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Pianistas “campeões”: os maiores repertórios
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Um repertório variado e eclético é sempre sinal de que um músico instrumentista, cantor ou maestro, são competentes. Grandes pianistas demonstram claramente que uma certa amplitude de obras que executam é essencial, visto que eles lidam com o maior repertório que existe no campo da música clássica. Por exemplo, os mais célebres pianistas da velha geração que ainda estão na ativa como Maurizio Pollini, Martha Argerich, Nelson Freire e Kristian Zimerman possuem um repertório invejável, por sua versatilidade e extensão. No entanto esta extensão e versatilidade está longe de números impressionantes daqueles que poderíamos chamar de “fenomenais”, pianistas que quase que ultrapassaram o limite do humanamente “possível”. Vou citar quatro exemplos daqueles que considero verdadeiros “campeões”.

Sviatoslav Richter – O enigma

O pianista russo Sviatoslav Richter (1915-1997) foi um instrumentista excepcional, e muto se fala de seu enorme repertório. Bruno Monsaingeon, que dirigiu um excelente documentário sobre o artista (Richter – O enigma), contou 833 composições para piano (entre obras solo, de câmera e como solista) que o artista executou durante sua vida. Somadas às centenas de canções que ele executou com frequência teríamos por volta de 1300 obras diferentes. Seu repertório ia de Bach, passando por Haydn, Mozart, Beethoven, Schubert, Schumann, Liszt, Chopin, Brahms, Tchaikovsky, Mussorgsky, até Debussy, Ravel, Bartók, Alban Berg, Anton Webern, Prokofiev, Rachmaninoff e muitos outros. Uma curiosidade de Richter é que ele odiava integrais. Algumas curiosidades: nunca tocou certas sonatas famosas de Beethoven (“Ao luar” e Waldstein por exemplo),dos 24 prelúdios de Debussy tocava apenas 22 e das Peças de Fantasia opus 12 de Schumann nunca tocou a quarta e a sexta. Também nunca tocou as Variações Goldberg de Bach e nem concertos muito famosos como o de Nº 3 de Prokofiev e o de Nº 3 de Rachmaninoff. Mesmo com essas “excentricidades” o repertório de Richter impressiona, pelo tamanho, e pela maneira visceral que o executava.

Idil Biret – O fenômeno

A pianista turca Idil Biret (nascida em 1941) é aquela que destaco como a pianista com o maior repertório que já se teve notícia. Mais de 1000 obras para piano (entre obras solo, de câmera e como solista) é uma recordista em diversos aspectos. O primeiro deles fica óbvio ser esta quantidade fenomenal, mas é bom destacar que além de gravar e executar em concertos todas as obras para piano solo de Brahms, Chopin e Rachmaninoff, tocou e gravou todos os concertos para piano e orquestra de Beethoven, Brahms, Saint-Saëns, Prokofiev, Rachmaninoff e Bartók. Mas além disso demonstrou sempre não temer a linguagem contemporânea: tocou em concerto e gravou todos os Estudos de Ligeti e as três dificílimas sonatas de Pierre Boulez. Idil Biret foi aluna de Nadia Boulanger e Alfred Cortot. Posteriormente foi a aluna favorita de Wilhelm Kempff com quem executou aos 11 anos de idade o Concerto para dois pianos de Mozart em Paris. A extensão fora do comum de seu repertório lhe rendeu comentários de ser superficial e nunca ser uma referência. No entanto destaco o sucesso de algumas de suas interpretações que lhe valeram críticas muito elogiosas: suas gravações de Chopin (a única integral feita por um só pianista) lhe valeram o “Grand Prix du disque”, sua execução das Prelúdios opus 23 de Rachmaninoff foram elogiadíssimas em seu lançamento, e o próprio Boulez a elogiou publicamente quando do lançamento do CD com suas três sonatas executadas por ela. Nada mal.

Daniel Barenboim – O infatigável

O pianista e maestro argentino/israelense Daniel Barenboim, nascido em Buenos Aires no ano de 1942, é para mim um verdadeiro mistério, e sempre me pergunto, entre outras coisas, a que hora ele dorme e a que hora ele estuda. Como pianista seu repertório está entre os mais vastos que já se teve notícia: uma volumosa parte da obra de autores como Bach, Haydn, Mozart, Beethoven, Schubert, Schumann, Liszt, Chopin, Brahms, Tchaikovsky, Albéniz, Debussy, Ravel, Bartók, De Falla, Alban Berg, Schoenberg, tanto em obras camerísticas, como em obras solo e como solista com orquestra. Como Sviatoslav Richter gosta muito de acompanhar cantores (Fischer-Dieskau, Jessye Norman, etc.) o que faz com que seu repertório se aproxime dos números do pianista russo. Soma-se ao fato de que ele é um dos maiores maestros da atualidade e que continua a atuar como pianista de forma intensa percebe-se que somando o repertório pianístico e o repertório como maestro Barenboim é o músico (instrumentista e regente) com o maior repertório da história. Vale lembrar que a qualidade da maior parte de suas execuções é sempre no mínimo boa. Aos 73 anos é realmente infatigável.

Cláudio Arrau – O refinado

O pianista chileno Claudio Arrau (1903-1991) também teve um repertório excepcionalmente grande, e creio que foi o único pianista que tocou toda (!) a obra de Bach para teclado. Refinado intérprete de autores tão diferentes como Schumann e Debussy, teve também uma eterna vontade de atualizar as plateias. Executou mais de uma vez a “Klavierstücke IX” de Stockhausen e gravou (fantasticamente) as “Três peças opus 11” de Schoenberg, autor que apreciava bastante e do qual chegou a apresentar o Concerto para piano e orquestra, e preparava a Sonata Nº 3 de Boulez quando de sua morte. Além desta integral de Bach, que Arrau pretendia gravar, marcou referência absoluta como intérprete incontestável de Schumann. Barenboim chegou certa vez a afirmar que o repertório pianístico de Arrau era o maior da história e ao contrário de Richter o pianista chileno apreciava integrais e deixou algumas referências neste campo: Noturnos de Chopin, Sonatas de Beethoven e de Mozart, Estudos transcendentais de Liszt. Tudo com um refinamento único.

Vídeos:

O incrível documentário “O enigma” de Sviatoslav Richter. Com legendas em inglês

Primeira parte

Segunda parte

Idil Biret executando o Concerto Nº 2 de Bartók.

Barenboim em recital comemorativo de 50 anos de carreira no Teatro Colon. De Mozart até Villa-Lobos

Claudio Arrau executa de forma transcendente a Appasionata de Beethoven

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