morro em caixa de papelão se acha valente mas é feita de trouxa toda hora. Ocorre que todo o histórico do influencer, do qual ele se gabava nas redes sociais, é muito suspeito. Fora a protagonista do Gambito da Rainha, não se sabe de ninguém que chegou a Kasparov tão rápido.

Felipe Neto já tinha feito coisa parecida no Minecraft. Pouco importa, continuará a ser um bastião em defesa da verdade, contra trapaças e fake news. Ele xinga o Bolsonaro. Como inimigo do meu inimigo é meu amigo, muitos dos críticos de Bolsonaro acabam se abrigando em Felipe Neto. Entre os apoiadores de Bolsonaro também há muitos críticos de Jean Wyllys. E assim caminha a humanidade. Um dia chegaremos ao nível dos sites de xadrez, por enquanto vamos ficando aqui nessa bocha de final de semana.

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