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Meia hora com Sérgio Mallandro e alguns ‘glu-glus’ e ‘ie-iés’
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Ao se aproximar de Sérgio Mallandro – e preencher um tratado invisível que nos permite fazer parte de mundo ao mesmo tempo surreal, engraçado e patético – o que mais chama a atenção é a largura do seu pescoço. A jugular salta, grossa e em alto relevo, a cada vez que pronuncia duas das expressões mais conhecidas do Brasil há pelo menos 30 anos: “glu-glu” e “ié-ié”.

Chamam a atenção também seus olhos cerrados. Mas não parece que ele está simplesmente com sono, e sim que se concentra em um ponto muito distante. Volta e meia, ele, que usa um boné preto alguns poucos graus virado à direita, também passa a mão no olho esquerdo, como se houvesse algo ali dentro que coçasse de forma quase mortal a cada cinco minutos.

“Quem me lançou? Quem me lançou ao mundo foi minha mãe, que deu um grito e disse: ‘vai, Serginho!’”, grita o humorista, respondendo à primeira pergunta.


Sérgio Mallandro esteve em Curitiba durante os dias 27, 28 e 29 de julho para apresentar o espetáculo Sem Censura, no Teatro Positivo. Em sua visita à Rádio 98FM, causou um verdadeiro rebu. Muitos disputavam silenciosamente um lugar em frente ao estúdio, onde, momentos mais tarde, Mallandro falava ao vivo a milhares de ouvintes. Logo depois, surgiu a turma do Esporte, com iPhones a postos, já pensando na pose que fariam na hora da foto com o maior ídolo da cultura trash do Brasil.

“O tempo todo é assim. Quando as pessoas me param na rua, faço ‘glu-glu-ié-ié, ‘ié-ié-glu-glu’, ‘glu-glu-ié-ié’, ‘si-fu-fu’ e ‘RÁ’. Acho que é uma homenagem, ia sentir falta se um dia não acontecesse isso. Tirar um sorriso das pessoas é para gente abençoada”, se gaba o humorista, depois de tirar fotos em que fez aquele conhecido gesto com as mãos — imagine alguém fazendo fisioterapia com uma bolinha de borracha, mas sem a bolinha.

Sérgio vestia uma calça jeans folgada, um tênis muito comum e uma blusa de moletom preta. Não estava frio, mas o carioca não abriu mão de um cachecol — enrolado desajeitadamente em seu pescoço — nem na hora das fotos.

Bem nascido, Serginho Mallandro é torcedor do Fluminense e tentou ser jogador de futebol. Ele fala com incrível seriedade e uma dose de exagero sobre a profissão que teria caso não fosse o que é: uma máquina de piadas prontas e funcionais.


“Eu era um craque. Jogava no meio campo e botava os caras na frente do gol. Mas minha mãe não deixou. Naquela época, futebol era meio…”

Sérgio Mallandro sempre falou muito – até hoje. Diz que gosta de ver as pessoas sorrindo. Na escola, se metia em conversas infinitas e atrapalhava a turma. Às vezes de propósito.

“Se precisava 5, tirava 5. Ser precisava de 7, tirava 7. Nunca precisei de 5 e tirei 6 porque não gostava de dar moleza para o professor”, diz o humorista, que cursou até o 3º ano de jornalismo e saiu para, enfim, fazer Teatro. “E aí tô tentando a carreira até hoje”.

Sérgio Mallandro não consegue ficar sem fazer piadas. Autopiadas, metapiadas, piadas repetidas. Sabemos que pessoas bem-humoradas demais costumam ser irritantes ou desagradáveis depois de um certo tempo, embora reconhecidas onde quer que seja. Sérgio Mallandro, hoje, convive com essa dualidade.

Inevitável, em sua presença, falar sobre uma história bastante conhecida nos bastidores da televisão. Consta que Sílvio Santos, depois de ver a apresentação de Sérgio Mallandro em um programa de auditório – em que também estava Maria da Graça Xuxa Meneghel, sua ex-paixão declarada –, decidiu contratar o jovem humorista com uma condição: depois de ter em mãos os exames que comprovassem sua sanidade. Isso porque, durante sua apresentação, ele, como um louco varrido, atacou ovos na plateia e na equipe. “Fiz um eletroencefalograma e deu problema. Mentira, não deu nada, RÁ!”.

Para Sérgio Mallandro, Sílvio Santos é o sujeito mais maluco da televisão. “É o cara que mais amo na tevê, só que ele é louco”, conta o carioca, um cara desorganizado – “sou profissional com meu trabalho, mas desorganizado na vida. Deixo minhas roupas jogadas no chão, não tô nem aí” — e que, por mais que muitos achem que é pegadinha, tem 57 anos de vida.

Mallandro tem duas casas, uma em São Paulo e outra no Rio de Janeiro – esta em São Conrado, com uma linda vista para o mar. De seus três filhos, dois (Steffani, 18 e Edgar, 4), moram na Inglaterra. No Rio, vive com sua ex-mulher e com um dos filhos. É nesta casa também que se passa o reality show Vida de Mallandro, exibido atualmente pelo Multishow.


“Minha melhor fase é hoje em dia. Estou feliz, tudo está fluindo bem, tenho portas abertas com as televisões. Vou fazer um longa-metragem chamado Dois Malandros em Las Vegas [de André Morais e Lúcio Mauro Filho]”, diz o humorista. Em Curitiba, seu espetáculo foi visto por 2.400 pessoas um uma só noite.

Sérgio Mallandro tem um Porsche Cayenne (cujo preço varia de R$ 300 mil a R$ 500 mil) e duas motos, uma de suas paixões. “Mas não me apego a coisas materiais, não. Nem cuido muito do carro. Já moto eu gosto bastante, mas não fico lá, limpando o tempo todo. Gosto de sair sem destino, principalmente quanto estou no Rio. Em São Paulo, não dá.”

Como muitas celebridades no Brasil, Sérgio Mallandro vive de um passado que se transformou em algo icônico. Na onda de alguns figurões da música, ele parou no tempo e se dedica a repetir o que o consagrou. A Porta dos Desesperados, por exemplo, foi uma atração que marcou época. Seus bordões são lembrados até hoje, embora também tenham sido o estopim para a invasão de programas fúteis, exagerados e desnecessários, que buscam audiência minimizando a capacidade tanto de telespectadores quanto de entrevistados, caso atual de Pânico na Tevê e CQC.

“Meu legado vai ser o ‘glu-glu’ e o ‘ié-ié’. As pessoas vão ficar no cemitério fazendo ‘ié-ié’. Se eu morrer afogado, vão fazer ‘glu-glu’, literamente”, diz Sérgio, que complementa, agora com outro olhar. “Chico Xavier disse que minha missão é levar alegria para as pessoas”.

De repente, o iPhone de Sérgio Mallandro toca. É um barulho engraçado. É como se um filhote de algum bicho selvagem estivesse grunhindo debaixo d’água. “Só um minutinho…”, diz Sérgio, que desliga o aparelho.


Em 2008, Sérgio Mallandro foi candidato a vereador em São Paulo pelo PTB. Sem propaganda na tevê, fez 23 mil votos. “Sabia que não seria eleito porque as pessoas não sabiam que eu era candidato”, conta. “Mas graças a Deus não fui eleito porque fiquei sabendo que lá dentro eu não ia conseguir fazer nada do que queria”.
O humorista administra uma creche em Guarulhos. “Falaram que, se fosse vereador, podia ter 10, 20 creches. Mas agora não penso em me eleger. Nunca mais”.

A Gazeta do Povo, antes da entrevista, perguntou a seus leitores o que eles queriam saber de Sérgio Mallandro. Vieram duas respostas com a mesma demanda, nada animadora para o humorista. “Sérgio Mallandro, quando você irá encerrar a carreira?”

“Acho que esse leitor não deve ter lido nada sobre mim. Ele vai ter uma surpresa muito grande quando for assistir ao meu show. Teatro é cult, não é? Sabe quem vai ao meu show? Desembargador, presidente de banco, o Wolf Maia, a Carla Vilhena, até o Mister M. já foi. Dá um convite para o seu leitor e fala pra ele que de algodoeiro, o que nasce é algodão. Não pode nascer maçã”.

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