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Macaron de pistache com ganache de chocolate da Artisan Confeitaria. Foto: Flávia Schiochet/Arquivo pessoal
Macaron de pistache com ganache de chocolate da Artisan Confeitaria. Foto: Flávia Schiochet/Arquivo pessoal| Foto:

Só deu ela no início de 2015: a tal da aquafaba pipocou em todos os feeds. A timeline do Facebook e do Instagram passaram semanas com receitas de como transformar água do cozimento de grão-de-bico (a tal da aquafaba) em suspiro vegano. O frisson passou, até porque não é um processo tão rápido, e nem todo forno caseiro é adequado para uma receita tão delicada. Falo por mim: apesar de ter me empolgado com a possibilidade, fiz merengue apenas três vezes – minha versão da receita encontra-se ao fim do post. E as poucas pessoas que continuam a trabalhar com o ingrediente têm feito coisas maravilhosas.

Macaron de pistache com ganache de chocolate da Artisan Confeitaria. Foto: Flávia Schiochet/Arquivo pessoal

Macaron de pistache com ganache de chocolate da Artisan Confeitaria. Foto: Flávia Schiochet/Arquivo pessoal

Em Curitiba, pude provar o macaron que a Maria Eugênia, da Artisan Confeitaria, uma marca que começou em Maringá com brownies veganos (prove o de maracujá!). A primeira vez que o macaron foi comercializado foi na primeira edição do Vegan Bake Sale, em maio deste ano, no Natural Café e desde então a Artisan aceita encomendas: o pedido mínimo é de 25 unidades de um mesmo sabor (R$ 150, consultar sabores disponíveis).

Para chegar ao resultado atual, Maria Eugênia fez testes por meses e confirma: trabalhar com aquafaba não é fácil. “É muito importante ter paciência. É um ingrediente empolgante e que abre um leque enorme de possibilidades, mas temos que ter em mente que todos ainda estão experimentando com ele para não nos frustrarmos quando algo dá errado, nem desistirmos de tentar de novo”, explicou.

 

Revolução francesa

Quem deu o start para os testes com aquafaba foi Joël Roessel, tenor francês e autor do blog Revolution Vegetale. A partir de uma investigação sobre espumas de leguminosas e de palmito (!), ele descobriu que era possível conseguir consistência similar ao da clara em neve. Mas para manter-se estável era preciso acrescentar amido e goma para que ficasse firme como a de ovos, pois de outra forma, não aguenta temperaturas elevadas.

A descoberta de Joël possibilitou muitas novidades no mercado vegano, como este macaron feito com aquafaba da Artisan Confeitaria. Fazem até o

A descoberta de Joël Roessel possibilitou muitas novidades no mercado vegano, como este macaron feito com aquafaba da Artisan Confeitaria. Fazem até o “pezinho”. Foto: Maria Eugênia/Divulgação

A descoberta rendeu uma série de posts no blog do autor em dezembro de 2014, começando por um em que ele conta um pouco de sua pesquisa: ao entrar em blogs de cozinha molecular para entender a técnica de fazer espuma, Joël escreveu: “a espuma, do ponto de vista técnico, são duas coisas: uma fase descontínua (em que as moléculas não se tocam) formando bolhas de gás, e uma fase contínua (em que as moléculas se tocam), formada por bastões de proteínas que se desdobram e se unem, formando as bolas”.

Quanto mais viscoso o líquido, mais estável será a espuma. O ingrediente também pode substituir a clara de ovo em outras receitas. Em grupos do Facebook, há preparos usando em massas de bolo, de crepe e para empanar. Outro teste foi com a mucilagem da linhaça (o gel que se forma quando deixamos linhaça de molho), que ele achou uma boa substituição para fazer massas em vez de suspiros e merengue.   

Aprendendo com os erros

  Minha primeira tentativa não deu muito certo: faltou cremor tártaro e os suspiros não aguentaram a temperatura do forno – viraram água açucarada depois de uma hora de calor. É perceptível a diferença de textura se você bater apenas a aquafaba sem o cremor tártaro: fica muito espumosa e leve, vai se liquefazer rapidamente.   

 

Observei dois erros principais: não usei açúcar de confeiteiro. Quanto mais fino o açúcar, mais fácil o merengue vai firmar e crescer. Bater demerara no liquidificador até ficar mais fino não funciona tão bem, nem o açúcar refinado faz milagre: o açúcar precisa ser bem fino mesmo para não pesar na espuma, por isso é melhor usar o de confeiteiro. Outro erro foi não usar um estabilizante. O cremor tártaro ou outro ingrediente ácido como suco de limão e vinagre vão ajudar a massa a manter a consistência no forno.

Para quem tem medo do possível sabor de grão-de-bico na receita, não tema: das leguminosas, ele é o que menos deixa sabor pronunciado e com o açúcar na receita, o possível gosto que remete ao salgado acaba sumindo.

Aquafaba também pode ser usada para fazer merengues e queimada com maçarico. Foto: Maria Eugênia/Divulgação

Aquafaba com açúcar e estabilizante fica com consistência sedosa e também pode ser usada para fazer merengues e queimada com maçarico. Foto: Maria Eugênia/Divulgação

Não recomendo bater mais que meia xícara de aquafaba na batedeira porque espirra pra fora do bowl e o volume do líquido triplica! Como não é o mesmo que a clara de ovo, esta receita demora mais para ficar pronta, então não se preocupe: aquele monte de água vai virar um suspiro depois de alguns minutos de batedeira e algumas horas de forno, sim!

Na segunda vez havíamos cozinhado o grão-de-bico sem as cascas e o líquido restante ficou bem espesso, quase um creme. Reduzi um pouco no fogo antes de colocar na batedeira. Resultado: encorpou rapidinho e ficou com consistência de chantilly. Na terceira vez, acertamos. Dei até para o meu irmão provar e ele achou que ficou bem parecido com suspiro feito de ovos. Como ele não é muito fã de comidas veganizadas, considerei um sucesso e por isto achei válido dividir com vocês a receita, mesmo tanto tempo depois:

 

RECEITA

Suspiros veganos

Adaptado do blog Eu Posso Isso

½ xícara de aquafaba – quanto mais viscosa melhor*
¼ de colher de chá de cremor tártaro
¾ de xícara + 2 colheres de sopa de açúcar de confeiteiro
10 gotas de extrato de baunilha ou outro saborizante de sua preferência

Peneire o líquido do cozimento de grão-de-bico no bowl da batedeira e acrescente o cremor tártaro. Bata com o batedor de arame na velocidade máxima. Pode ser que espirre um pouco para fora, porque antes de engrossar é normal o líquido “dançar” no bowl. Deixe bater até o volume quase triplicar. Teste o ponto com uma colher: se o creme não escorrer nem cair ao ser colocado de ponta-cabeça, está no ponto correto.

Continue batendo e adicione aos poucos o açúcar. É preciso bater por mais dois ou três minutos até sua aparência ficar “sedosa”, própria do merengue. O creme forma picos e é nesta hora que se coloca o saborizante. Bata até misturar bem e use o bico de confeiteiro ou duas colheres para modelar os suspirinhos. Asse por duas horas e meia ou até ficarem firmes em forno pré-aquecido a 100 graus C – eu deixo meu forno no mínimo e “travo” a porta com uma colher de pau para que o ar quente saia e diminua a temperatura o máximo possível. O tempo depende muito do forno: há fornos que resolvem em uma hora. Não é o caso do meu. Para assar, preferimos colocá-los em formas de silicone porque mesmo no papel manteiga eles não soltavam.

 


Depois de assados, deixe esfriar na forma ou você vai passar alguns minutos desgrudando de um dedo para o outro. Guarde em geladeira em um pote bem fechado para que não derretam com a temperatura ou com a umidade.

*Para a água do cozimento ficar mais viscosa, deixe o conteúdo esfriar na panela depois do cozimento. Se for o caso, guarde na geladeira com os grãos-de-bico junto e separe só na hora de usar. Cuide para não estragar: de três a cinco dias na geladeira é o tempo médio. Já tivemos vezes em que a água guardada em um recipiente bem fechado durou sete dias sem alterar cheiro nem aparência, mas não recomendo. 

 

 

Nos meus testes, os suspiros mesmo sequinhos e crocantes “derretiam” facilmente ao toque. Para nós, o melhor resultado de textura foi ao desidratá-los em formas de silicone por oito horas, mas como desidratador não é um eletrodoméstico muito usual no Brasil, sugiro o forno entreaberto e um olho vigilante.

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