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O curso de Gabriela Prioli explica o sucesso do Bolsonarismo
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Há anos a militância de esquerda deixou de ser dominada por movimentos políticos ou de trabalhadores e passou a ser um conglomerado de recalque, patrulhamento e agressividade de gente mimada. Sobretudo após o início da década de 2010, quando as mídias sociais facilitam o processo de fingir que está militando sem sair de casa e a esquerda brasileira está no poder, os líderes se distanciaram das bases. Caíram nas graças de uma variável agressiva e arrogante do sertanejo universitário, que está se lixando para o povo, pouco entende de política, mas quer mandar na vida de todo mundo.

Mestre em Direito Penal e professora universitária, a advogada Gabriela Priolli tornou-se conhecida do grande público após suas aparições na CNN, onde é contratada. Ganhou depois mais espaço na mídia. Representa, nesses espaços, uma figura que se contrapõe aos defensores mais aguerridos do presidente Jair Bolsonaro. Ela resolveu lançar um curso chamado Manual da Política Nacional. O natural seria receber críticas dos defensores do presidente e apoio dos opositores, certo? Errado. Para os opositores, ninguém é bom o suficiente para escapar da patrulha e do cancelamento.

Esse movimento de ataque movido pelo recalque também ocorre no bolsonarismo, mas é tarefa suja, geralmente delegada a figuras menores ou covardes, escondidas sob perfis falsos e robotizados. O que espanta na esquerda é que nomes consolidados politicamente se disponham a debochar gratuitamente de alguém do mesmo campo ideológico pelo que parece ser pura inveja.

É com sororidade que Gabriela Prioli já foi apelidada, por publicações jornalísticas de esquerda, de "coach de política". Ela jamais se intitulou assim, é puro deboche. São incontáveis os perfis de famosinhos da internet revoltadíssimos com o preço do curso, R$ 487, que podem ser divididos em 12 vezes. Se o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC se dedicasse a esse tipo de atividade, Lula não teria sido eleito nem síndico de prédio.

Esqueça direita e esquerda, pense em política real e vida real em contraste com chilique na internet e melindre. Se um intelectual de esquerda lançasse, na década de 90, um curso de política para pessoas da classe média, isso mobilizaria os movimentos de esquerda? Digo por experiência: não. Inúmeros cursos foram lançados e ninguém se mobilizou porque curso é projeto particular e, se o foco do intelectual é a classe média, natural que cobre preços de classe média pelo trabalho que fez. Militante que se dedica ao tema no meio de uma pandemia e em ano eleitoral é militante mesmo? Talvez seja só encostado ou queira simular nas redes sociais uma militância que não exerce.

O principal ponto fraco da esquerda brasileira está no domínio do novo cenário do debate público: a internet. Munida da sua tradicional arrogância, parte da intelligentsia brasileira e quase a totalidade do establishment acha que sabe como funciona o novo contexto do debate público. Só que não sabe coisa nenhuma e continua agindo como se ainda existisse um mundo que já acabou, onde o debate público é feito de argumentos.

Os argumentos dependem da caixa de ressonância onde estão colocados ou serão inúteis. Simplificando a questão: se você estivesse num berçário com cinco bebês chorando ao mesmo tempo, você argumentaria com eles sobre como o choro os prejudica porque atrapalha quem distribui as mamadeiras ou você distribui as mamadeiras de vez? É simples assim. O debate político já foi feito de argumentos racionais e não é mais nem será. O contexto da internet, programado por inteligência artificial para se mover por emoções, lida com emoções. Quando elas são desconsideradas, temos ineficiência.

No espaço de debates da internet, pouco importa qual o argumento de alguém sobre o tal do curso da Gabriela Priolli, importam as emoções. Quando a esquerda, que parecia celebrar a atuação dela, passa a se dedicar com persistência à crítica, deboche e condescendências, qual a mensagem que passa ao público?

Imaginam os luminares que passarão adiante suas evidentes qualidades de justiceiros sociais de teclado, inconformados com alguém que cobra R$ 487 por um curso num país de miseráveis. Outros inteligentinhos crêem - mesmo - que é útil entrar numa rede social para debater a questão da racionalidade na política, temática central do curso. Não sei o que esperam ao argumentar que chegamos aqui por impor a racionalidade e desprezar as características humanas. Estão fazendo exatamente isso quando escolhem uma rede social para se juntar a multidão que desce o sarrafo em alguém de seu campo político.

Arrogância é bicho que come o dono. Por imaginar que sabe e se comportar como quem sabe no que se transformou o debate público com as redes sociais, a esquerda toma um 7 x 1 por dia do bolsonarismo. O que sobra de tudo o que foi dito sobre o curso de Gabriela Priolli: "ninguém é bom o suficiente para a gente". E daí, em ano eleitoral, o cidadão que estudou menos do que gostaria já fica pensando o que esse povo acha dele. Afinal, nem a moça da TV, que é professora de faculdade, presta ou tem profundidade suficiente.

Talvez as forças de oposição a Jair Bolsonaro apostem todas as suas fichas em apontar os erros do presidente e na reação popular quando, em determinado momento, o auxílio-pandemia pesar demais nos cofres públicos. Mas de que forma essas forças trabalham para se viabilizar como alternativa e apresentar um projeto concreto de país? Por enquanto, dando palco para playboy xingar todo mundo que não é perfeito e tirar sarro de tudo o que o povo gosta.

Nesse contexto, pouco importa para o povo o esforço hercúleo da oposição, dos intelectuais, artistas e jornalistas em ficar apontando erros de Jair Bolsonaro o dia todo e madrugada adentro. Esses mesmos grupos também se juntam para atacar os seus próprios quando estes não obedecem, cometem um erro ou causam inveja. O resultado é minimizar os erros que apontam no presidente e dar a ideia de que só aquela panelinha de gente perfeita vale a pena. Infelizmente, talvez não seja só uma ideia.

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