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A Malha Sul é operada pela Rumo. Governo federal pode fazer nova licitação ou renovar a concessão.
A Malha Sul é operada pela Rumo. Governo federal pode fazer nova licitação ou renovar a concessão.| Foto: Joel Vargas/GVG

Os governos de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul estão unindo esforços para apresentar ao Executivo federal demandas conjuntas sobre a Malha Sul, ferrovia de 7.223 quilômetros que corta os três estados. A malha está sob administração da Rumo, cujo contrato de concessão acaba em fevereiro de 2027.

Cabe ao governo federal conduzir o processo para a realização de uma nova licitação ou para a renovação do arranjo atual. 

Os governos estaduais buscam protagonismo nas tratativas, diante do que classificam como “abandono” por parte da Rumo. Representantes dos três estados vão a Brasília no dia 29 de maio para tratar do tema junto ao Ministério dos Transportes (inicialmente, o encontro ocorreria no dia 14 de maio, mas a agenda foi transferida). “Não estamos satisfeitos com a concessão atual. Não há investimentos. No Rio Grande do Sul, a malha tem três mil quilômetros. Metade está abandonada. O resto está subutilizado”, disse o vice-governador gaúcho, Gabriel Souza (MDB), em entrevista à Gazeta do Povo.

Na visão dos estados, se for mal feito, o processo pode “condenar” a Malha Sul a mais 30 anos de precariedade. “É um momento histórico na medida em que temos essa oportunidade [de debate]. Depois, só poderemos rediscutir o contrato daqui a mais 30 anos”, destacou Souza. O coordenador do Plano Estadual Ferroviário do Paraná, Luiz Henrique Fagundes, afirma que as ferrovias do estado são imperiais, e que as decisões tomadas sobre a concessão da Malha Sul podem comprometer três décadas de futuro da região. “Historicamente, há uma degradação da malha ferroviária, principalmente dos trechos não utilizados. Se o trecho perde competitividade, vai acabar sendo menos utilizado. Precisamos quebrar esse ciclo vicioso”, afirmou Fagundes.

Em janeiro, por exemplo, a Rumo decidiu desativar o ramal ferroviário que liga Londrina (PR) a Ourinhos (SP). Segundo a empresa, o trecho – que era utilizado para transporte de combustíveis, grãos e fertilizantes – tinha baixa demanda. Por outro lado, de acordo com o Sindicato dos Ferroviários de Sorocabana, que representa os trabalhadores do ramal desativado, a atuação da empresa teria o objetivo de inviabilizar o trecho para aumentar o preço do frete ferroviário.

Indefinição prejudica outros projetos

Representantes dos três estados afirmam não ter preferência por uma das soluções à mesa – a prorrogação do contrato ou a realização de uma nova licitação. Eles afirmam, porém, que o processo precisa ser tocado com celeridade. “Estamos correndo contra o tempo. A concessão vence em fevereiro de 2027, mas temos que assinar o contrato antes. Uma rodovia funciona sem contrato de concessão. Uma ferrovia, não”, diz Fagundes.

No caso do Paraná, o projeto da Nova Ferroeste deve ser levado em conta nas negociações, já que o traçado contempla uma nova descida na Serra do Mar rumo ao Porto de Paranaguá. A ideia é fazer com que as duas linhas atendam a demanda para o porto em conjunto. “A atual descida é inviável ambientalmente. A linha é tombada, não podemos sair mexendo no traçado. Para que repetir o investimento se a Nova Ferroeste já tem esse novo trecho?”, questiona Fagundes.

No ano passado, a expectativa do governo paranaense era de realizar o leilão do projeto da Nova Ferroeste ainda em 2024. O processo de licenciamento ambiental, porém, acabou demorando mais do que o esperado depois que a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) pediu uma ampliação dos estudos.

Agora, a ideia é ter o licenciamento emitido até o final deste ano para, na sequência, publicar os documentos finais. Depois, o governo deve aguardar mais seis ou oito meses para realizar o leilão. “Na melhor das hipóteses estaremos com o leilão feito no final do ano que vem”, afirma Fagundes. Depois, o primeiro trecho da nova ferrovia deve ficar pronto em cinco ou sete anos. A prioridade é o caminho para a Serra do Mar, já que é a obra mais cara e mais complexa do projeto. No total, a Nova Ferroeste tem 1.567 quilômetros.

Santa Catarina e Rio Grande do Sul também têm projetos de novas ferrovias, porém em menor escala. Beto Martins, secretário de Portos, Aeroportos e Ferrovias no governo catarinense, afirma que a indefinição sobre a Malha Sul prejudica o andamento dessas novas propostas, já que há conexões entre as linhas. “Esse impasse está gerando insegurança para que a gente possa tocar outros projetos ferroviários e atrair investidores”, afirma.

Para os estados, Rumo subestima demanda

Uma das vantagens de renovar o contrato com a Rumo seria antecipar investimentos. Mas, de acordo com o vice-governador do Rio Grande do Sul, Gabriel Souza, um dos problemas é o estudo de demanda apresentado pela própria empresa. Na visão dos estados, o documento tem “inconsistências”. “Entendemos que há mais demanda de carga do que o apontado pela própria concessionária. Quanto maior a demanda, mais investimentos”, afirma. Por isso, os três estados decidiram contratar um estudo próprio, para levantar a quantidade de carga que pode, de fato, ser transportada pela Malha Sul.

A possível falta de concorrentes em uma eventual licitação, porém, é considerada um “ponto de atenção”, segundo Souza. Por outro lado, ele lembra que grupos internacionais, especialmente da China, têm apresentado interesse em atuar na área logística no Brasil, o que pode tornar o processo mais competitivo. O Terminal de Contêineres de Paranaguá, por exemplo, é administrado por uma empresa chinesa.

Setor produtivo também se organiza

Empresários do Paraná também estão se organizando para apresentar demandas ao governo federal. No último dia 15, um evento na Federação das Indústrias do Paraná (Fiep), em Curitiba (PR), discutiu o tema com representantes da indústria, do agronegócio e dos governos federal e estadual. Nos próximos dois meses, a Fiep vai realizar novas reuniões em outras regiões paranaenses, com o objetivo de ouvir queixas dos empresários sobre o assunto.

“Nós temos uma janela de oportunidade, que é o fim da concessão. (...) Quanto mais eficiente for o escoamento [da produção], mais poderemos buscar novos mercados”, disse Edson Vasconcelos, presidente do Sistema Fiep, durante o evento.

Processo corre na ANTT

Por meio de nota, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) afirmou que o projeto de renovação da concessão foi qualificado pelo Programa de Parcerias de Investimentos, e está em tratativas entre a Rumo, a Agência e o Ministério dos Transportes. “Na fase atual, a ANTT aguarda que o Ministério apresente as diretrizes para que a empresa adeque o projeto e possa submetê-lo para análise da Agência”, diz o texto.

Durante o evento promovido pela Fiep, Jefferson Vasconcelos, gerente de projeto da Secretaria Nacional de Transporte Ferroviário, prometeu a publicação de uma portaria regulamentando a renovação antecipada de concessões. Ele não deu uma data exata para que isso aconteça.

Procurada pela reportagem, a Rumo não se posicionou sobre as críticas feitas pelos representantes dos estados. A empresa afirmou que protocolou um plano de negócios para a prorrogação da concessão, e que os documentos estão em análise na ANTT. Ainda segundo a Rumo, o processo é “extenso” e está em debate técnico com o governo federal. “O processo precisa cumprir uma série de etapas junto ao órgão regulador e demais entidades. Entre os temas, constam os estudos das questões relativas à capacidade de demanda da malha ferroviária e de trechos que já estão desativados há décadas por falta de viabilidade econômica, antes mesmo da empresa assumir a concessão em 2015”, diz nota enviada pela Rumo.

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