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O secretário especial da Cultura, Mario Frias.
O secretário especial da Cultura, Mario Frias.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A Secretaria de Cultura anunciou uma possível redução no teto do cachê pago a artistas com recursos da Lei Rouanet, medida que, na minha opinião, é adequada e necessária. Durante minha atuação profissional pude constatar a existência de desvios bilionários de recursos federais através da utilização dos benefícios da Lei Rouanet entre 2000 e 2016.

A Lei Rouanet, que foi implementada pelo governo Collor, funciona da seguinte forma: pessoas físicas ou jurídicas podem contribuir com o patrocínio de eventos culturais, e um percentual do valor investido é deduzido do Imposto de Renda desse patrocinador. A princípio essa renúncia fiscal seria interessante, pois o governo estaria fomentando a cultura através da iniciativa privada.

Entretanto, um dos maiores problemas que testemunhei em dezenas de investigações era a falta de fiscalização por parte do extinto Ministério da Cultura, que – na grande parte dos projetos – não exercia o devido acompanhamento, e as contas prestadas não eram criteriosamente auditadas. Por conta dessa falta de fiscalização, inúmeras fraudes eram cometidas, pois os projetos culturais por vezes não eram de fato realizados e por outras eram superfaturados.

Além disso, era possível constatar que artistas renomados e com considerável patrimônio utilizavam-se da referida lei, contudo, a essência da Lei Rouanet é fomentar a cultura, através de incentivos para pequenos artistas, para cantores e grupos de teatros regionais; ou seja, para pessoas que de fato necessitam de incentivos para iniciar suas carreiras, e não para artistas já reconhecidos e estabelecidos culturalmente.

Para se obter alguns exemplos, basta realizar uma pesquisa no Google sobre “os 10 projetos mais bizarros aprovados pela Lei Rouanet”, onde se verifica, por exemplo, que uma famosa cantora teve aprovado o incentivo fiscal de mais de R$ 1 milhão para recitar poesias pela internet; que um grande cantor sertanejo obteve a cifra de R$ 4 milhões para realizar sua turnê; e outra grande cantora baiana também conseguiu o fomento de R$ 4 milhões para diversos shows.

Agregado a essas discrepâncias, é importante esclarecer que a dedução no Imposto de Renda das pessoas ou empresas que financiam esses projetos faz com que bilhões de reais não ingressem nos cofres públicos. Esse é o maior paradoxo e dano da Lei Rouanet, pois se por um lado uma grande e milionária artista recebe R$ 4 milhões para realização de shows, por outro lado, esses mesmos R$ 4 milhões deixam de ser investidos em saúde, educação, segurança pública, saneamento e infraestrutura (o orçamento do governo é limitado).

Um país pobre e de terceiro mundo não pode se dar ao luxo de abrir mão de bilhões de reais que seriam recebidos através do Imposto de Renda para financiar eventos culturais de artistas milionários, ou de centenas de milhares de projetos fraudulentos ou superfaturados.

Evidentemente que a cultura é essencial para uma sociedade, pois ela entretém, ensina, diverte e alimenta a alma dos indivíduos, mas penso que grande parte desse financiamento em cultura não cabe ao Estado, mas à iniciativa privada, e principalmente quando se trata de um Estado com poucos recursos, onde os índices de IDH, pobreza, educação, infraestrutura, corrupção e saúde estão muito aquém do desejado.

Fomentar a Cultura é um papel do poder público, mas não cabe a um Estado de terceiro mundo fornecê-la, em detrimento de outros serviços públicos que deveriam, sem dúvida, ser prestados por ele.

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