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Antigamente, até o final da década de oitenta do milênio passado, sempre no apagar das luzes de cada ano, os técnicos do Fisco federal apresentavam as mudanças procedimentais atinentes às declarações do Imposto de Renda do exercício seguinte. Não raro, acompanhando variadas notas explicativas sobre critérios de preenchimentos dos complicados formulários (enviados pelos Correios para o endereço de cada contribuinte), era anunciado o direito a uma nova dedução ou a um abatimento especial da renda bruta, como em casos de tragédias climáticas no Sul ou no Nordeste.

Felizmente, foi-se esse tempo!

Praticamente desapareceram as "novidades" (as boas, nem pensar) juntamente com os imponentes manuais que orientavam os contribuintes no preenchimento das declarações, nas cores azul e verde. O velho aparato de atos explicativos da legislação do Imposto de Renda das pessoas físicas deu lugar a simples instrução normativa anualmente baixada pela Receita Federal. O tempo foi levando para o além o sagrado direito ao abatimento sobre os ganhos brutos do contribuinte de determinadas despesas, como aluguel, uniformes e livros escolares dos filhos.

Apenas no que tange aos detalhes burocráticos das obrigações impostas aos súditos não se pode negar, apenas nesse particular, que houve tênue avanço na eliminação de papelórios, conquista decorrente principalmente da informatização do processamento das declarações. Vagarosamente (mas ainda sob o fantasma das monstruosas filas esparramadas nos guichês do Leão), caminha-se na direção da esperada e longínqua comodidade do ato (dito cívico) de pagar impostos, como sonhava Adam Smith.

Direitos esquecidos

Como dizia, estão desaparecendo do rol dos direitos relacionados com a capacidade contributiva das pessoas físicas conquistas importantes. Uma delas diz respeito à supressão do direito de deduzir da renda bruta despesas suportadas pelo contribuinte a título de aluguel. A legitimidade desses desembolso, outrora conferida à enorme legião de súditos sem casa própria, reclama urgente retomada de uma reflexão voltada a um tratamento fiscal justo e humanista. Além de confiscatório, soa ilógico tributar pelo IR o salário bruto mensal de um cidadão que ganha R$ 3 mil, sem considerar o valor do aluguel que ele paga.

O mesmo lembrete serve como repulsa aos risíveis tetos das deduções que o contribuinte pode considerar a título de despesa com a instrução dos filhos. Não bastando isso, a mesquinhez da legislação chega ao ponto de não permitir o abatimento de gastos educacionais relacionados com uniformes, material escolar, aquisição de enciclopédias, livros, revistas, aulas de música, dicção, informática, cursos preparatórios para vestibulares, aulas de idiomas e outros indispensáveis desembolsos inerentes à boa formação dos jovens.

O pior. Toda essa incoerência encontra-se escancarada nas leis de um país cuja "Constituição Cidadã" assegura expressamente que a "educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da cidadania e sua qualificação para o trabalho" (CF/88, artigo 205). Diz ainda o texto constitucional, no artigo 215, que "O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais." Por incrível que pareça, também foi erigido a princípio do Texto Maior que os impostos devem ser medidos segundo a capacidade econômica dos contribuintes.

Saudade daqueles tempos em que, no apagar das luzes de cada ano, os técnicos do Fisco federal podiam surpreender, fazendo seu mea maxima culpa do fardo impingido aos contribuintes e sugerindo às instâncias superiores o anúncio de boas notícias a nosotros...

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