Não faz muito tempo, milhões foram às ruas apoiar uma candidatura empoleirada no nacionalismo, um discurso avesso à maneira tradicional de fazer política e acima de tudo anticorrupção. Um genuíno fervor tomou conta dos jovens; já para os calejados foi inevitável evocar Fernando Collor de Mello. Pois, à feição do roteiro vivido pelo caçador de marajás, a imagem do mito começa a derreter.
A discussão sobre o peso que o antipetismo e o atentado à vida de Jair Bolsonaro tiveram na sua vitória será eterna. Contudo ambos foram úteis para fantasiar um sindicalista de liberal, alguém intelectualmente primitivo em presidenciável; um patrimonialista na pessoa mais adequada para pôr ordem na casa — contanto que não considerassem a sua.
Para sorte da sociedade, a despeito de uma quase infantil predisposição para o autoengano, o tempo conserta tudo. O tempo e a natureza do presidente.
A recente tentativa de intromissão de Jair Bolsonaro na Polícia Federal é inadmissível. Não à toa, trata-se de uma investida com o propósito claro de reprimir um órgão responsável por investigar casos como o do envolvimento de seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), com milicianos. Movimento esse que de lambuja serviu para aumentar a fritura do ministro Sérgio Moro, antes supertrunfo eleitoral e hoje cada vez mais desprestigiado.
Felizmente a PF se rebelou. Espera-se que mantenha a posição. Até para deixar claro o autoritarismo e a preocupação permanente do mandatário em favorecer e proteger seus familiares.
Outra prova de que não temos um líder exatamente comprometido a andar em linha reta, como o seu parecer sobre o projeto que pune o abuso de autoridade deve indicar, fica evidente nessa sua aproximação com o ministro Dias Toffoli e o presidente do Senado, David Alcolumbre (DEM-AP).
Não por acaso, nos últimos dias o Coaf foi esvaziado — com a decisão de Toffoli de suspender os processos baseados em dados do órgão iniciados sem ordem judicial, como o que envolvia Flávio —; a Polícia Federal foi enquadrada e o caminho para a aprovação de Eduardo como embaixador foi pavimentado, por meio da disposição de Alcolumbre em controlar a ampulheta até que haja uma margem segura de votos.
Bolsonaro contou com um enorme sentimento de rejeição a seu favor. Não só em relação ao PT, mas também à política. Compõe há décadas esse mesmo sistema tão repudiado, contudo sua verve anárquico-reacionária foi suficiente para convencer quem no fundo sempre quis se enganar.
Seu azar é que o período eleitoral está ficando cada vez mais distante. Não por acaso a todo momento tenta reavivar o ameaçador fantasma da esquerda.
Àqueles que foram às ruas empurrar o bolsonarismo, hoje, é só isso o que resta: apoiar-se no inimigo imaginário e na mentira branca que tenta vender um embate inevitável nas últimas eleições. Como se não tivesse havido um primeiro turno. Como se não houvesse tido alternativas além de Jair Bolsonaro.
A narrativa que falava na prevalência da capacidade técnica sobre a ideologia, no trato exemplar com a coisa pública, no fim das mamatas e penduricalhos, bem, essa acabou.
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