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O ideal seria que o cidadão fosse informado do preço líquido dos produtos (sem impostos) e depois, ao pagar a compra, soubesse do valor total (com impostos). Sentiria na hora o peso do Estado.
O ideal seria que o cidadão fosse informado do preço líquido dos produtos (sem impostos) e depois, ao pagar a compra, soubesse do valor total (com impostos). Sentiria na hora o peso do Estado.| Foto: Alexandre Mazzo/Arquivo/Gazeta do Povo

Um país próspero sente com intensidade os efeitos da mão invisível do mercado: mais concorrência, mais riqueza, melhores opções de compras, melhores condições de vida. Em vez disso, no Brasil, sentimos o peso invisível do Estado, que nos empobrece e enfraquece a nossa cidadania.

No Índice de Liberdade Econômica, a pontuação do Brasil em saúde fiscal é de apenas 0,4 ponto. A dívida pública é de quase 100% de tudo que o país produz: 98% do PIB (Produto Interno Bruto). O Brasil possui uma carga tributária similar à de países desenvolvidos, de 33,1% do PIB, conforme a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em dados referentes a 2019 – maior que a carga nos Estados Unidos (25%) e Austrália (27,7%), por exemplo –, entretanto, a qualidade dos serviços públicos é proporcional à de países em desenvolvimento.

A grande pergunta é: se o Estado brasileiro, há décadas, cobra caro e entrega pouco, como os cidadãos brasileiros toleram isso? Por que as pessoas não exigem uma carga tributária menor ou serviços públicos de melhor qualidade das prefeituras, estados e do governo federal? Em grande parte, isso ocorre porque o Estado brasileiro mascara o seu peso.

Infelizmente, muitos brasileiros não sabem que pagam impostos. Além disso, a cultura do "serviço público gratuito" faz um grande desserviço à cidadania, principalmente aos mais pobres. Não há nada mais democraticamente incorreto do que dizer para o cidadão pagador de impostos que ele está recebendo algo "de graça" ou, pior, que foi um benefício ou favor de determinado político.

Não podemos esquecer daquele ditado popular que diz: “A cavalo dado não se olha os dentes”. Essa expressão popular, que surgiu pelo fato de a idade dos equinos poder ser estimada pelos dentes, significa que, ao ganharmos algo, devemos ficar agradecidos e mostrar resignação, mesmo que não tenhamos gostado.

Porém, será que isso deveria valer em uma democracia? A base de uma democracia é justamente o regime de direitos e deveres, no qual o Estado deve servir a população, já que o poder emana do povo. No momento em que o Estado esconde a carga tributária e divulga que os serviços públicos são gratuitos, a cidadania fica enfraquecida nas duas pontas. De um lado, o cidadão não percebe claramente que está pagando uma elevada carga tributária em todos os produtos e serviços que consome. Por outro lado, esse mesmo cidadão não sabe o custo real e individualizado de cada um dos serviços públicos que utiliza, acreditando que são gratuitos e, portanto, que deve ficar resignado com eventuais queixas que tiver.

Dois exemplos deixam claro como o Estado esconde seu peso do lado da arrecadação. Primeiro: na parte das relações de consumo, o Estado obriga todos os agentes econômicos a divulgarem o preço bruto dos produtos e serviços (valor com todos os tributos incluídos). Para fortalecer a democracia, o ideal seria que o preço dos produtos e serviços fosse divulgado de forma líquida (sem a inclusão dos tributos). Na hora de finalizar a compra, o cidadão teria conhecimento do valor total, muito maior. Em muitos casos, o preço a pagar seria mais do que o dobro do valor líquido. Na hora, o cidadão ia sentir no bolso o peso do Estado.

Segundo: na parte das relações de trabalho, o Estado obriga todos os empregadores a divulgarem o valor líquido dos salários (sem a inclusão de todos os encargos sociais). Para fortalecer a democracia, o ideal seria que o valor dos salários fosse divulgado de forma bruta (valor com todos os encargos sociais). Na hora de receber o salário, o trabalhador teria conhecimento de todos descontos e do valor final, muito menor. Em muitos casos, o salário pago seria menos do que a metade do valor bruto.

Do lado da despesa, outros dois exemplos claros de como o Estado brasileiro esconde seu peso. Primeiro, os governos não divulgam o custo real e individualizado dos serviços públicos. Sem essa informação, o cidadão não consegue fazer uma análise clara de custo-benefício desses serviços. Sabe-se que o custo real é muito superior ao custo operacional, mas o Estado esconde essa informação.

Segundo, os governos não incluem o custo previdenciário de seus servidores nas rubricas dos serviços de saúde e educação, por exemplo, como se esse gasto extra não fosse decorrência lógica da opção pelo modelo estatal. Mais uma vez, o Estado esconde o custo real dos serviços públicos.

Portanto, seja na arrecadação ou no gasto público, o Estado age para ocultar o seu peso real, como se usasse um photoshop para diminuir suas medidas e grandes ineficiências. Ocorre que, ao fazer isso, o Estado está, na verdade, diminuindo a nossa cidadania. Sem dúvida, quando o cidadão é lembrado do peso do Estado e do verdadeiro custo total dos serviços públicos, ele será muito mais vigilante com o tamanho e a qualidade do gasto público.

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