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Foto: Nelson Almeida/AFP
Foto: Nelson Almeida/AFP| Foto: AFP

“Isso é péssimo para a imagem das Forças Armadas. É preciso dizer isso de maneira muito clara: o Exército está se associando a esse genocídio, não é razoável. É preciso pôr fim a isso”, declarou Gilmar Mendes no último dia 11, durante live organizada pela IstoÉ. As reações por parte dos militares e do governo foram imediatas: Fernando Azevedo e Silva, ministro da Defesa, emitiu nota de repúdio; o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), falou em “injusta agressão sofrida pelo Exército Brasileiro”; e o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, cobrou um pedido de desculpas.

À época, não faltou quem visse excesso no comentário de Gilmar. Se excesso houve, foi de franqueza.

Quinta-feira (25), em entrevista à jornalista Natuza Nery, o senador Major Olímpio (PSL-SP) revelou ter recebido a proposta de liberação de R$ 30 milhões em emendas parlamentares para que fossem distribuídos à sua base política. A aproximação se deu por meio de um intermediário do governo e nem todos os senadores teriam recebido a oferta. Ainda segundo Olímpio, o destino original do dinheiro era o combate à Covid-19.

Um dia antes, quem ainda se enoja com este que é o momento mais dramático em nossa história recente teve motivo de sobra para sentir engulhos: o Tribunal de Contas da União (TCU) apontava que, até 25 de junho, o ministério da Saúde havia gastado somente 29% dos recursos disponíveis para o enfrentamento da pandemia. Dos R$ 38 bilhões à disposição, apenas R$ 11 haviam sido utilizados.

Some-se à denúncia a avaliação feita pelo ministro do tribunal, Benjamin Zymler, sobre a transferência de recursos para estados e municípios: “não seguem nenhuma lógica identificada”. De acordo com Zymler, o ministério demonstra “incapacidade” para gastar a verba.

A pasta terá duas semanas para se explicar ao tribunal, entretanto seu comandante interino, general Eduardo Pazuello, já se antecipou com uma metáfora digna do zeigeist: “não é uma corrida de 100 metros”.

Tem mais.

Descortinou-se a tentativa por parte do Comitê de Operações de Emergência (COE) do Ministério da Saúde de esconder dados sobre a falta de insumos e medicamentos. A ata da reunião é de 29 de maio. Pazuello já era ministro e o Brasil acumulava 27.878 óbitos, vítimas do novo coronavírus.

Quatro dias antes, 25 de maio, ele ignorara a recomendação do mesmo comitê, que desaconselhava a compra de cloroquina, encaminhando um pedido de 3 toneladas do medicamento.

Seja por incompetência ou revanchismo político, quiçá por ambos, o governo Jair Bolsonaro é sócio majoritário na morte de dezenas de milhares de brasileiros.

Pouco importa se “genocídio” incomoda. Incomodados estão os parentes das vítimas que morreram e ainda morrem como passarinhos. Muitos desses teriam sido salvos se tivéssemos adotado políticas sanitárias adequadas, se tivesse havido interesse e capacidade para estabelecer uma coordenação inteligente com estados e municípios, se tempo precioso não tivesse sido perdido com a insistência em drogas inócuas.

A inépcia do governo é tão patente quanto o asco por regras de conduta e pela ciência, uma vez que ambas remetem a um mundo avesso à ignorância e à rudeza. Prevalece uma excitação pela afronta e pelo desmoronamento.

As inúmeras demonstrações de menosprezo pelo risco que a doença impõe e a implicância com a utilização de máscara não se deram por acaso, como o recente episódio do contato do presidente com garis em Brasília evidenciou. O lobby pela cloroquina enseja um interesse mercadológico, mas é por meio de sua ineficácia que o placebo encanta Bolsonaro.

Gilmar foi no ponto. Temos um morticínio em andamento. Ópera maléfica, conduzida por uma gente parva e com traços claros de sociopatia. Faltou dizer que eles estão só no começo. O foco verdadeiro é na alma e na mente do povo.

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