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Mudanças próximas na Lei Roaunet
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Estive em São Paulo neste final de semana onde ocorreu o seminário para discussão do projeto de lei do Procultura, mecanismo que se aprovado deverá substituir a lei nacional de incentivo à cultura 8113/91 conhecida como Lei Rouanet. O evento organizado pelo portal Cultura e Mercado e pelo CEMEC, Centro de Estudos de Mídia, Entretenimento e Cultura, contou com a presença de autoridades do Ministério da Cultura, representantes de diversas entidades ligadas ao setor e do deputado Pedro Eugênio (PT-PE), relator do projeto na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara Federal.

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Limites de incentivos fiscais para eventos com viabilidade econômica, como o Cirque du Soleil.

O Secretário do Ministério da Cultura, Henilton Menezes, fez uma apresentação sobre os números da Rouanet atual, e uma retrospectiva da lei que contabiliza 20 anos de existência. Apontou que a legislação teria como mecanismos de ação três vertentes: Fundo Nacional de Cultura (FNC), Renúncia Fiscal (Mecenato) e o FICART (Fundo de Investimento Cultural e Artístico), que na realidade nunca foi implantado. Isso aliado ao enfraquecimento do FNC vem desgastando e criando uma série de distorções na lei. Existem três mecanismos, mas todos buscam recursos no mecenato o único que vem funcionando.

Pra piorar a situação nos últimos anos criou-se um enorme desequilíbrio entre os valores do Fundo Nacional de Cultural e da Renúncia Fiscal. Pra se ter uma ideia neste ano os valores aprovados pela LDO para renúncia fiscal cultural chegam a R$ 1,6 bilhão, enquanto que o fundo está orçado em R$ 250 milhões. Uma disparidade que vem criando uma lógica muito perversa no sistema cultural brasileiro.

Para corrigir estas e outras distorções, o governo federal enviou um texto que revoga a lei Rouanet e implanta um sistema que tenta ser mais coerente com as necessidades da sociedade brasileira. Depois de passar por modificações na Comissão de Educação e Cultura com relatoria da deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), o texto seguiu para a Comissão de Finanças e Tributação onde o relator, Deputado Pedro Eugênio (PT-PE), propõe novas alterações.

A nova proposta do deputado, apresentada em primeira mão no seminário, propõe a desconcentração, descentralização e democratização dos recursos públicos. Hoje, quando falamos de renúncia fiscal cultural mais de 79% dos recursos disponíveis são aplicados no eixo Rio-São Paulo. O Paraná está em quinto lugar na captação de recursos com apenas 3,4% dos incentivos federais, a maioria destes recursos são das estatais do estado, principalmente da Copel, mas em alguns estados do norte o percentual de recursos chega a zero.

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Secretário Henilton afirma que a nova lei é factível e corrige muitas distorções.

Segundo Henilton Menezes, as áreas com maior captação são: música: 27%, teatro: 25%, humanidades: 15% e audiovisual 11%, lembrando que o cinema brasileiro conta também com outra legislação específica, como a Lei do Audiovisual e Fundo Nacional de Cinema. Aliás, o FUNCINE por conta da nova lei 12485/11 de TV por assinatura, recebeu recentemente novos aportes de recursos para a produção independente e que serão administrados e repassados através do BRDES.

A principal mudança da lei Rouanet para o Procultura diz respeito ao percentual de isenção fiscal de um determinado projeto. A lei deve separar o grande do pequeno proponente. Este último passa a contar com 100% de isenção fiscal para o projeto. Já o grande proponente passará por critérios de pontuação como: acessibilidade, formação profissional, preservação de patrimônio, benefícios sociais entre outros. São 19 pontos onde o proponente deverá cumprir ao menos 12 para que o projeto tenha 100% de isenção fiscal. Projetos que tenham uma ótica totalmente mercadológica terão apoio através de outro mecanismo, o FICART. Um tipo de financiamento parecido com as linhas de crédito do BNDES, onde o banco operador do fundo entrará como sócio econômico do projeto. Terá controle e regulamentação da CVM, Câmara de valores Mobiliários. Isso deverá tirar da renúncia os projetos polêmicos com forte viabilidade econômica, mas que necessitam de capital de risco para acontecerem. Grandes eventos como o Rock in Rio, por exemplo, entrariam no FICART, que terá como meta fortalecer o empreendedorismo na área cultural.

O projeto de lei propõe ainda alterações nos valores de renúncia, visando com isso o fortalecimento do Fundo Nacional de Cultura. Hoje a empresa incentivadora pode destinar 4% do IRPJ para projetos aprovados pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura. Pela proposta este percentual poderá chegar 6%. Para isso a empresa deve destinar o quinto 1% para o Fundo Nacional de Cultura. Para utilizar mais recursos em projetos incentiváveis pela renúncia a empresa deverá “adquirir” mais 1% através de uma doação de 20% sobre o valor ao Fundo Nacional de Cultura. Este percentual subirá progressivamente em quatro anos até 50% e não poderá ter origem na própria renúncia. Ou seja, as empresas terão que desembolsar recursos e então passariam a financiar em parte o FNC.

Segundo sondagem realizada com os grandes incentivadores da atual Rouanet, estes estariam favoráveis à alteração e também à contribuição. Estima-se que com tais alterações o FNC possa chegar a 900 milhões de reais, cerca de 50% do valor da renúncia que deverá chegar 1,8 bilhão.

divulgação MINC
Seminário na Associação dos advogados de São Paulo.

Outra alteração com relação à renúncia é o aumento do incentivo para pessoas físicas. Hoje o cidadão brasileiro destina até 6% do IRPF, neste novo modelo poderá destinar até 8%. Além disso, 3% poderão ser doados diretamente na declaração. Isso é importantíssimo, pois somente no momento da declaração é realmente possível saber o valor devido de imposto e utilizar-se deste benefício. Muitas pessoas físicas que hoje deixam de destinar recursos deverão ser atraídas pelo sistema, principalmente pelos pequenos proponentes.

Ainda com relação à renúncia a nova lei tentará atrair para o sistema as pequenas empresas, com faturamento de até 300 milhões. Estas estarão automaticamente habilitadas a destinar 8% do IRPJ. Porém, o mais interessante, é que este aumento de 4% deverá ser destinado com exclusividade para os proponentes considerados “independentes”. O termo independente é descrito no projeto de lei levando em consideração diversos fatores, mas principalmente o fato do proponente não acumular funções como produção e distribuição do produto cultural. Associações e cooperativas estão dentro. Além disso, o PL leva em conta se a empresa é pertencente ao Simples Nacional. Ou seja, cruza a missão da empresa com a questão fiscal.

No que diz respeito à descentralização, tanto o Fundo Nacional de Cultura quanto a Renúncia Fiscal tentarão através de um sistema de pontuação incentivar os projetos por territórios estratégicos. Será criada uma certificação de território, de acordo com a importância histórica e a identidade sociocultural da região. Assim o incentivador poderá obter mais renúncia fiscal se apoiar projetos realizados nestas localidades, um tipo de atrativo que visa dar mais competitividade em relação aos grandes centros. No caso do FNC a descentralização será na forma de repasses para estados e municípios, ou seja, 80% dos recursos do FNC deverão ser repassados aos Fundos Estaduais e Municipais. Para isso, os entes locais deverão contar com conselho, plano e fundo de cultura. Levará vantagem o município ou região histórica melhor pontuada de acordo com os critérios acima descritos. O Fundo Nacional de Cultura passará também a ser contábil- financeiro e será possível transferir os recursos não utilizados de um ano para o outro com correção da inflação.

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Deputado Pedro Eugênio (PT-PE), relator do procultura.

Conversei com o deputado, que é economista e ele afirmou que o projeto deverá receber agora as avaliações do ministério da fazenda sobre o impacto econômico. Segundo ele a presidente Dilma está favorável ao projeto, mas neste momento é necessário que a sociedade brasileira tome conhecimento do texto e que apoie a sua aprovação. O deputado comprometeu-se a disponibilizar o texto do PL 6722/10, no site da câmara a partir desta semana.

Resta saber se os produtores culturais daqui irão realmente receber atenção por parte do empresariado, principalmente aquele local que costuma colocar dinheiro em grandes eventos e fora do Paraná. É importante que se diga que a demanda por projetos culturais tende a crescer. Este ano a Lei Municipal de Incentivo de Curitiba recebeu 800 projetos, 30% a mais que no ano anterior. Aumentar os recursos locais é necessário, mas não resolverá o inchaço de projetos, ao contrário, criará demanda por mais verba. Por isso é preciso haver diversificação nos mecanismos e neste sentido é interessante o projeto de lei do Procultura, que parece separar muito bem: arte, cultura de nicho, cultura de massa e show business, cada qual o peso da atenção pública que merece.

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