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A economia deve salvar Bolsonaro do impeachment
| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Dilma Rousseff não sofreu impeachment por praticar pedaladas fiscais. Petistas adoram esse argumento, mas esquecem do complemento natural: Collor não caiu pelos esquemas de PC Farias, assim como Richard Nixon não foi derrubado pelo escândalo Watergate. Crimes de responsabilidade costumam ser coadjuvantes nesses processos. O que realmente determina um impeachment é a combinação destrutiva de crises política e econômica.

Nos tempos do impeachment de Dilma, muitos cientistas políticos foram à imprensa comentar por que um presidente cai. Três fatores foram os mais citados: crise econômica, impopularidade e base parlamentar frágil.

A base parlamentar de Bolsonaro não é das melhores, mas o clima no parlamento é muito distinto daquele que caracterizou os últimos dois processos de impeachment. A esta altura de 2015, o Congresso Nacional trabalhava ativamente para atrapalhar o governo. Sob Bolsonaro, o parlamento trabalha com independência e foco numa agenda econômica alinhada ao governo. A atual insatisfação difusa dos deputados não se compara com a hostilidade aberta que precedeu o último impeachment.

É claro que tudo isso pode mudar nesse front. O presidente parece disposto a isso quando ameaça nomear seu filho Eduardo como chanceler, caso o Senado rejeite sua indicação para a embaixada em Washington. Esse tipo de chantagem não costuma acabar bem.

Na popularidade, o presidente também vai mal. Seus índices de aprovação caem consistentemente desde janeiro em todos os institutos de pesquisa, enquanto a rejeição cresce. No primeiro Ibope do ano, 49% dos eleitores avaliavam o presidente como ótimo ou bom em janeiro e 11% o viam como péssimo ou ruim. Ou seja, haviam quatro bolsonaristas e meio para cada antibolsonarista. Na última pesquisa, essa razão era de um para um: 32% da população acha o governo como ótimo ou bom e o mesmo percentual o avalia como péssimo ou ruim.

Nesse campo, apesar de ir mal, Bolsonaro também está melhor que Dilma e Collor. Os 33% de rejeição do atual presidente no último Datafolha contrastam com os quase 70% que rejeitavam os dois antecessores que forem chutados do cargo.

Apesar de fraco no diálogo com o Congresso e cada vez mais impopular, o presidente passa longe de Dilma e Collor. O problema é que o terceiro elemento do tripé – uma crise econômica – tem potencial para enfraquecer o presidente simultaneamente nos fronts parlamentar e popular. Se a economia afundar, o presidente pode perder apoio e corre risco de cair.

O crime de responsabilidade é juridicamente importante, mas factualmente secundário num impeachment. Os casos de Dilma e Collor tiveram um contexto econômico similar, combinando profunda recessão e inflação.

Em 1990, o PIB brasileiro caiu 4,35%. Em 2015 e 2016, a queda ficou em 3,55% e 3,31%. Nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro, segundo expectativas de mercado registradas no último boletim Focus do Banco Central, o PIB deve crescer 0,82% e 2,1%.

Sobre o PIB, a diferença de contexto pode ser vista no gráfico abaixo. Nele, o crescimento da economia sob Dilma e Collor é comparado com as projeções do Boletim Focus para o governo Bolsonaro. A conclusão é evidente: o desempenho é melhor e a trajetória esperada é de retomada, e não de crise como nos casos anteriores.

Cabe também notar que tanto o impeachment de Dilma quanto de Collor ocorreram em contextos de inflação alta e acelerada. O IPCA chegou a 10,7% em 2015 e 6,3% em 2016. Já o governo Bolsonaro começa sob inflação baixa, abaixo de 4%, e a expectativa atual do Boletim Focus é de continuação desse cenário até 2022.

Vale notar que a alta nos preços também aparece nitidamente no impeachment de Richard Nixon nos EUA, em 1974 – ano em que a inflação americana atingiu um dos maiores níveis da sua história, chegando a 11,1%. Já Bill Clinton, julgado pelo Congresso em período favorável para a economia, foi absolvido.

Um cenário de aceleração da inflação e volta da recessão, hoje, pode acontecer de duas formas. A primeira seria por crise internacional, que levaria à alta do dólar, elevando os preços e o desemprego. Essa é uma hipótese que segue em aberto, mas é cada vez menos provável – assim como Bolsonaro teria maior facilidade para se livrar da culpa por um problema global.

Por outro lado, a segunda possibilidade seria um colapso das contas públicas devido à não aprovação do ajuste fiscal. Com a reforma da Previdência andando, esse cenário fica cada vez menos provável. É curioso que as conversas sobre impeachment tenham voltado à tona logo após a aprovação do projeto em primeiro turno, justamente quando um afastamento de Bolsonaro se tornou menos provável.

É claro que crimes de responsabilidade importam. Ao abrir a boca sem qualquer cuidado, o presidente se expõe desnecessariamente a argumentações sobre a Lei de Impeachment. Mas todos os presidentes eleitos no Brasil tiveram algum pedido de impeachment apresentado contra si. Só dois caíram.

O presidente, boquirroto nato que não faz noção do que é democracia, parece se esforçar para incentivar debates sobre impeachment, mesmo num país tão fragilizado quanto o Brasil pós-Dilma. Apesar disso, Paulo Guedes segue no cargo e o resto do mundo continua crescendo. Os juristas odiariam admitir, mas, nestas condições, não há quebra de decoro que derrube Jair Bolsonaro antes de 2022.

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