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s.m. (1881) 1 pracha longa, e ger. bem elevada, em que nadadores, acrobatas etc. preparam os seus saltos e de onde os executam. 2 fig. pessoa ou coisa que vem a constituir o meio pelo qual se obtém ou realiza algo etim it. trampolino ‘id.’

Fonte: Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.

O escritor pernambucano Marcelino Freire escreveu o conto "Tentanto Entender" em formato de dicionário. O texto inventivo, publicado na antologia Desacordo Ortográfico, de acordo com o autor, foi "escrito pelo dicionário". "Fui primeiro atrás do significado da palavra 'língua' e, a partir dessa palavra, fui puxando outras. Da explicação tirei uma palavra que me levou a outra explicação. Fui atrás da narrativa a partir do que fui encontrando no dicionário", conta Freire, que já ganhou o Prêmio Jabuti, com o livro de contos Contos Negreiros.

Ou seja: o prosador usou o dicionário como voz e matéria-prima para uma experiência literária. E isso é algo recorrente no modus operandi do autor pernambucano, que vive em São Paulo. Freire confessa que muitos de seus contos têm frases inteiras tiradas do Dicionário Analógico da Língua Portuguesa, de Francisco Ferreira dos Santos.

Freire conta que escreve ficção, antes de qualquer recurso, com palavras. A afirmação, em vez de de soar ingênua, aponta para o que é realmente o "segredo da criação literária". O escritor gaúcho Moacyr Scliar, a exemplo de Freire e outros escritores consultados pela reportagem da Gazeta do Povo, como Altair Martins e Humberto Werneck, consulta dicionários, mas acima de tudo acessa o seu dicionário interno, formado pelas palavras que acumulou ao longo da vida, que têm suas próprias conotações semânticas, "sobretudo emocionais".

Scliar confessa que mistura, espontânea e inconscientemente, o repertório culto com o coloquial, o que resulta em um hibrismo do qual ele, declaradamente, muito se orgulha.

E a fala do escritor gaúcho aponta para outra questão, relacionada (mesmo que indiretamente) a dicionários: existe o falar, e o escrever, certo e o errado?

O linguísta da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Sírio Possenti afirma, em alto e bom som, para quem quiser ouvir, que "não existe isso de falar, e escrever, certo ou errado." Para o estudioso, quem diz que há o falar, e o escrever, certo e errado, geralmente, são pessoas que "sofrem" de nostalgia, e querem dar a entender que o melhor, e o correto, era como se escrevia "antigamente", "como se no tempo presente tudo fosse necessariamente ruim, e pior do que no passado", analisa Possenti.

Mas há, sim, formas corretas de escrita, argumenta o linguísta da UFPR Carlos Aberto Faraco e, devido a isso, quem escreve deve se adequar a esses usos correntes, e corretos. Mas, lembra Faraco, a língua é viva e se modifica. "Os dicionários e as gramáticas registram os usos cultos. Mas os donos da língua são os falantes", afirma Faraco.

O que Faraco diz, mesmo nas entrelinhas, é o seguinte: não há nenhum malefício em utilizar dicionários. O escritor Altair Martins recomenda a todos o uso de dicionários, e garante que não há efeito colateral. "Creio que não há malefício (em consultar dicionários), a não ser que o sujeito se embebede com ele", comenta, em tom de brincadeira, Martins.

Carpinejar, que gosta de metáforas, observa que o escritor é um dicionário de premonições. "Nem todos são realmente profetas, mas alguns vão provar que seus ouvidos eram mediúnicos", poetiza o bardo gaúcho. (MRS)

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