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Sua organização possui um plano de saída?
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Imagine se você tivesse que ser pago para coletar seu próprio lixo. Ou para ir para escola. Ou ainda, para respeitar as pessoas. Imagine que você tenha que ser pago para cuidar de seus filhos, ou para ser honesto, dedicado e gentil. Ou, que você pagasse alguém para fazer tudo isso em seu nome.

Parece um absurdo, mas é isso que acaba acontecendo quando agências humanitárias ou organizações da sociedade civil – OSCs atuam por muito tempo em uma área ou região.

Quando se faz um diagnóstico social, busca-se elaborar um plano de ação conforme problemas sociais específicos para apoiar (e não substituir) o governo. Em muitas situações emergenciais o diagnóstico é feito durante a intervenção, pois a necessidade imediata não admite esperas ou planejamento. Porém, todo projeto deve conter um dado muito importante: a data esperada de saída.

 

Por quanto tempo a ajuda ou assistência deve continuar?

A República do Haiti é o país com o menor índice de desenvolvimento humano (IDH) das Américas, recebendo ajuda internacional de centenas de OSCs. Possui a segunda maior concentração de OSC per capita do mundo. Porém, essa ajuda tem sido classificada por diversas lideranças como um movimento que, em vez de promover emancipação, tem gerado cada vez mais dependência. O estado haitiano cada vez mais transfere suas responsabilidades para o Terceiro Setor.

É preciso haver um limite de tempo e controle para as organizações atuarem. Uma OSC é estabelecida quando projetos e programas são necessários. Porém, dificilmente a existência do projeto é pactuada com a perspectiva de um ciclo que possua início, meio e fim. Quando isso não acontece, a organização deixa de fazer parte da “solução” e se torna parte do problema, criando uma série de situações difíceis e complexas para a população que, aos poucos, deixa de ser cidadã protagonista em seu próprio local e passa a viver de auxílios.

 

O perigo da acomodação

Após o terremoto de 2010 no Haiti, seguiram-se muitas denúncias de desvio ou má gestão de recursos. Doações permaneciam paradas nos bancos devido a burocracias, ou eram desviadas de finalidade ou ainda eram usadas prioritariamente para manter equipamentos, estruturas, aluguéis, equipes e mesmo agentes do governo. Não chegavam capilarmente à sua finalidade, sendo esta também a situação em muitos projetos ao redor do mundo.

Apesar de muitas coisas boas acontecerem e multidões serem assistidas, além de milhões de dólares investidos e injetados nos países, as mudanças sociais esperadas muitas vezes são insignificantes. Ao contrário, acusações e suspeitas de fraudes, corrupção e empreguismo para funcionários do Terceiro Setor comprometem cada vez mais o trabalho de organizações, que se acomodam simplesmente para ‘tocar seus projetos’.

Uma situação parece se repetir: a falta de relatórios estratégicos após o marco lógico ter sido feito. “- Como sabemos se o que planejamos está acontecendo ou aconteceu?” Esta pergunta-chave estava sem resposta, ou a resposta estava sendo omitida em muitos projetos no Haiti. O monitoramento depende de indicadores objetivamente verificáveis e muitas vezes os doadores não possuem acesso a estes dados. Geralmente recebem informativos com imagens de pessoas em situação de risco, além de números e gráficos de ações desenvolvidas em saúde, educação e assistência, mas sem referências numa linha do tempo.

Infelizmente, para muitas OSCs o importante é manter o coração do doador aquecido, mas sem informações estratégicas (impacto das ações). Em outras palavras, a indústria da caridade pode se tornar um fim em si mesma e passar a servir seus próprios interesses, deixando a transformação social de lado. O meio torna-se mais importante que o fim, apesar dos lindos relatórios.

 

Como prevenir esta situação?

Em primeiro lugar, antes de começar a fazer qualquer coisa faça o básico: um bom diagnóstico e a construção de um marco lógico com indicadores apropriados.

Observe seus objetivos, estabeleça prioridades e entenda que qualquer projeto possui um ciclo. Um dia, ou ele acaba, ou se transforma em um novo projeto quando a realidade muda. Ter o controle desse processo é essencial para não se perder no caminho.

Uma coisa é certa: quando projetos, programas e políticas atravessam anos sem darem resultados (transformação social desejada) é porque tem algo muito errado acontecendo. No próximo aniversário de sua OSC-ong pergunte: afinal, o que estamos celebrando?

Muitas situações são complexas e demandam anos de intervenção. Porém, tenha sempre estabelecido em seu planejamento uma data de saída ou término do projeto. Modelos focados em prédios, estruturas e equipamentos possuem a triste tendência de se perpetuarem exatamente para “manterem” estruturas, equipamentos e pessoas para darem conta deles, abandonando sua missão inicial.

Ao contrário de uma empresa, a melhor forma de saber se o seu projeto deu certo é torna-lo desnecessário ou transforma-lo. Isso quer dizer que ou a situação-problema foi resolvida, ou as pessoas da comunidade foram capacitadas, empoderadas e mudaram de comportamento. Ou as duas coisas ao mesmo tempo.

 

*Artigo escrito por Gustavo Adolpho Leal Brandão, Consultor Especializado pela UFRJ para o Terceiro Setor, Certificado pelo PMD PRO – Project Management for Development, Empresário, Consultor na Una Consultoria Social, Coach e Consultor em Compliance pela Mentoris Ltda.

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