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Com receita esperada de R$ 12 bilhões no ano, alta da tributação dos combustíveis é um dos principais pontos do ajuste fiscal. | Roberto Custodio / Jornal de Londrina
Com receita esperada de R$ 12 bilhões no ano, alta da tributação dos combustíveis é um dos principais pontos do ajuste fiscal.| Foto: Roberto Custodio / Jornal de Londrina

O ajuste das contas públicas está sendo feito da forma mais dolorosa para a atividade econômica: com mais impostos e menos investimentos.

As medidas de ajuste já anunciadas pelo governo federal somam R$ 111 bilhões em 2015. Um quarto do total, cerca de R$ 28 bilhões, é o que o Planalto espera arrecadar com o aumento de alíquotas e a recomposição de impostos e contribuições.

Os outros três quartos, ou R$ 83 bilhões, se referem à contenção de despesas. Estão nessa lista as regras mais rígidas para a concessão de benefícios trabalhistas e previdenciários (seguro-desemprego, abono salarial e pensão por morte), o fim do auxílio ao setor elétrico e o corte do Orçamento.

Queda na arrecadação torna cumprimento da meta mais difícil

A meta do setor público é economizar R$ 66,3 bilhões, ou 1,13% do PIB, para pagar os juros da dívida neste ano. Mas boa parte dos economistas que acompanham as finanças do governo duvida do cumprimento desse objetivo. No geral, as previsões para o chamado superávit primário oscilam entre 0,6% e 0,8% do PIB.Uma das razões é a recessão. “O aumento de

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Sozinho, o bloqueio orçamentário, de R$ 70 bilhões, equivale a quase dois terços de todo o ajuste. O número, porém, exige ressalvas. A maior parte do corte está na despesa que havia sido projetada para este ano; em relação ao que foi executado em 2014, a queda é de R$ 20 bilhões, pelas contas do especialista em finanças públicas Mansueto Almeida.

Além disso, a tesourada federal está cortando mais os investimentos do que as despesas de custeio. Segundo relatório do Tesouro, o investimento federal despencou 37,2% nos cinco primeiros meses do ano, em comparação a igual período de 2014, já descontada a inflação. Em valores absolutos, a baixa foi de R$ 14,3 bilhões, concentrada em seis ministérios: Defesa, Desenvolvimento Agrário, Cidades, Educação, Transportes e Saúde.

Tudo pelo social

De 2000 a 2014, os gastos com INSS, programas sociais e custeio da saúde e da educação cresceram o equivalente a 4,55 pontos porcentuais do PIB, enquanto os gastos com o funcionalismo federal baixaram 0,28 ponto. Ou seja, o que realmente fez explodirem as despesas federais foi o chamado gasto social, que reduz o montante disponível para investimentos. A avaliação é de Luiz Guilherme Schymura, diretor do Ibre/FGV, que publicou artigo sobre o assunto semanas atrás.

Uma falsa questão

Roberto Piscitelli, professor de Finanças Públicas da UnB, vê como “perniciosa” a ideia de que a despesa com investimento é necessariamente boa e o gasto de custeio, ruim. “Muitos especialistas só falam em cortar custeio, mas qual custeio se deve cortar? O fornecimento de medicamentos, por exemplo?”, questiona. “É por causa dessa mentalidade que liquidamos nossas estradas em pouco tempo. Faz-se o investimento na rodovia e depois não se gasta com manutenção.”

“Se esse ritmo for mantido, o investimento federal vai cair uns R$ 30 bilhões neste ano, em relação aos R$ 77 bilhões do ano passado. Em comparação ao tamanho da economia, cairá de 1,4% do PIB em 2014 para 0,8% do PIB”, estima Almeida.

Mas nem mesmo essa economia – que no futuro terá reflexos negativos nos serviços públicos, na infraestrutura e na produtividade do país – parece suficiente para baixar o somatório das despesas federais. De janeiro a maio, ele aumentou 0,2%.

Rigidez dos gastos

O governo fez um esforço para baixar os gastos com o funcionalismo, que recuaram 1,4%. Mas essa economia, de R$ 1,4 bilhão, virou pó perto da alta de R$ 5,6 bilhões (5,9%), na rubrica “outras despesas de custeio”. Outro item importante, o pagamento de benefícios do INSS cresceu R$ 7,7 bilhões (4,8%).

“O ajuste, como em outras ocasiões, recai mais sobre o contribuinte e o investimento do que sobre a máquina do governo. Mas isso também se deve à rigidez do gasto público, que é imposta pela legislação”, diz o economista Thiago Biscuola, da RC Consultores.

Um artigo publicado na semana passada por José Carlos Gerardo, analista de finanças e controle do Tesouro, traduz em números a dificuldade do governo em baixar gastos. Segundo ele, de R$ 1,263 trilhão em despesas primárias previstas para este ano, 95% são gastos obrigatórios. Sobram só R$ 65 bilhões com alguma margem de manobra. “Portanto, o ajuste fiscal passa, necessariamente, pela elevação da receita fiscal, que implica ou elevação da carga tributária ou obtenção de receitas extraordinárias”, escreveu Gerardo.

Economistas têm dúvidas sobre efeitos da taxação de heranças

Em sua cruzada por mais recursos, o governo estuda elevar a tributação sobre heranças. Segundo reportagem do Valor Econômico, a alíquota média é de pouco menos de 4%. Esse porcentual subiria para 20% e o imposto, hoje estadual, seria compartilhado com a União e os municípios. A arrecadação anual saltaria de R$ 4,5 bilhões para perto de R$ 25 bilhões.

Economistas consultados pela Gazeta do Povo elogiam a iniciativa. “Ela tem um aspecto redistributivo importante em um país tão desigual como o nosso. Na comparação com outros países, a taxação de herança é relativamente baixa no Brasil. E em princípio não afeta a atividade econômica, pois pega o estoque de riqueza, não a produção ou o consumo”, diz Fabio Klein, da Tendências Consultoria.

Thiago Biscuola, da RC Consultores, também vê méritos, mas têm dúvidas sobre os resultados de taxar mais as heranças. “Faz sentido do ponto de vista social, mas o efeito pode não ser tão grande quanto o esperado. Quem tem poder aquisitivo elevado vai mobilizar seu capital e evitar a taxação”, avalia.

Para Roberto Piscitelli, da UnB, há espaço político para a discussão desse imposto, em especial após a repercussão dos estudos sobre desigualdade de Thomas Piketty, autor de O capital no século 21. Mas Piscitelli recomenda cautela com os eventuais ganhos desse tipo de imposto. “Não devemos ter ilusões de que vá gerar montantes consideráveis. Em outros países, esses impostos já foram mais difundidos, mas de modo geral houve uma queda das alíquotas médias.” (FJ)

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