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A vida de Beethoven através de seus concertos para piano e orquestra
A vida de Beethoven através de seus concertos para piano e orquestra| Foto:
A vida de Beethoven através de seus concertos para piano e orquestra

A vida de Beethoven através de seus concertos para piano e orquestra

Um ciclo de concertos que homenageia a pianista Olga Kiun

Pela primeira vez em Curitiba será apresentado o ciclo completo dos 5 concertos para piano e orquestra de Ludwig van Beethoven, sendo que possívelmente o Concerto Nº 2 nunca foi executado por aqui. No dia 21, sexta feira, às 20 horas, serão executados os Concertos de Nº 1 (solista – Pablo Rossi), Nº 2 (solista – Davi Sartori) e Nº 3 (solista – Paulo Emiliano Piá de Andrade). No dia 22, sábado, também às 20 horas, serão apresentados os concertos de Nº 4 (solista – Olga Kiun) e Nº 5 (solista -Luiz Guilherme Pozzi). Uma orquestra que reúne a “nata” de instrumentistas curitibanos atuará sob minha regência. As apresentações acontecerão na Capela Santa Maria. Estes concertos fazem parte de um festival que homenageia a grande pianista russa Olga Kiun, excepcional professora que há 20 anos se radicou em Curitiba. Notável profissional, colocou parâmetros altíssimos para os alunos de piano da cidade, e todos os solistas dos 5 concertos, além da grande mestra, tiveram o essencial de sua formação pianística junto à professora russa. Curitiba realmente teve a sorte da escolha que ela fez, e mesmo eu sou eternamente grato a ela, já que seus melhores alunos estudaram comigo Harmonia e Análise musical, visto que ela sempre valorizou bastante a formação completa de um pianista, nos mesmos padrões que ela teve em seu país.

Beethoven: compositor e pianista

Ludwig van Beethoven (1770-1827) nasceu na cidade de Bonn, na Alemanha. Criança prodígio teve o azar de ter uma família completamente desajustada. Seus objetivos, quando adolescente, era viver em Viena e estar próximo a Mozart, a quem admirava de forma quase religiosa. Apesar de que o encontro dos dois, em 1787, ser uma fantasia mentirosa do historiador Otto Jahn (1813-1869), a obra de Mozart será importantíssima para o jovem Beethoven. Assim como Mozart, Beethoven era um pianista excepcional, e os concertos para piano e orquestra, do gênio de Salzburg, foram marcantes na sua vida de instrumentista e de compositor. Os concertos para piano e orquestra foram realmente muito marcantes na produção Mozartiana, especialmente os que ele escreveu entre 1784 e 1786 (do 19 º ao 26º). Apesar de Beethoven conhece-los muito bem, a primeira tentativa do compositor de escrever um concerto ocorreu antes dele conhecer os grandes concertos de Mozart, quando tinha 14 anos de idade, um concerto que permaneceu inacabado, e no qual o próprio Beethoven não colocava muita fé.

Mozart: o modelo para os Concertos de Beethoven

Mozart: o modelo para os Concertos de Beethoven

O modelo mozartiano

Em 1787 Beethoven iniciou a composição de seu primeiro Concerto para piano e orquestra completo, erroneamente numerado como Concerto Nº 2 em si bemol maior opus 19. Esta obra juvenil foi composta ainda em Bonn, antes do compositor se fixar em Viena, em 1792, ano em que Beethoven teve acesso às obras primas para pianos e orquestra de Mozart. Coincidentemente ele modificou o final do concerto que trouxera de Bonn: o Finale que hoje conhecemos foi escrito somente em 1795, e possui uma clara alusão ao terceiro movimento do último concerto que Mozart escreveu, o concerto em Si bemol maior IK 595. Foi depois da bem sucedida apresentação em Viena em 29 de março de 1795 (a primeira aparição pública de Beethoven na capital austríaca) que ele escreveu aquele que hoje é conhecido como Concerto Nº 1 em dó maior opus 15. Foi estreado em Praga em 1798. Este concerto, especialmente o primeiro movimento, é calcado no Concerto, também em em Dó maior, IK 503 de Mozart, demonstrando o claro apreço que Beethoven tinha da obra de seu predecessor. O Concerto Nº 3 em dó menor opus 37 é uma composição completada em 1801, e mais uma vez o compositor foi solista da estreia em Viena em abril de 1803. Este, que é o único concerto de Beethoven em modo menor, dá um enorme passo para a frente em termos orquestrais e foi tremendamente influenciado pelo Concerto, também em dó menor, IK 491, de Mozart. A genial criatividade de Beethoven pode ser bem exemplificada no diálogo entre o tímpano e o solista no final do primeiro movimento. Quem, além de Beethoven, poderia imaginar isso naquela época?

Uma afirmação pessoal: os dois últimos concertos para piano e orquestra

A influência de Mozart dará lugar a um posicionamento bem mais pessoal de Beethoven em seus dois últimos concertos sendo que o Concerto Nº 4 em sol maior opus 58, composto em 1806, é uma obra bem distante do modelo mozartiano. A obra começa com um solo de piano, sem acompanhamento da orquestra, cuja visão introspectiva, nos levará a uma linguagem quase romântica. Sem tímpanos e sem trompetes, este movimento é extremamente introspectivo. Outra surpresa: o segundo movimento, escrito apensas para o solista e as cordas da orquestra, é um diálogo entre as forças quase agressivas da orquestra frente a um solista completamente calmo. O piano se assemelha a Orfeu, e a orquestra se assemelha às fúrias, que se acalmam frente o mágico discurso do solista. É só no movimento final, o único com a orquestra completa, que existe uma música que deixa de lado o aspecto introspectivo. A progressiva surdez de Beethoven vai tornando as suas aparições como pianista cada vez mais raras, e por isso a estreia deste concerto será a última aparição do músico como pianista, numa récita privada no palácio do príncipe Lobkowitz. A sala onde ocorreu esta estreia existe até hoje. Minha imaginação voou quando estive lá…
O Concerto Nº 5 em mi bemol Maior opus 73, o último concerto para piano e orquestra que Beethoven compôs, abre os caminhos para uma nova era musical. O mais longo de todos é espetacular pela junção que existe entre o solista e a orquestra, e mesmo a cadenza, aquele trecho improvisado pelo solista no final do primeiro movimento, é substituída por uma improvisação conjunta do piano e da orquestra. Já na época de Beethoven ficou conhecido como “Imperador” por sua grandiosidade e dificuldade técnica, tanto para o solista como para a orquestra. A surdez do compositor o impediu de executar a obra, considerada inexequível na época, sendo a estreia feita pelo pianista e compositor Friedrich Schneider, em Leipzig, no ano de 1811.

A pianista Olga Kiun, fotografada por Cida Demarchi

A pianista Olga Kiun, fotografada por Cida Demarchi

Ouvir o ciclo completo dos Concertos para piano e orquestra de Beethoven é uma experiência marcante, pois além da belíssima música, podemos através deles acompanhar uma sequência da vida do compositor realmente importante. Sempre me impressionou muito a progressiva surdez do mestre, que o levou a um enorme isolamento. Para citar apenas um exemplo dos momentos cruciais deste ciclo, notemos a entrada isolada do solista no Concerto Nº 4. Este isolamento levou a uma profundidade raramente vista em toda a história da música. Realmente, a arte é realmente enriquecedora, disto não tenho dúvida.

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