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Estima-se que, em 2015, eram cerca de 225 milhões de camponeses nas metrópoles, um aumento de 80% em dez anos. | Alex Lee/REUTERS
Estima-se que, em 2015, eram cerca de 225 milhões de camponeses nas metrópoles, um aumento de 80% em dez anos.| Foto: Alex Lee/REUTERS

O fenômeno foi descrito como a maior onda migratória na história da humanidade, um êxodo em massa de centenas de milhões de camponeses com destino às cidades que se erguiam rapidamente na China. Mas será que isso realmente beneficiou a população?

Um novo estudo mostra que os trabalhadores que migraram de seus povoados rumo às metrópoles foram recompensados com salários mais altos, porém, no final da jornada, terminaram menos felizes do que aqueles que ficaram para trás.

Os autores John Knight, professor de economia na Universidade de Oxford, e Ramani Gunatilaka, diretor do Centro de Análise da Pobreza, em Colombo, dizem que as razões “aparecem como um quebra-cabeça interessante e socialmente importante”, e com implicações políticas significativas para países em desenvolvimento ao redor do mundo.

Então por que, afinal, tantas pessoas se mudaram se isso não as tornava mais felizes? As expectativas eram infactíveis? Ou as aspirações delas evoluíram mais rápido do que a capacidade de alcança-las? Os novos postos de trabalho eram inseguros e desmotivadores, ou as cidades fizeram com que esses imigrantes se sentissem mais pobres, mesmo com o aumento de renda, pois agora eles viviam lado a lado com gente mais rica?

A resposta pode estar nisso tudo, e ao mesmo tempo. Todavia, por que, ainda assim, tão poucos desejam voltar para o campo?

Um gráfico do estudo, publicado dentro do Relatório Internacional da Felicidade e baseado em uma pesquisa extraoficial conduzida no começo de 2003, mostra que a renda média de um imigrante que saiu do campo para trabalhar na cidade era mais que duas vezes maior em relação à de um camponês. Ainda: os moradores dos centros urbanos eram mais saudáveis.

Contudo, quando os entrevistados foram questionados sobre o quão felizes eram, numa escala de 0 (totalmente infeliz) a 4 (muito feliz), o resultado surpreendeu.

De longe, os mais satisfeitos eram aqueles que permaneceram no campo, com uma nota média de 2,7; os que já nasceram nas cidades ficaram com 2,5; ao passo que os imigrantes obtiveram 2,4 como pontuação.

Parte da explicação parece ser a discriminação econômica e social. Sob o regime comunista, a China tem sido dividida pelo que, às vezes, é chamado de “Grande Muralha Invisível”. Cidadãos de origem rural tem um registro de “ruralidade”, conhecido como hokou, que não pode ser alterado mesmo que eles se mudem para a cidade grande.

Nas metrópoles é muito mais difícil encontrar emprego, casa, educação e saúde para quem vem das zonas rurais, o que força muitos chineses a deixar suas crianças nos vilarejos natais, para serem criadas pelos avós.

Imigrantes informaram que a falta de seguridade social era o principal problema que enfrentaram na nova vida, mas eles também reclamam da discriminação e insegurança no emprego. “Os empregos para os imigrantes podem ser desmotivadores e inseguros, e isso deprecia a felicidade deles”, afirma o estudo.

Em outras palavras: ex-camponeses trabalhando na construção civil podem até erguer as metrópoles chinesas e aqueles que tocam pequenos negócios são o coração dos centros urbanos, mas a vida nestas mesmas cidades pode ser bastante dura para eles.

Estima-se que, em 2015, eram cerca de 225 milhões de chineses nesta situação, um aumento de 80% em dez anos.

Mas por que eles vieram? Em parte, o motivo parece ser a ilusão de um pote de ouro atrás do arco-íris urbano: “altas expectativas em excesso com relação às condições que eles iriam experimentar na cidade”.

No entanto, suas aspirações também crescem quando eles se mudam, geralmente até mais rápido do que as possibilidades de satisfazê-las. E conviver com gente mais rica não ajuda. Apesar dos imigrantes ganharem mais dinheiro, dois terços dos que se dizem infelizes utilizaram a renda baixa como argumento. Os camponeses, afirma a pesquisa, poderiam até imaginar que seus ganhos seriam maiores na cidade, “mas não o quão suas expectativas subiriam assim que se tornassem parte de uma sociedade urbana completamente diferente”.

Mas, se eles são tão infelizes, por que não voltam para casa, simples assim?

Alguns podem ter perdido suas terras no processo de urbanização pelo qual a China atravessou, mas outros perceberam que, uma vez aumentadas as aspirações com a nova vida nos grandes centros urbanos, já não há mais caminho de volta: é impossível estar satisfeito no campo, sem perspectivas, depois que se experimentou as luzes da cidade grande.

Isso pode explicar parcialmente outro quebra-cabeça encontrado nos dados: 56% dos imigrantes sentiam que a vida urbana tinha lhes dado uma felicidade maior do que a que sentiam nas áreas rurais; 41% afirmaram ser igualmente felizes nas metrópoles ou no campo; enquanto apenas 3% disseram que eram mais contentes em seus vilarejos. E mesmo que aqueles que ficaram para trás se declarem mais felizes com a própria vida, os que se mudaram afirmam não se arrepender da escolha que fizeram.

A pesquisa faz parte de uma investigação anual sobre o bem-estar subjetivo em mais de 150 países, publicado pela Rede de Soluções em Desenvolvimento Sustentável, uma iniciativa das nações Unidas.

O relatório do último ano contém algumas conclusões fascinantes sobre a China, em um trabalho assinado por Richard A. Easterlin, Wang Fei e Wang Shun: de 1990 a 2005, a renda pessoal no país cresceu cinco vezes, ao passo que a sensação de felicidade caiu de forma acentuada. Atualmente, a população chinesa é provavelmente mais infeliz na média do que há 25 anos – em parte por conta das reformas econômicas, que derrubaram a estabilidade profissional e a rede de seguridade social.

No ranking deste ano, a Finlândia aparece com a nação mais feliz do planeta. Os Estados Unidos vêm na 18ª posição, enquanto que Taiwan ocupa a 26ª; Hong Kong a 76ª e a China, a 86ª. Ao todo, 156 países participaram do levantamento.

É um lembrete de que, mesmo com a história de sucesso econômico vivenciada pela China, a felicidade e a renda per capita no país ainda ficam atrás de muitas outras nações, incluindo muitos países em desenvolvimento.

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