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De tanto o governo Dilma fazer mágica com a contabilidade das finanças públicas, pouca gente ainda leva a sério os números divulgados pelo Planalto. Mas é injusto estender ao trabalho do IBGE a justa desconfiança com que se via o trabalho do Tesouro Nacional nos tempos de Arno Augustin – por mais que a cacofonia ofegante-conspiratória das redes sociais e o clima de torcida organizada reinante no Congresso levem as pessoas a conclusões que nem sempre são as mais sensatas.

A revisão do Produto Interno Bruto recém-divulgada pelo IBGE serve para adequar o sistema brasileiro de contas nacionais às novas metodologias internacionais, recomendadas em manual preparado pela ONU, o FMI, o Banco Mundial e a OCDE, o clube dos países mais ricos. Uma das mudanças mais interessantes é a que contabiliza o valor aplicado em pesquisa e desenvolvimento (P&D) como “investimento”, e não mais como mera “despesa”. Qualquer empresário sabe que isso faz todo o sentido.

Os Estados Unidos foram o primeiro país a rever o PIB dentro dessas normas. Eles recalcularam a série histórica, acredite, desde 1929. Chegaram a criar uma nova categoria, chamada “originais de entretenimento, literários e outras obras artísticas”, para refletir as receitas geradas ao longo dos anos por músicas, filmes, livros, shows de tevê e afins. E quando o Bureau of Economic Analysis (BEA) divulgou a revisão, em 2013, não foi para beneficiar o presidente Barack Obama.

Os países da União Europeia fizeram o mesmo no ano passado. Com um acréscimo picante: além da mudança na rubrica de P&D, a Eurostat incorporou no cálculo do PIB atividades como a prostituição e o comércio de drogas. E não foi para melhorar a avaliação do governo holandês. Aliás, é de se imaginar o efeito estatístico que a adoção desse método teria por aqui.

Outra coisa importante: as estatísticas do PIB serão, sempre, tentativas de aproximação. Nunca, em país algum, vão refletir fielmente toda a atividade econômica que ali transcorreu. Mesmo economistas que dedicam seu tempo a avaliar as metodologias não chegam a um consenso sobre se o PIB brasileiro é subestimado ou superestimado.

Feitas essas observações, há que se admitir que o salto do PIB brasileiro de 2011 – cujo crescimento passou de 2,7% para 3,9% – chama atenção. Erros acontecem. Houve um, muito sério, na divulgação da Pnad, em setembro do ano passado, corrigido assim que detectado. Mas acredito que a mudança no PIB se deve, pura e simplesmente, à revisão metodológica e à incorporação de novas e mais detalhadas fontes de informação.

Se fosse manobra, como gritam as redes sociais, os novos dados teriam sido divulgados às vésperas da eleição do ano passado. Sim, pois, segundo um pesquisador a par do trabalho de revisão do IBGE revelou à Gazeta do Povo no fim do ano retrasado, os números revisados de 2011 estão prontos desde 2013 – o costume do instituto, afinal, sempre foi o de divulgar os dados “definitivos” do PIB dois anos após o ano de referência.

Para esse pesquisador, o governo fez outro tipo de manobra. Postergou a divulgação porque queria, à época, evitar que aposentados corressem à Justiça para pedir uma revisão de seus benefícios, o que pioraria o já caótico quadro das contas públicas.

É que o mínimo, piso da aposentadoria, é reajustado pela soma de inflação do ano anterior e o PIB de dois anos antes. Se o PIB foi revisado posteriormente, assim deveria ser com o salário, certo? Não é o que diz a lei que rege os reajustes. Mas nada impede aposentados e trabalhadores de recorrerem agora ao Judiciário.

Não sei se os servidores do IBGE aceitariam numa boa esse tipo de adiamento. Em abril do ano passado, quando o instituto quis suspender a divulgação da Pnad Contínua por pressão de congressistas, 18 coordenadores e gerentes do instituto entregaram seus cargos em protesto. Funcionários fizeram greves nos escritórios do instituto em todo o país. E a suspensão da pesquisa foi revertida.

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