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Campanha internacional pode atingir em cheio o presidente
Campanha internacional pode atingir em cheio o presidente| Foto:

Um governo construído sob a égide da polarização espetaculosa possui regras que nem todos compreendem. A retórica antivacina — espécie de terraplanado médico — foi a tônica do debate nos últimos dias, mascarando temas complexos — e necessários — como agenda fiscal, reforma administrativa e recessão recorde.

Mas não apenas ela: estes quase dois anos de governo Bolsonaro tem como lógica a confusão sectária, recheando de legitimidade uma estrutura política oca e um projeto de poder simplório, resumido na figura do próprio presidente.

Tal estratagema, adequado para as redes sociais, cria armadilhas políticas por vezes insolúveis, tornando insólita a diferença de prioridades entre aquilo que é real — palpável e tangível — daquilo que é narrativa e espetáculo.

O caso mais insano deste descolamento da realidade é a estranha relação entre Jair Bolsonaro e a floresta amazônica. O presidente da república, que construiu parte do seu discurso em oposição a “ONGs esquerdistas”e “ambientalistas pederastas”, parece não entender o impacto de sua retórica (e de sua prática) na consecução de seus objetivos mais primordiais, sejam eles políticos ou econômicos.

A polarização tosca entre seu nacionalismo de goela e a pauta ambiental tem como vítima, além da própria floresta, o setor mais competitivo da economia brasileira, dependente de certificados internacionais de origem e boas práticas de preservação ambiental. Falo, obviamente, de nossa agropecuária, esteio econômico do país e alvo, por razões óbvias, de intensa sabotagem no mercado internacional.

Bolsonaro parece não se ater ao impacto de uma retórica que, se por um lado o firma como “representante de uma causa”, por outro fragiliza a posição de nossos produtores, num momento, em especial, em que a concorrência norte-americana e o protecionismo europeu se fazem mais presentes.

As desventuras com o presidente francês Emmanuel Macron, no ano passado, somadas às trocas de lacradas com a androide ambiental Greta Thumberg, converteram Bolsonaro no vilão perfeito para a narrativa verde. O presidente brasileiro, conscientemente, opta por assumir o papel de nêmesis de uma causa que, por razões particulares, tornou-se o grande trend político nas democracias européias nos últimos dois anos; boa parte do esforço publicitário do nosso agro foi jogado no lixo por conta de uma estratégia burra e personalista.

Tal drama ganha um novo capítulo nesta semana com o lançamento da campanha #DefundBolsonaro, liderada pela APIB, ONG voltada à defesa dos interessas da causa indígena no país. A organização lançou, nesta quarta feira, um impactante vídeo direcionado ao público internacional, traçando uma alegoria entre a Amazônia em chamas e grandes capitais européias — literalmente — pegando fogo.

Seu pleito é ambicioso: exige que governos, bancos e empresas retirem investimentos Do Brasil, sob o argumento de que isto “evitaria o financiamento da destruição da Amazônia”. Como brasileiro, me espanto com a manobra, sorte de tiro no pé que vai afastar dólares da economia e empregos de seus conterrâneos. Mas entendo a estratégia: atrai os olhos da comunidade internacional para o Brasil, a África do Sul ecológica do século XXI.

A campanha vem em momento importante. Reforça a narrativa do documentário “O Fórum”, que coloca em oposição o presidente brasileiro e a ativista Greta Thumberg; cria empecilhos para a entrada de capital num momento em que o país, fragilizado, propõe pacote de concessões em infra-estrutura; isola Bolsonaro no cenário internacional; fortalece a posição eleitoral da esquerda européia. É gol de placa para esquerda, e um desastre para o país.

Bolsonaro precisa escolher um rumo; em outros departamentos, como a condução política, abandonou as narrativas em prol do pragmatismo. Ganhou sobrevida. Nesta seara, encontro de crenças militaristas e polarização nas redes, firmou posição equivocada: nosso ministro do meio ambiente é um desastre e a imagem internacional do Brasil está maculada.

Chegou a hora de reconhecer mais uma derrota e adotar caminho pragmático. Sua incompetência será capaz de unir, através do medo, ambientalistas e agricultores, sob argumentos diferentes. É a lógica das redes transformada em desastre no mundo real.

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