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Sempre ouvi dizer que nós, brasileiros, formamos uma tribo imensa de pessoas boas. Ressalvando exceções que pipocam por vários segmentos, também acredito. E isso é bom. Ao mesmo tempo, porém, pecamos pelo excesso de tolerância. Somos então "bonzinhos", o que é ruim. Esquecemos fácil o dano causado e perdoamos quem quer que seja. Aliás, pior, passamos a mão na cabeça.

Essa atitude "franciscana" começa na vida familiar com os próprios filhos, e o hábito se estende até a política durante as eleições. Uma palmada pode ser mais pedagógica do que mil palavras. Depende da forma e da ocasião. Por isso reelegemos Collor, Maluf, Renan Calheiros e por aí vai.

No futebol, depois de ler e ouvir tanto durante os últimos dias sobre a estupidez praticada contra o menino de Oruro, relembrei um fato ocorrido no Maracanã, creio em 1989, num jogo Brasil e Chile pelas eliminatórias da Copa do Mundo. Uma loira apelidada de Rosemery Fogueteira lançou das arquibancadas um rojão que foi explodir na área do goleiro Rojas, do Chile. O jogador simulou ter sido atingido pelo artefato, foi desmascarado e a farsa rendeu-lhe a punição máxima: foi banido do futebol e o Chile impedido de disputar as duas Copas seguintes. Tudo bem, mas o sinalizador, a bomba, como queira, caso atingisse alguém poderia ter matado da mesma forma como aconteceu com Kevin Espada, de 14 anos, na Bolívia. O Maracanã não foi interditado, a seleção brasileira não sofreu sanção alguma e a Fogueteira virou celebridade, ganhando generosos espaços em revistas picantes.

Por outro lado, quando devemos ser duros em situações mais sérias no âmbito internacional, afrouxamos. A Scotland Yard mata por engano um brasileiro inocente dentro de um trem no metrô de Londres e fica por isso mesmo. Aqui dois americanos que pilotam um jato Legacy batem, derrubam e matam quase duzentos passageiros da Gol e são condenados a um ano e quatro meses de prisão em regime semiaberto, cumprindo pena nos EUA e, pasmem, podendo prestar serviços comunitários em instituições brasileiras lá, no país deles.

Voltando ao futebol, não dá para esperar do torcedor fanático racionalidade durante um jogo. Ele está sob a égide do anonimato. É a proteção que não encontra como cidadão comum. Mas o brasileiro é bonzinho e acha graça no coral de palavrões contra o rival. Aplaude até.

Afrouxamos quando devemos ser severos. Volto a cobrar o assassinato do torcedor Diego Henrique Raad Gonciero, de 16 anos, baleado e morto em julho do ano passado por um integrante de torcida organizada. A Delegacia Móvel de Atendimento ao Futebol e Eventos, do delegado Clóvis Galvão, segundo uma fonte, sabe quem é o autor, mas... O inquérito corre na velocidade de uma lesma anestesiada. Estamos perdendo em agilidade até para a Bolívia que, ato contínuo à tragédia de Oruro, encarcerou 12 torcedores brasileiros.

Somos bonzinhos, piedosos e lentos. O que é lamentável.

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