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O governo federal surpreende e deixa o Congresso Nacional sem reação. Os vetos e correções promovidas pelo Executivo na sanção do projeto de lei que institui o novo Código Florestal Brasileiro deixam a matéria quase incontestável. Depois de quatro anos de discussão e diversos acordos fracassados, a falta de entendimento entre Câmara e Senado, assim como as divergências dentro de cada uma das casas, a questão finalmente caminha para um acordo a partir da intervenção do Planalto. Com habilidade técnica e política – características que, somadas, criam um ambiente pouco comum em Brasília –, os dispositivos mantidos, os que foram vetados e aqueles que serão aprimorados através de Medidas Provisórias (MPs) sugerem um encaminhamento prático, com uma resposta única às demandas políticas e classistas que envolvem o polêmico debate em torno do tema.

Os detalhes sobre as modificações no projeto de lei devem aparecer no Diário Oficial de hoje. Mas, na sexta-feira, quando expirou o prazo de análise e sanção pela presidente Dilma Rousseff, as principais definições foram repercutidas pelos ministros da Agricultura, Meio Ambiente e Desenvolvimento Agrário. Entre os pontos mais relevantes está a regra a ser adotada para as Áreas de Preservação Permanente (APPs). A faixa de mata ciliar a ser mantida às margens dos cursos de água, por exemplo, será de cinco a cem metros, a depender do tamanho da propriedade e do rio. A métrica utilizada para classificação são os módulos fiscais. Assim, quem tem mais área vai preservar mais, sempre tendo como fator limitante o tamanho do rio na adoção do critério de proporcionalidade. Bom principalmente para os pequenos produtores, que compõem a maioria absoluta do número de imóveis rurais no Brasil.

Mas o posicionamento do governo também é político. Se tecnicamente ele entende que faz justiça na distribuição da responsabilidade em produzir e preservar, politicamente podemos considerar que o Planalto foi ousado. As interferências não foram poucas e chegam como uma resposta às alterações promovidas na Câmara e que foram interpretadas como uma derrota do Executivo. São 12 vetos e 32 modificações, sendo que 14 são dispositivos recuperados da redação aprovada no Senado, cinco são novos e 13 são ajustes. Tudo isso em cima de 84 artigos. Ou seja, se na Câmara o texto que veio dos senadores passou por profundas modificações, pelas mãos do governo ela de certa forma resgata parte das discussões e alinhamentos feitos no Senado e que agradavam a presidente Dilma. Pode-se dizer que ao final da história o novo Código terá sim um DNA partilhado, pelo Senado, Câmara e Presidência.

Por conta disso, o governo acredita que a proposta da nova legislação também reflete parte da vontade do produtor e do ambientalista, em suas causas e efeitos implícitos à necessidade da produção e preservação. Ela não será unanimidade e nem terá 100% de aceitação, sempre a depender dos interesses de cada segmento. Mas diante da impossibilidade de um consenso, a julgar a peculiaridade do assunto, a proposta é democrática, menos radical e a de mais bom-senso que apareceu até agora. Os detalhes das mudanças, com os vetos e o teor das MPs serão conhecidos hoje. Mas dificilmente haverá reação contrária a ponto de emperrar o avanço e finalização da matéria entre os deputados. As reações devem ser proporcionais e os descontentamentos pontuais aos impactos que a lei possa trazer para esta ou aquela região.

Do ponto de vista da realidade do produtor e da estrutura fundiária, bastante diversa no país, a solução proposta parece lógica. Resta saber como ela será aplicada diante de tamanha diversidade. Grandes e pequenos rios são margeados por grandes e pequenas propriedades. A se respeitar o critério dos módulos fiscais, o governo garante a recuperação e preservação, mas não de maneira uniforme. Com exceção dos imóveis onde a faixa de cinco metros de mata ciliar ultrapassar os 10% de área total da propriedade, quase nunca teremos APPs inferiores a essa marca. Mas as variações serão grandes e muitas dentro da própria região e até entre vizinhos da mesma bacia hidrográfica.

O entendimento então terá de ser muito preciso, caso a caso, de Norte a Sul do Brasil, numa capilaridade que sempre foi defendida pelos ruralistas. Ou seja, a discussão continua. O esforço daqui para frente será no entendimento, compreensão e aceitação das novas regras, tarefa que não será das mais fáceis, embora a fase mais crítica do debate esteja sendo superada, pelo menos na teoria. E, depois de 47 anos, o Brasil reforma a legislação e apresenta hoje o seu novo Código Florestal.

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