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Alckmin
Ex-governador Geraldo Alckmin anunciou sua desfiliação do PSDB.| Foto: Eduardo Saraiva/PSDB

No dia 5 de novembro de 1973, o jovem vereador Geraldo Alckmin escreveu uma carta pedindo que o “3º Governo Revolucionário” aprovasse o pagamento de 13º salário para funcionários públicos. A carta tinha fé numa boa decisão do “ínclito Presidente Médici , que tem se mostrado sensível aos problemas sociais, trabalhistas e previdenciários dos que trabalham para a grandeza do Brasil". Segundo o dicionário Michaelis, “ínclito” significa “notável por seus méritos e qualidades excepcionais”.

A carta foi publicada por Caio Junqueira no jornal Valor Econômico. Ao consultar colegas de Alckmin naquele tempo, Caio ouviu que o então vereador era avesso a abstrações ideológicas. Ele mantinha bom diálogo com quem fosse preciso, desde que isto o ajudasse a resolver problemas de ordem prática.

Na mesma época, Covas estava cassado. FHC e Serra viviam no exílio. Além de Alckmin, Franco Montoro era o outro grão-tucano paulista que podia concorrer nas eleições daquele início de anos 1970. Coincidência ou não, Montoro foi o mestre de Geraldo Alckmin na política, segundo o próprio. Outra semelhança é que os dois nunca estiveram ligados à esquerda. Muito pelo contrário: são tucanos conservadores.

Tucanos conservadores? Sim. Como o próprio Montoro escreve no texto “Social democracia e democracia cristã”, de 1990, muitas ideologias estavam presentes na fundação do PSDB, como democracia cristã, liberalismo progressista e socialdemocracia. Durante toda a sua carreira, Montoro se descreveu como democrata cristão e era aceito como tal.

A democracia cristã é especialmente forte na Europa Continental – ou seja, na Alemanha, Espanha, Itália etc. Em comparação com o conservadorismo dos EUA e Reino Unido, a democracia cristã é menos cética em relação à democracia e abre espaço para um papel maior do Estado na economia.

Após as disputas nacionais contra o PT, a esquerda tucana diminui. Muitos dizem que sumiu. Hoje, o PSDB é um dos partidos que integram a Internacional Democrata de Centro, também conhecida por seu nome original: Internacional Democrata Cristã. A filiação internacional do PSDB é importante porque indica a quem o partido quer associar suas ideias, assim como os partidos que querem associar suas ideias às do PSDB.

Nessa Internacional Democrata de Centro, a centro-direita domina. Um dos principais membros é a União Democrata Cristã, de Angela Merkel. Outro é o Partido Social Democrata, de Portugal, que adota como logomarca uma insuspeita seta apontando para a direita.

E Geraldo Alckmin? Onde ele entra nesta história? Alckmin saiu da política de Pindamonhangaba como afilhado político de Franco Montoro. Em seu primeiro mandato como deputado estadual, foi líder do governo Montoro na ALESP. Após o fim do mandato, o padrinho passa a trabalhar para que o afilhado ocupe o seu espaço dentro do partido.

Depois de alguns anos como presidente do PSDB-SP, Alckmin foi eleito vice-governador de São Paulo e, após a morte de Mário Covas, tomou posse como governador.  Sua gestão foi marcada por pautas típicas de políticos conservadores: antes de tudo, porta-se como defensor da polícia, da lei e da ordem. Noutros assuntos, como gestão fiscal e costumes, o governador foi igualmente conservador.

Alckmin é herdeiro direto de um político conservador, tem um discurso tema conservador e seu ex-partido é associado ao de Angela Merkel. Em relação à ideologia de Bolsonaro, que nome a coisa merece? Um bom começo de resposta surge quando adotamos os mesmos métodos e observamos quem, ao redor do mundo, associa a própria ideologia à de Bolsonaro. É especialmente interessante observar quem, na mesma Alemanha, aceita se associar ao presidente do Brasil. Quando chegamos nesse ponto, fica fácil entender porque o bolsonarismo associa Alckmin e o PSDB ao marxismo. A narrativa pode ser ridícula, mas a realidade é inconfessável.

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