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Há uma estátua de Paulo Guedes na sede de uma empresa localizada na avenida Faria Lima, na Zona Sul de São Paulo. Na obra, o outrora Posto Ipiranga aparece vestido com a indumentária metálica do personagem Mandaloriano, do universo de Star Wars. Apesar da armadura possante, que tenta retrata-lo como altivo, corajoso, indômito e guerreiro, as feições no seu rosto revelam o contrário. Ele está vacilante, cabisbaixo, desenganado, submisso. Ao seu modo, a figura de gesso é a representação perfeita do homem. O contraste acidental simboliza o que se esperava do Ministro da Economia e o que de fato ele é.

A ideia de se romper a Lei do Teto de Gastos Públicos não é de hoje. A especulação remonta ainda de 2020, quando o governo passou a pagar o Auxílio Emergencial e a popularidade do presidente foi impactada positivamente, principalmente no Nordeste. O resultado instou uma pressão enorme das lideranças políticas fisiológicas que sustentam o seu combalido mandato. Com a Câmara dos Deputados controlada por Arthur Lira e Ciro Nogueira no comando do Ministério da Casa Civil, o lobby populista se fortaleceu, cativando Bolsonaro, que nunca foi liberal, pelo potencial eleitoral de transformar benefícios sociais em votos.

Nessa semana, o presidente determinou que o novo programa de renda a ser pago até o fim de 2022 deve ter um valor de R$ 400 mensais. Na configuração atual da lei orçamentária, não há recursos para tanto. Mas não é problema. Mande-se à favas os escrúpulos, e também a responsabilidade fiscal, que já inexiste desde muito tempo, é bom dizer. Uma parte considerável dos valores que serviriam para financiar a operação viriam de leis que tramitam no Congresso Nacional e também de fora da Lei do Teto de Gastos. Na última quarta-feira (20), o ministro da Cidadania, João Roma, garantiu que os pagamentos já começariam em novembro. Não deu detalhes de onde viria o dinheiro.

O supostamente irredutível e austero Paulo Guedes não tardou a vir com elucubrações tecnicistas de modo a tentar convencer o mercado de que o rigor seria mantido, mesmo admitindo que, na prática, o objetivo era buscar uma licença para gastar. “Seria uma antecipação da revisão do teto de gastos que está para 2026 ou se, ao contrário, mantém, mas por outro lado pede um 'waiver', pede uma licença para gastar essa camada temporária de proteção”, disse em uma live.

O que se pretende fazer é alterar a antecipação do dispositivo que faculta a modificação do indexador de correção do crescimento das despesas no Teto. Hoje, segundo o Art 108, isso só ocorreria “a partir do décimo exercício da vigência do Novo Regime Fiscal”. Pela lei atual, o Teto é corrigido pela inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior de sua vigência. A proposta é passar a calcular com base na inflação de janeiro a dezembro. A manobra no calendário é que possibilitaria a folga fiscal e os recursos para gastar, sem abrir mão de nada e até criando outras despesas não previstas, como o tal auxílio caminhoneiro. É a lógica do por onde passa boi passa boiada, como diria Ricardo Salles. Ao invés de fazer as despesas caberem no teto, mais fácil fazer o teto caber nas despesas.

Na esteira da decisão do governo de arregaçar explicitamente as contas públicas, o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e o secretário do Tesouro Nacional, Jefferson Bittencourt, pediram demissão de suas funções no Ministério da Economia. Guedes permanece no cargo não mais como fiador de uma agenda liberalizante, mas como avalista de luxo do populismo eleitoreiro de Bolsonaro. A antiga contabilidade criativa foi substituída pela contabilidade patriótica. Se não der pedalada o PT volta, vocês sabem.

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