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Destruam Sérgio Moro!
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Moro precisa ser destruído. Não por que é inimigo do governo, comunista de carteirinha ou lacaio do regime chinês; esse julgamento sumário já foi orquestrado, e o veredicto está disponível no WhatsApp. Moro precisa cair por ser símbolo. Um símbolo grande e inconveniente.

Moro representa a luta contra a corrupção. É a imagem do juiz austero e incorruptível, que não verga diante das pressões dos poderosos que ousou desafiar. É símbolo potente; Moro, perante grande parte da população, é a justiça encarnada, a vontade de punição tornada sentença. Num país em que o poder estabelecido paira sobre as leis e códigos, não é pouco: comove e convence sem precisar explicar.

A deflagração de manifestações desde 2013, assim como o colapso político que se sucedeu, dura quase uma década. Dentre todos os nomes do período — Joaquim Barbosa, MBL, Janaína, Bolsonaro —, o juiz de Maringá surge como estrela maior. Foi ele a dar sequência aos julgamentos caídos do mensalão, herança de um Barbosa que pegou sua capa e sumiu. Viveu o impeachment, prendeu Lula e participou do governo Bolsonaro; Moro é a própria linha do tempo dos recentes anos rebeldes.

Destruir Moro é apagar da história seu protagonista. É entregar um quadro em branco para que Bolsonaro e os seus pintem sua mentira — a ideia de uma “revolução brasileira” orquestrada por Olavo e realizada por Jair. O primeiro, autoridade espiritual, apontou o caminho da distante Virgínia, tal qual sábio na montanha; o segundo, soldado, enfrentou os dragões que surgiam pelo caminho.

O estratagema interessa a ambos, posto que Olavo quer amarrar-se à história brasileira e Jair permanecer no poder. Tratar Moro como o “Judas” que abandonou o verdadeiro condutor da indignação popular — Messias, aquele que “sangrou por nós” — é argumentação potente para manutenção da militância cega que dá sustentação ao presidente. Eles trabalham por analogias, símbolos, metáforas; agregam para si fieis religiosos e fanáticos políticos. Tem método — e mérito.

Bolsonaro é um farsante. É um homem vazio de tudo, deputado inexpressivo que passou a vida parasitando e enriquecendo sua família. É o avatar perfeito para que a ilusão de Olavo — alquimista das palavras, filósofo das estrelas — reescreva a história recente para dar ares de líder messiânico ao batedor de carteira narrativa. É tudo truque, golpe, malandragem: enquanto os demais trabalham, eles se apropriam do processo.

Repare, leitor, que os demais símbolos que citei possuem realizações concretas ao longo da história recente; sacrifícios foram feitos, tempo foi gasto nas minúcias de cada batalha. Seria possível comparar os inúteis mandatos de Bolsonaro à disciplina férrea de Sérgio Moro? Existe paralelo possível entre a obstinação de Janaína pelo impeachment e a lassidão de Bolsonaro no processo? Enquanto trabalhavam, Bolsonaro se apropriava. Fez-se presidente na malandragem. É um usurpador.

Farsantes, para se manter, buscam destruir tudo o que é real. Ao invés de aproximar as boas lideranças de seu governo, Bolsonaro tratou de destruí-las. Fez de MBL, Janaína, Moura Brasil, Santos Cruz, Moro e outros tantos “ traidores da pátria” — pátria esta materializada na figura do presidente que se diz constituição. Tal prática decorre do medo do contraste — da comparação —, em que sua mediocridade se faz reluzente diante da qualidade do outro. Exemplo patente disso foi a demissão de Mandetta — afastado por parecer competente.

A contradição entre a farsa construída e o Jair real — homem pequeno, frágil, dado a preocupações banais — foi bastante para destruir seu governo. Para salvar os rebentos criminosos, minou a luta contra corrupção; para não perder popularidade, sabotou o afã reformista. Resta presidente o Jair do baixo clero, agitador sindical dos quartéis que se fez deputado pra defender privilégio. Já não há mais “revolução” alguma; é apenas espuma a desvanecer.

Destruam Sérgio Moro! é o chamado dos seus nas redes sociais. Enterrem-no junto aos demais que ousaram ser enquanto eu fingi! — eis o grito louco por trás das ações do presidente. Não percebe, porém, que estão todos vivos — assustadoramente vivos! —, tal qual filme zumbi dos anos 80.

Ao fim, estaremos todos diante da cova rasa em que seu governo será jogado sem velório nem sepultamento. Os familiares, ao menos, estarão presentes.Na crepúsculo da Grindhouse bolsonariana, eis o desfecho perfeito para sua epopéia: achavam que seria Wagner, mas é só Zé do Caixão.

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