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Bolsonaro
O presidente da República, Jair Bolsonaro.| Foto: Joédson Alves/EFE

Estamos presenciando uma volta do ataque do governo federal ao demais poderes e ao sistema eleitoral. Qual seria o motivo para isso?

Quando olhamos a situação atual da economia brasileira, percebemos que a população vem sofrendo de forma considerável. A taxa de desemprego permanece na casa dos dois dígitos desde 2016, enquanto a taxa de inflação está em 12% nos últimos 12 meses. Um cenário de elevado desemprego com inflação alta resulta em redução do salário real dos trabalhadores, sendo que os mais pobres são aqueles que mais estão sofrendo, pois possuem menos margem para redução de gastos no orçamento, além do aumento do preço dos alimentos que está acima da média da inflação medida pelo IPCA.

Fatores externos ajudam a entender o momento atual de baixo crescimento associado a uma inflação elevada, pois a Covid-19 ainda afeta de forma considerável o funcionamento das cadeias produtivas globais, sobretudo com as restrições em regiões da China para conter o contágio. A invasão da Rússia sobre a Ucrânia tem provocado pressão de preços em commodities importantes como petróleo, gás, trigo, milho, além da redução da oferta de fertilizantes e aumento da incerteza global. Variações climáticas e a alta demanda de alguns países, com destaque para a economia americana, completam o cenário que tem levado a um avanço da inflação em escala mundial.

Em relação ao Brasil, boa parte da inflação alta está relacionada ao cenário descrito acima. No entanto, o seu fraco desempenho econômico vai muito além do contexto internacional. De acordo com as estimações e projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), o crescimento total da economia brasileira entre 2020 e 2023 será de 2,7%, o que nos dá um crescimento anual de apenas 0,68%. No mesmo período, o crescimento do PIB da economia mundial será de 11%, dos países desenvolvidos de 7%, enquanto dos países em desenvolvimento de 14%. Portanto, no mesmo contexto internacional, nossa economia terá um desempenho bastante inferior em relação ao mundo e mesmo quando comparado com às economias avançadas que tendem a ter um crescimento mais lento que o restante do mundo. Quando comparamos com países semelhantes em termos econômicos, culturais, e institucionais, nosso crescimento fica perto da metade dos países da América Latina (AL), entre 2020 e 2023, sendo que a previsão é de crescimento de 4,9% ou 1,23% por ano nos países da AL. Esse grupo de países inclui o Brasil, que puxa sua média para baixo, ou seja, sem a inclusão do Brasil, o crescimento do restante da AL seria ainda maior.

Esses dados não deixam dúvida que boa parte dos problemas de baixo crescimento econômico e consequente elevado desemprego está relacionado a questões internas que foram mal resolvidas ou não resolvidas nem parcialmente. Já sabemos que muito pouco foi feito em relação às reformas estruturais que são fundamentais para o crescimento do país, como melhora do ambiente de negócios, fortalecimento das instituições brasileiras e estabilidade das regras, redução da burocracia e da complexa estrutura tributária, elevada carga tributária, ineficiência nos gastos do governo, excesso de gastos com a burocracia do setor público, reduzida integração da economia brasileira com o restante do mundo, controle dos gastos e do déficit público, entre outros.

O ataque do governo federal aos outros poderes e ao processo eleitoral serve como uma cortina de fumaça para desviar a atenção da população brasileira de fatos que são realmente relevantes para o seu nível de bem-estar e do fato que muito pouco foi feito no atual governo. Também serve como uma alternativa caso o governo sofra uma derrota nas eleições desse ano. Uma saída à la Trump em um país cujas instituições são frágeis do que o país norte-americano trará danos potencialmente muito mais elevados no caso brasileiro.

Luciano Nakabashi, doutor em economia, professor associado da FEARP/USP e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Economia da FEARP/USP.

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