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O STF pede desculpas antes de liberar Lula?
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É curioso como no Brasil os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) se tornaram atores políticos de primeiro plano, com suas declarações muitas vezes conflitantes e até incendiárias. Neste momento, eles tentam “apaziguar” o país, como se essa fosse sua função. A impressão que fica é a de que o Supremo está pedindo desculpas antes de fazer algo muito errado.

A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, pediu serenidade, neste tempo de “intolerância e intransigência”. E completa, dizendo que “diferenças ideológicas não podem ser inimizades sociais”. É como se o tribunal estivesse pronto para decidir quem está certo em uma briga entre irmãos na qual ninguém tem razão porque têm diferenças ideológicas.

O ministro Gilmar Mendes apelou para a “imagem do Brasil lá fora” para dizer que prender condenados pega mal para o país – sendo que ele mesmo votou a favor dessa interpretação da lei. Aí, nesse caso, essa briga ideológica poderia estar levando o país a prender inocentes (até que se prove o contrário diante do STF). O curioso é que Mendes deu a declaração em Portugal, país que permite a prisão após condenação em segunda instância, como bem lembraram os procuradores que levaram na segunda-feira um abaixo-assinado ao STF.

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Parece estar havendo uma ressignificação do julgamento de Lula como uma escusa para sua libertação – e, provavelmente, de outros criminosos condenados em situação semelhante. Na dúvida provocada pelas “questões ideológicas” ou da “imagem do país”, seria melhor mudar um entendimento do próprio STF que não tem dois anos.

O julgamento de Lula tem dois caminhos possíveis e só dá para acertar o resultado no chute. Os ministros podem julgar o caso isolado do ex-presidente, situação na qual há mais chances de ele não obter seu habeas corpus. Isso porque a ministra Rosa Weber, considerada o “voto de Minerva” na ação, tem respeitado a decisão de 2016 em votos isolados. Se for aceita a discussão ampla da prisão em segunda instância, a balança vira em benefício de Lula, já que Rosa votou contra a maioria naquela ocasião.

Se Lula deve ou não ser preso já está decidido: a condenação pelo TRF-4 significa que ele é culpado e deve ser preso. Se ele deve ser preso agora, é a questão que o STF respondeu positivamente em 2016 para qualquer condenado. É difícil argumentar que a corte foi injusta com todos os presos desde então quando a tramitação dos recursos em instâncias superiores tem uma função protelatória. O STF aceitaria rever todas essas prisões provocado somente pela situação do ex-presidente? No fim, essa é a pergunta que será respondida na quarta-feira.

Como em toda questão constitucional, há bons argumentos dos dois lados do debate. A solução ideal seria mudar a redação da Constituição para resolver o que é um aparente conflito: o texto criou a presunção da inocência até o trânsito em julgado (qual trânsito?), ao mesmo tempo em que obviamente não tinha como objetivo criar a impunidade. O STF fechou a lacuna em 2016 com o que era a solução apoiada pela sociedade, que obviamente não quer a impunidade.

Agora, o tribunal enfrenta o desconforto de ter de aplicar sua própria decisão por causa de outro artigo da Constituição: “todos são iguais perante a lei”. Lula é igual aos outros oito presos da Lava Jato por condenação em segunda instância? Na quinta-feira, as desculpas do STF não vão servir de nada para grande parte da população se Lula não for tratado como os outros. Nem servirão para outra parte se ele for preso. Apaziguar o país está fora do alcance dos 11 ministros.

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