“Vamos dar um não à desordem, à bagunça, à baderna, à bandeira vermelha. Vamos dar um sim à bandeira do Brasil, verde, amarela, azul e branca”, disse o então candidato à presidência da República, Fernando Collor de Mello, em dezembro de 1989. “O povo pobre não precisa mais de formador de opinião. Nós somos a opinião pública”, declarou Luiz Inácio Lula da Silva mais de duas décadas depois. Ambas as frases chamam a atenção por suas naturezas: uma nacionalista e de viés antipolítico, a outra promovendo o desprezo à crítica e a fragmentação da sociedade. Também chamam a atenção por se encaixarem perfeitamente na retórica do presidente Jair Bolsonaro.
Sei que frustro o leitor ávido por escaramuças ideológicas, mas não entrarei no debate sobre qual dos três foi mais eloquente ou maléfico à democracia. E não porque a administração Bolsonaro ainda não terminou, tornando injustas as comparações. Com um ano e quatro meses passados, já é possível afirmar, em relação ao atual governo, que não houve comando mais inepto e cruel na história da Nova República. O ponto aqui é outro: ainda que a gestão bolsonarista não dure eternamente, à sociedade cabe parar de insistir no erro.
Se há uma característica que permeie o cenário político-eleitoral desde a reabertura democrática essa é sua ancoragem no populismo. Foi contando precisamente com esse aspecto que Jair Bolsonaro se elegeu e tentará se reeleger — sanha norteadora de seus passos desde o primeiro dia de mandato, embora tenha acenado com o apoio ao fim do instituto da reeleição durante a campanha.
Nesse sentido, expectativa por um salvador da pátria à parte, não pode haver maior desserviço ao país do que tachar alguém de esquerdopata, reaça e afins. Bem como encastelar-se em patotas nas quais impera o pensamento único, imaginar-se em condições de perdoar posicionamentos políticos ou votos pregressos. Que caminho para o diálogo poderá existir, em um ambiente tão partido, quando a união for necessária para derrotar um mal comum?
Em 2022, a sociedade deverá fazer uma escolha, talvez a mais importante em gerações: se continua apoiando um discurso cujo propósito é dividir e tiranizar — sem falar em oito anos sob a batuta de alguém capaz de elaborar um “e daí?” quando 5 mil pessoas morrem vítimas de uma doença por ele mesmo menosprezada —, ou se retoma a trilha humanista e democrática.
Reconheço que me afobo ao citar 22. Como já está claro, as instituições não pretendem aliviar para os desmandos de Bolsonaro. O número alto de mortos pela covid-19 em confronto com a postura irresponsável do presidente, bem como uma recessão econômica que levará anos para ser vencida podem definir o clima necessário para abreviar tão ingrato roteiro. Ainda assim, mudar a nossa maneira de enxergar a política permanecerá um desafio. E ele é maior do que o sepultamento de um desgoverno.
Talvez uma ampla admissão de culpa seja necessária para sacramentar um pacto envolvendo todos aqueles que, mesmo em diferentes partes do espectro ideológico, defendem os princípios democráticos e a busca por justiça social.
Devemos aceitar, afinal, que há algo de muito errado com uma coletividade quando ela teima em reverenciar discursos destinados a fazê-la sofrer. Em comprar narrativas que apostam na subversão do debate e não em unir pessoas em torno de agendas de mútuo interesse.
Pois que assim seja. Façamos um nostra culpa.
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