Ouça este conteúdo
Com envio zero de resíduos para aterros desde 2021, a fabricante paranaense de papel cartão Ibema virou referência na destinação sustentável dos dejetos da linha de produção. Tanto que vem sendo procurada por outras empresas para compartilhar a experiência no cumprimento da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
A lei federal 12.305/2010 determina que 48,1% de todos os resíduos sólidos urbanos devem ser reciclados ou recuperados até 2040, o que vem provocando uma corrida da indústria para a destinação correta das sobras da produção. Último levantamento da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) em 2018 mostrava que o país produzia 79 milhões de toneladas de resíduos sólidos por ano - volume que deve ter subido com o aumento de consumo nas residências na pandemia.
Uma das líderes da América Latina na fabricação de papel de embalagens, com produção anual de 150 mil toneladas e 700 colaboradores, a Ibema começou a preparação para zerar o envio de resíduos a aterros industriais em 2018. A empresa primeiro concluiu o processo na filial em Embu das Artes, na grande São Paulo, em 2019. Na sequência, foi a vez da matriz em Turvo, na Região Centro-Sul do Paraná, zerar os envios a aterros em 2021.
Selo aterro zero
Com o processo completo nas duas plantas, a Ibema obteve o selo "Aterro Zero 100%" da consultoria Estre, uma das maiores empresas de serviços ambientais do país. Ou seja, a Ibema encaminha todos os dejetos das duas fábricas para reaproveitamento por ações próprias ou com parceiros e fornecedores. Além da fabricante de papel, também conquistaram o mesmo título a Ambev, a Leão Alimentos e Bebidas, a Arcor, Kimberly Clark e a CBA.
Exportadora para o mercado europeu, a Ibema busca agora uma entidade que possa certificar a empresa internacionalmente como Aterro Zero. O Brasil ainda não possui certificação específica dessa modalidade.
"A Ibema faz reciclagem do resíduo de outras empresas. Portanto, não dava para reciclarmos o lixo dos outros e não darmos destinação correta ao nosso próprio resíduo", enfatiza a gerente de Qualidade, Meio Ambiente e Sistemas de Gestão da Ibema, Andrea Pegorini. "O lixo é um problema na sociedade. Por isso temos que usar o solo de forma mais inteligente do que depósito de lixo Se todos fizerem um pouco, dá para reduzir o uso de aterros, que além de usar o solo emitem CO2", aponta.
Conheça seu resíduo
Para dar destinação 100% ambiental aos dejetos, a Ibema teve um custo a mais de 10% em relação ao envio dos resíduos a aterros sanitários. A reutilização dos resíduos gerados na linha de produção é feita em três frentes: reciclagem, coprocessamento e compostagem. O processo exige levantamento criterioso de quais resíduos a indústria produz e como eles podem ser reutilizados.
"O primeiro passo que qualquer empresa tem que fazer para destinação correta é conhecer bem seu resíduo. Esse mapeamento ajuda a valorizar o dejeto que vai ser reutilizado. E isso parece simples de ser feito, mas não é, porque pode exigir alterações nos métodos e procedimentos de produção, como na embalagem ou na moagem e até na preparação para o reuso", explica Andrea.
"O valor obtido nesse processo não é financeiro. Mas o impacto da marca perante a sociedade é muito grande. Tanto que muitas empresas, inclusive clientes, têm nos procurado desde então para saber como estamos fazendo", enfatiza.
Destinação
Andrea cita o caso das cascas das árvores utilizadas na produção de papel na unidade de Turvo, que trabalha apenas com a fibra virgem. Antes, esse resíduo era descartado em aterros. Agora, as cascas viraram combustível, queimadas na caldeira da fábrica.
"A primeira coisa a ser feita no mapeamento é verificar se o resíduo não pode ser reutilizado no próprio lugar em que foi produzido. Se não puder, aí se busca outra destinação, sendo que há resíduos que a empresa vende e resíduos que a empresa paga para destinar", reforça Andrea.
É o caso dos cartões de papel que chegam com plástico grudado à usina de reciclagem de Embu das Artes, unidade que tem 80% da fabricação de papel cartão com origem reciclada. A Ibema teve que adicionar uma etapa a mais na produção, que é a separação do papel e do plástico. O papel é reciclado na própria unidade. Já o plástico é enviado para outras indústrias.
Reciclagem e economia circular
Além de reutilizar os dejetos produzidos nas próprias unidades, a Ibema também recicla resíduos de papel não só de outras indústrias, como também dos consumidores finais.
Em 2019 a empresa lançou o papel Ritagli, que tem metade da composição de papel reciclado. A maior parte da composição, 30%, é de reuso pós-consumo - ou seja, a embalagem que passou pela mão do consumidor, foi recolhida e reencaminhada para ser reciclada na filial paulista da indústria. Os outros 20% da composição são de reciclagem pós-industrial, as aparas que as fábricas encaminham para serem reutilizadas. Como a lei proíbe a utilização de papel reciclado em embalagens de alimentos, esse papel é destinado principalmente à indústria cosmética e farmacêutica.
O processo de reciclagem da Ibema envolve cooperativas e empresas parceiras dentro do conceito de economia circular. É o caso do programa Ciclobom, primeira ação de logística reversa para copos de papel no Brasil em parceria com a BO Packing, maior fabricante desse tipo des recipientes na América Latina.
Através da startup Green Mining, os copos são recolhidos e levados para a Ibema em Embu das Artes. Só em três cafeterias da marca americana Starbucks em São Paulo foram reciclados em quase dois anos 100 mil copos, cujo volume voltou para a linha de produção da Ibema.
“As grandes empresas, cada vez mais, olham a sustentabilidade de forma estratégica. Quem não quer dizer ao seu consumidor que a embalagem do seu produto foi feita com material reciclado proveniente de um processo que fecha o ciclo da logística reversa? Essa mensagem é muito poderosa aos olhos do consumidor, que está cada vez mais consciente”, avalia ”, o gerente de Estratégia e Marketing da Ibema, Diego Gracia.