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Sua excelência, o rabo-de-galo
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Marcelo Amorim
Rabo-de-galo sobre o balcão do Armazém do Nico, que existe desde 1971. A receita leva cachaça 51 e vermute Cinzano.

Por Marcelo Amorim

Este blog, dedicado desde sempre à Baixa Gastronomia, abre espaço hoje para a Baixa Coquetelaria. E como tudo que habita o universo da baixa coquetelaria é de alto nível alcoólico, nada mais adequado do que chamarmos para a mesa o ícone dos bebuns de bairro: sua excelência, o rabo-de-galo.

Encontrado desde biroscas a botecos tradicionais, esse brasileiríssimo engasga-gato está para os que bebem assim como o cigarro sem filtro esteve para os que fumam. Embora gozando de relativa fama, poucos sabem que o rabo-de-galo tem sua gênese ligada à história americana. Até seu pitoresco nome tem um pezinho lá nos states. O amigo leitor está curioso? Então, vou servir mais um parágrafo.

Marcelo Amorim
Apesar do nome modernoso, o Waikiki Bar tem cara de antigo e é realmente antigo, são 70 anos de história. Nele, o Márcio, filho do fudador, serve rabo-de-galo com 51 e Contini.

Nos anos 1920, afundados numa crise econômica que culminou na quebra da Bolsa de Valores de Nova York e multiplicou os casos de alcoolismo, os EUA instituíram a Lei Seca, proibindo a produção, venda e consumo de bebidas alcoólicas. Para Al Capone e toda a bandidagem da época, isso foi um copo cheio.

A máfia dominou a cena e passou a comercializar destilados produzidos clandestinamente. Inventar misturas foi a saída para compensar a falta de qualidade dos venenos feitos em fundo de quintal, e assim surgiu o barman e seus coquetéis, muitos dos quais se tornaram clássicos.

Marcelo Amorim
Conta a lenda que no cinquentenário Bar do Padre uma celebridade da TV costumava bater cartão para beber rabo-de-galo. Mas isso foi “na época em que ele ainda era pobre”, atesta o dono do lugar, o seu Lauro.

Mas voltemos ao rabo-de-galo. Só muito recentemente o brasileiro passou a topar com boas cachaças nos mercados e bares. Durante a maior parte da história etílica nacional, pedir uma purinha no balcão era missão para bravos. Mas eis que, certo dia, tentando amaciar uma arrebenta-peito qualquer, alguém decidiu entornar sobre ela uma dose de vermute.

Assim nascia o rabo-de-galo (sobe o som dos violinos).

Agora vem a saideira desse papo: por que raios esse negócio foi ganhar esse nome tão, digamos, folclórico? Prepare-se, pois sua vida está prestes a mudar com a revelação que vem a seguir. Na mesma época da Lei Seca americana, particularmente na região do Mississipi, os apostadores de brigas de galo tinham o hábito de mexer seus drinques com uma pena tirada do rabo do galináceo campeão. Rabo de galo, em inglês, é o que? Cock tail, of course. Para cocktail virar coquetel, e a versão literal disso batizar nosso drinque mais pop, foi um pulo. Ou melhor, um gole.

Modo de fazer: em um copo martelinho, misture uma parte de cachaça com outra igual de vermute. Se preferir um sabor menos doce, substitua o vermute por Cynar. Sirva na temperatura ambiente.

Marcelo Amorim
No Santa Rita, bar com mais de 40 anos de idade, o seu Clair serve um rabo-de-galo democrático: cachaça com o que o freguês quiser. Pedi meu preferido, com Cynar.

Harmonização: rabo-de-galo acompanha muito bem tremoço, azeitona verde e salada de sardinha com cebola.

Avaliação: o retrogosto vem só no dia seguinte, e lembra notas de arame farpado.

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Serviço
Armazém do Nico – Rua Ewaldo Schiebler, 422 – Jardim Social
Bar do Padre – Rua Dom João VI, 35 – Cajurú
Bar Santa Rita – Rua Santa Rita 257 – Ahú
Waikiki Bar e Mercearia – Rua Santo André, 116 – Cajuru

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